Acórdão nº 438/10.5IDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DOLORES SILVA E SOUSA
Data da Resolução09 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec. Penal n.º 438/10.5 IDPRT.P1 Comarca do Porto Instância Local de Vila Nova de Gaia.

Acordam, em Conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto.

I-Relatório.

No Processo Comum singular n.º 438/10.5IDPRT da Instância Local de Vila Nova de Gaia, secção criminal, Juiz 3, foi submetido a julgamento o arguido B…, melhor identificado na sentença a fls. 845 [foi ordenada a separação de processos relativamente à Sociedade arguida “C…, Lda.”, por despacho datado de 17.11.2014].

A sentença de 28.04.2016, depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo: «Em face do exposto, e sem outras considerações, o Tribunal decide condenar o arguido B… pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103º, nº1, als. a) e b) e nº2, do RGIT, aprovado pelo artº 1º, nº1, da Lei nº15/2001, de 5/6, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), ou seja, na multa global de € 1.120,00 (mil cento e vinte euros).

Mais se condena o arguido no pagamento das custas criminais, com taxa de justiça que se fixa em 3 UC e nos demais encargos a que a sua actividade deu causa.»*Inconformado com a decisão o arguido interpôs recurso apresentando a motivação de fls. 862 a 866, que remata com as seguintes conclusões: «1 - Não resultam provados os factos alegados em a), b) e c) dos factos não provados.

2 – O facto dado como provado em 4, com o devido respeito, é contraditório, com os factos dados como provados de 7 a 19, isto porque estamos perante três situações diferentes: 1 Os cheques emitidos a favor do arguido 2 Os cheques dirigidos e depositados na conta da sociedade 3 A venda da fração da sociedade abaixo do valor patrimonial, com correção imediata pela Administração Fiscal 3 - Da ocultação destes dois factos anteriores, o ora arguido não é responsável, porque deveria ser a empresa arguida a declarar tais rendimentos, já que constam dos documentos contabilísticos da empresa.

4 - O arguido nunca foi notificado para efetuar esta correção, nem para proceder ao pagamento em reversão fiscal de tal importância, de forma a ser verificado o seu dolo na omissão destes rendimentos, o que não aconteceu.

5 - O arguido não omitiu, contabilisticamente os verdadeiros rendimentos do ano de 2006 da sociedade arguida, referentes à venda das frações, já que na situação anteriormente referida, deveria constar do modelo 22, apresentado só em Maio de 2007, data em que o arguido já não pertencia à sociedade, tal informação constava da contabilidade não só dos depósitos bancários, bem como, informação da venda das referidas frações.

6 - O arguido, em 2006, data dos factos, não poderia imaginar que na declaração 22, que seria apresentada no ano seguinte, não constasse os valores dos cheques emitidos à sociedade arguida, bem como, a correção do valor patrimonial fiscal em relação ao valor da venda.

7 - Esta divergência é de correção automática sem ocultação possível, pois o imposto (IMT) devido por parte do comprador é liquidado no ato da transmissão.

8 – O arguido não se conforma com o facto provado em 4, 20 a 26, já que após novembro de 2006, não era administrador de direito, nem de facto, para omitir os rendimentos que deveriam ser declarados no modelo 22.

9 - Enquanto em 4, 20 a 26, dos factos provados, é referido que o arguido ocultou à A.T. os verdadeiros rendimentos, em 6, 8, 10, 14, 17, 18, 19 e 21 imputa-se a responsabilidade à Sociedade, da omissão dessa declaração de rendimentos. E neste aspeto existem sérias dúvidas, afinal sobre a prática dos factos de que o arguido vem acusado.

10 - O arguido, entende que nos termos do n.º3 do art. 103 do RGIT, os valores a considerar no crime de fraude fiscal são os que devem constar em cada declaração a apresentar e não no ato da venda do património da empresa arguida.

11 - O arguido, confessa ter recebido a título pessoal valores que na correção feita pela AT, não chegam a 15.000,00€ de imposto a pagar ao Estado, pelo que tal rendimento se enquadra na exceção prevista no n.º2 do art. 103 do RGIT.

12 – Tudo isto para dizer que, pela factualidade não provada, e sempre com muito respeito pelo douto Tribunal, não deveria o este condenar o ora arguido pelo crime de que vem acusado de fraude fiscal.

Termina pedindo a procedência do recurso, revogando-se a sentença, nos termos expostos.»*O recurso foi admitido por despacho constante a fls. 867 dos autos.

O MP junto do tribunal a quo veio oferecer a sua resposta constante dos autos a fls. 870 a 874, sem formular conclusões, mas pugnando fundamentadamente pela negação de provimento ao recurso, com a consequente manutenção da sentença recorrida.

Nesta Relação não foi emitido Parecer.

Colhidos os vistos, e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

*II- Fundamentação.

Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – vícios decisórios e nulidades referidas no artigo 410.º, n.º s 2 e 3, do Código de Processo Penal – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.

  1. -Questões a decidir.

Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, pela ordem em que são enunciadas, são as seguintes as questões decidir: - Vício da contradição na fundamentação.

- Subsunção jurídica dos factos.

*2. Enumeração dos factos provados, não provados e respectiva motivação.

Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos: 1. A "C… Lda", é uma sociedade comercial por quotas, com sede na Praceta …, …, Vila Nova de Gaia, e tem por objecto social a compra e venda de prédios rústicos e urbanos, revenda dos adquiridos para esse fim, indústria da construção civil, empreitadas de obras públicas e particulares, urbanizações, concepção, edificação de empreendimentos imobiliários e turísticos, com o CAE ….., estando enquadrada como isenta relativamente ao IVA e em sede de IRC enquadrado no regime geral.

2. O arguido B… foi sócio da sociedade referida em 1 desde a sua constituição, sendo, até 23.11.2006, procurador da mesma e seu gerente de facto pois tomava todas as decisões relativas à gestão e administração da sociedade arguida.

3. Por força do exercício da actividade da sociedade arguida e de acordo com as regras vigentes em matéria de IRC, o arguido B… bem sabia que estava aquela legalmente obrigada a declarar à Administração Tributária os rendimentos auferidos em cada exercício fiscal sujeitos a tributação, o que deveria constar da competente declaração de rendimento Modelo 22 de IRC e da respectiva declaração anual de informação contabilística e fiscal, que tinha que ser entregue, obrigações legais de que tinha perfeito conhecimento.

4. Todavia, o arguido decidiu ocultar à Administração Fiscal e não fazer constar da contabilidade da sociedade os verdadeiros rendimentos auferidos com a actividade comercial desenvolvida pela mesma sociedade durante o ano de 2006, tendo sido omitida na declaração de rendimentos Modelo 22 e na respectiva declaração anual de informação contabilística e fiscal relativa ao exercício fiscal de 2006, enviada à Administração Tributária em 31 de Maio de 2007, parte dos reais proveitos obtidos com a venda de seis imóveis, assim diminuindo as quantias de IRC devido a final ao Estado.

5. No ano de 2006 o principal negócio efectuado pela sociedade "C…" foi a venda de um prédio inscrito na matriz urbana sob o artigo 988, com seis fracções correspondentes a seis moradias, sitas na rua …, freguesia de …, Maia.

6. A sociedade "C…, Lda" declarou o valor de €1.182.500,00, como sendo o valor recebido da venda das seis fracções do prédio "U 998" e do prédio "R 571", porém omitiu os verdadeiros valores das vendas dos imóveis conforme a tabela que se segue: 7. A fracção "A" do prédio inscrito na matriz predial sob o artigo urbano nº 988 foi adquirida em Março de 2006 por D… e E…, pelo preço global de €208.746,00, valor esse que foi pago através dos cheques nº ……….. do F… emitido à ordem de "C…" no montante de €175.000,00€ e cheque nº ………., do F… emitido à ordem do arguido B… no montante de €33.746,00, ambos datados de 07/03/2006.

8. Ora, a sociedade "C…, Lda", relativamente à venda da fracção "A", apenas declarou o valor de €175.000,00, omitindo o valor total recebido de 190.310,00€, tendo ocultado à Administração Tributária a quantia de €33.746,00.

9. A fracção "B" do aludido prédio inscrito na matriz sob o artigo nº 988, foi adquirida em Julho de 2006 por G… e H…, pelo preço global de €225.00,00€, que foi pago através de três cheques nºs ……….., do F…, emitido em 30/04/2006, à ordem de "C…" no montante de €5.000,00; cheque nº ………. do F…, emitido à ordem da "C…" no montante de €180.000,00, e o cheque nº ………. no montante de €40.000,00 emitido à ordem do arguido B…, este dois últimos datados de 11/07/2006.

10. A sociedade "C…, Lda" apenas declarou o valor de €180.000,00, quando havia recebido efectivamente a quantia de €225.000,00, omitindo assim um proveito de €45.000,00.

11. A fracção "C" do mesmo prédio inscrito na matriz sob o artigo nº 988, foi vendida em Março de 2006 a I… e J… pelo preço global de €215.00,00€, que foi pago através dos cheques nº ………., da K…, emitido em 26/06/2005, à ordem de "C…" no montante de €40.000,00€ e cheque nº ……….. da K… emitido em 10/3/2006 à ordem da C… no montante de €175.000,00.

12. A sociedade "C…, Lda" apenas declarou, em sede de I.R.C., o valor de €175.000,00, quando havia recebido efectivamente a quantia de €215.000,00, omitindo à Administração Tributária um proveito de €40.000,00.

13. A "fracção D" do aludido prédio inscrito na matriz sob o artigo nº 988, foi vendida em Março de 2006 a L… e M… pelo preço global de €221.887,00, que foi pago através dos cheques nº ………., do N… emitido em 27/01/2005 à ordem de "C… " no montante de €46.887,00 e...

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