Acórdão nº 21/14.6IDAVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução20 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso 21/14.6IDAVR.P1* Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – Relatório 1.

Nos autos de processo comum singular com o n.º 21/14.6IDAVR, da Comarca de Aveiro, Espinho, Inst. Local, Secção de Competência Genérica, J2, foram acusados pelo MP e submetidos a julgamento os arguidos: - B…, divorciado, empresário, nascido em 20 de fevereiro de 1933, natural da … e concelho de Espinho, filho de C… e de D…, residente na Rua …, n.º …., Espinho; e - E... S.A.,NIPC ………, com sede na …, Espinho.

Era imputada ao arguido B… a prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 6º, n.º 1 e 3 e 105º, n.º 1 e 4 do RGIT, bem como pelos artigos 26º e 40º do CIVA.

A responsabilidade criminal da sociedade arguida resulta do artigo 7º, n.º 1 do RGIT.

  1. Efectuado o julgamento foi proferida sentença que, na procedência da acusação: - Condenou o arguido B…, pela prática do aludido crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 6º e 105º, n.ºs 1 e 4 do RGIT, na pena de na pena de prisão de 1 (um) ano e 2 (dois) meses, declarada suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano e 2 (dois) meses; - Condenou a arguida E…, S.A. pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 7º e 105º, n.º 1 e 4 do RGIT, na pena de 400 (quatrocentos) dias de multa à taxa diária de 7,00€ (sete euros), o que perfaz o montante global de 2.800,00€ (dois mil e oitocentos euros).

  2. Não conformada, a Digna Magistrada do MP interpôs recurso e, da respectiva motivação, extraiu as seguintes conclusões: 1. O arguido B… foi condenado, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 6.º e 105.º, n.

    os 1 e 4 do RGIT, na pena de prisão de 1 (um) ano e 2 (dois) meses, suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.º, n.

    os 1 e 5 do CP, por igual período, sem imposição da condição de pagamento da prestação tributária e acréscimos legais.

  3. A pena concretamente aplicada pela sentença recorrida não satisfaz as necessidades de prevenção, não correspondendo à interpretação mais correta do disposto nos artigos 71.º e 40.º do CP.

  4. Não se concorda também com a dispensa da condição da suspensão da execução da pena de prisão, uma vez que tal contraria a obrigatoriedade prevista no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT.

    Quanto à determinação da medida concreta da pena: 4. A sentença recorrida concluiu pela existência de elevadas exigências de prevenção geral e de considerável grau de culpa, mas classificou como “medianamente atenuadas as exigências de prevenção especial”.

  5. Todavia, consideram-se as necessidades de prevenção especial do caso em apreço muito elevadas, atendendo a que: (i) o arguido foi já condenado por 1 crime de dano e 4 vezes por crimes de natureza fiscal, sendo que 3 destas últimas 4 condenações ocorreram num período inferior a 6 anos, por referência à data da prática dos factos em causa nos presentes autos, e que a última se encontra suspensa e condicionada ao pagamento da prestação tributária e acréscimos legais, embora seja posterior à data da prática dos factos aqui em apreço; (ii) o arguido mantém a sua atividade empresarial; e (iii) os factos foram praticados a título de dolo direto.

  6. Quanto à escolha da pena, embora os antecedentes criminais do arguido desaconselhassem a aplicação da suspensão, consideramos como muito relevantes e absolutamente decisivas as circunstâncias de a sociedade arguida se encontrar a regularizar a dívida perante a Autoridade Tributária e Aduaneira e de se encontrar a executar um plano de recuperação da empresa arguida através do SIREVE, aprovado pelo IAPMEI em fevereiro de 2014, bem como o valor da prestação tributária em dívida.

  7. Entende-se, assim, nos termos do disposto nos artigos 70.º, 71.º, 40.º e 50.º, n.º 5 do CP e 105.º, n.

    os 1, 2 e 4 e 14.º, n.º 1 do RGIT, que, fixando-se o limite de proteção mínima no que à prevenção geral diz respeito em 1 ano e o limite superior em 2 anos tendo em conta a culpa considerável e considerando-se muito elevadas as exigências de prevenção especial, a pena a aplicar ao arguido deve ser de 2 anos de prisão, suspensa por igual período.

    Quanto à dispensa da condição da suspensão da execução da pena de prisão: 9. A sentença recorrida, invocando o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ n.º 8/2012, justificou a não exigência deste pagamento com um juízo negativo de prognose quanto à razoabilidade de exigir ao condenado o pagamento da prestação tributária em dívida e acréscimos legais no prazo de suspensão (um ano e dois meses), pois que tal contraria o disposto no n.º 2 do artigo 51.º do Código Penal.

  8. - Salvo melhor entendimento, o que este acórdão determina como jurisprudência fixada é que a escolha pela suspensão da execução da pena de prisão, nos crimes fiscais, exige o tal juízo de prognose de razoabilidade acerca da possibilidade de cumprimento pelo condenado da condição que lhe será necessariamente imposta. E tão só isso.

  9. - Quando este juízo de prognose concluir pela impossibilidade de tal pagamento, não haverá lugar à aplicação da suspensão.

  10. A opção pela suspensão da execução da pena de prisão nos crimes tributários tem de revelar uma ponderação pela medida global: não apenas pela satisfação das necessidades de prevenção através da suspensão da execução da pena de prisão, mas também pela razoabilidade da condição obrigatória do pagamento da prestação tributária e acréscimos legais.

  11. - Estabelecendo a lei fiscal, enquanto lei especial, no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT, a obrigatoriedade da imposição do dever, não se admite a aplicação do artigo 51.º, n.º 2 do CP.

    14 Mas esta obrigatoriedade não é apenas quanto à imposição da condição, mas também quanto ao valor do pagamento, que não pode ser inferior ao valor da prestação tributária e acréscimos legais, conforme prevê o mesmo artigo.

  12. - Nada impedindo, contudo, ainda nos termos da mesma disposição legal, que o período durante o qual há-de ser cumprida a condição seja superior ao período de suspensão, desde que até ao limite de cinco anos.

  13. - Estando em causa o valor de 8.438,37€, atendendo à condição socioeconómica do arguido e sem esquecer a possibilidade de se estender o período para pagamento até cinco anos, não se concorda com o juízo de prognose de irrazoabilidade quanto à exigência da condição de pagamento.

  14. Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e revogar-se a decisão recorrida, devendo o arguido B… ser condenado, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 6.º e 105.º, n.os 1, 2 e 4 do RGIT, na pena de prisão de dois anos, suspensa, nos termos do previsto pelos artigos 14.º, n.º 1 do RGIT e 50.º, n.º 5 do CP, por igual período e condicionada ao pagamento da prestação tributária, no valor de 8.438,37€ e acréscimos legais, num prazo de três anos.

  15. Respondeu o arguido. Sem formular conclusões, entende que deve ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida.

  16. Nesta Relação, a Ex.ma PGA, dizendo que “acompanha integralmente a exaustiva e judiciosa motivação de recurso da Ex.ma Magistrada do Ministério Público junto da 1ª Instância”, é de parecer que deve ser dado provimento ao recurso.

  17. Colhidos os vistos dos Ex.mos Adjuntos, e efectuada a Conferência, cumpre apreciar e decidir.

  18. O objecto do presente recurso circunscreve-se à medida concreta da pena que, no entender da Ilustre Recorrente, deve ser fixada em 2 anos de prisão; mais entende que deve ser declarada suspensa na sua execução, mas subordinada à condição de ser paga a quantia em dívida à Administração Fiscal.

    II – Fundamentação

    1. De facto 1.

    O Tribunal a quo considerou provada a seguinte factualidade que, por não ter sido impugnada e nem se verificarem os vícios do art.º 410º do CPP, se tem por definitivamente assente: 1 - A arguida E…, SA, com o NIPC ………, é sujeito passivo de IVA enquadrada no regime normal de periodicidade mensal, e em sede de IRC no regime geral de tributação, estando registada para exercício da atividade de indústria e comércio de produtos químicos.

    2 - Esta empresa tem como administrador o arguido B…, ficando a sociedade obrigada com a assinatura do administrador único, ora arguido.

    3 - Assim, desde 31 de Agosto de 1972, a gerência e posterior administração da sociedade arguida sempre esteve a cargo do arguido, competindo-lhe todos os atos de gestão e direção da vida comercial da sociedade, decidindo da afetação dos respetivos recursos financeiros ao cumprimento das obrigações corrente designadamente ao pagamento dos salários dos trabalhadores e dos débitos a fornecedores, bem como ao apuramento e pagamento dos respetivos impostos designadamente em sede de IVA, IRS, IRC, etc.

    4 - Nessa qualidade o arguido, em data não concretamente apurada, mas situada em Maio de 2013, decidiu não entregar ao Estado/Serviços Administração do IVA as quantias que deveriam pagar a título do referido imposto sendo que a quantia a pagar resulta da diferença entre a totalidade das quantias que os clientes pagavam à sociedade arguida a título de IVA e aquilo c suportavam a título do referido imposto nas aquisições.

    5 - O arguido, com o objetivo de atingir um benefício económico indevido, no mês de Maio de 1013, liquidou e recebeu o Imposto sobre o Valor Acrescenta (IVA) proveniente das transações comerciais, não entregando à Fazenda Nacional quantias que liquidou e recebeu a título de IVA, ao qual estava obrigado, relativo às faturas que emitiu em nome da sociedade arguida.

    6 - De facto, o arguido liquidou, recebeu e não entregou ao Estado o IVA, no valor de 8.495,66€ (oito mil, quatrocentos e noventa e cinco euros e sessenta e seis cêntimos), referente ao mês de Maio de 2013.

    7 - Assim, o arguido na sequência das referidas operações, apurou que deveria pagar ao Estado as seguintes quantias relativas a IVA: 8 - O arguido enviou a respetiva declaração periódica de IVA e não enviou os meios de pagamento, estando o arguido, enquanto legal representante da sociedade arguida, obrigado a...

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