Acórdão nº 1293/15.4TXPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | JORGE LANGWEG |
Data da Resolução | 26 de Outubro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 1293/15.4TXPRT-A.P1 Data do acórdão: 26 de Outubro de 2016 Relator: Jorge M. Langweg Adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa Origem: Comarca do Porto Tribunal de Competência Territorial Alargada de Execução das Penas do Porto Sumário: 1 - As declarações de contumácia não estão reservadas às situações que envolvam a aplicação de penas de prisão a título principal, como decorre do disposto nos artigos 335º a 337º do Código de Processo Penal, aplicável a todos os processos penais, independentemente da sanção aplicável, ou aplicada.
2 - O Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade também se aplica às penas de prisão que resultem de conversão de pena de multa não paga.
3 - A privação da liberdade emergente de uma pena de prisão é igualmente elevada, quer se trate de uma pena de prisão aplicada a título principal, ou subsidiário, restringindo, de igual modo, direitos pessoais fundamentais dos respetivos condenados.
4- A declaração de contumácia prevista no citado artigo 97º, 2, do C.E.P. visa coagir, legitimamente, o arguido evadido ou que se tenha eximido de outro modo, total ou parcialmente, a cumprir pena de prisão – principal ou subsidiária - ou medida de segurança, a apresentar-se para cumpri-la, sendo tal medida – e consequentes restrições de direitos fundamentais – proporcional e adequada à sua finalidade.
Acordam os juízes acima identificados da 4ª Secção Judicial - 2ª Secção Criminal - do Tribunal da Relação do Porto nos presentes autos, em que figura como recorrente o Ministério Público.
I - RELATÓRIO1. O Ministério Público interpôs recurso do despacho proferido nos autos que, «(…), entendemos não ser de declarar a contumácia quanto à pena subsidiária em execução e, por consequência, determino o arquivamento dos autos.» e, consequentemente, determinou o arquivamento dos autos.
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Inconformado com tal despacho, o Ministério Público recorreu, apresentando as seguintes conclusões da motivação de recurso: Decidiu-se nos autos não proferir declaração de contumácia relativamente a uma pena de prisão subsidiária.
Por se entender que a mesma apenas é conciliável com uma sanção de natureza privativa da liberdade, exigindo a presença de um interesse legitimador específico no exercício da acção penal e à pena com que se confronta o procedimento.
No entanto, tal interesse legitimador existe, já que se trata de conferir eficácia à pena em causa.
Não sendo relevante que tal prisão decorra do não pagamento da multa.
Por outro lado, somos de opinião que a sua execução, é idêntica à qualquer outra pena de prisão.
Decorrendo o seu interesse legitimador da própria condenação assente na culpa do agente.
Sendo certo que a declaração de contumácia pode ter lugar mesmo em fase anterior ao julgamento quando o fundamento constitucional da pena - a culpa - não está ainda estabelecido.
E relativamente a crimes não punidos com pena de prisão.
Pelo que ocorre pleno fundamento para a declaração de contumácia relativamente a pena de prisão subsidiária.
Deste modo requer-se a Vossas Exas, que revoguem o despacho em crise, determinando a sua substituição por outro que aprecie da possibilidade de declaração de contumácia, uma vez que foi violado o art. 97-, n.
e 2, do CEP.
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O recurso foi liminarmente admitido no tribunal a quo, nos termos legais, subindo imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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O arguido não apresentou resposta.
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O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista dos autos (artigo 416º, nº 1, do Código de Processo Penal), tendo emitido parecer favorável à procedência do recurso, concretizando a linha jurisprudencial no seu entender cada vez mais dominante sobre o tema nos tribunais superiores, que corresponde ao sentido propugnado no recurso.
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Tendo sido dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não houve resposta.
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Produziu-se o despacho de exame preliminar e, não tendo sido requerida audiência, o processo foi à conferência, após os vistos legais, respeitando as formalidades legais [artigos 417º, 7 e 9, 418º, 1 e 419º, 1 e 3, c), todos, ainda do mesmo texto legal].
Questões a decidir Do thema decidendum dos recursos: Para definir o âmbito do recurso, a doutrina [1] e a jurisprudência [2] são pacíficas em considerar, à luz do disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, que o mesmo é definido pelas conclusões que o recorrente extraiu da sua motivação, sem prejuízo, forçosamente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.
A função do tribunal de recurso perante o objeto do recurso, quando possa conhecer de mérito, é a de proferir decisão que dê resposta cabal a todo o thema decidendum que foi colocado à apreciação do tribunal ad quem, mediante a formulação de um juízo de mérito.
Da questão a decidir neste recurso: Atento o teor do relatório atrás produzido, importa decidir, somente, a questão jurídica colocada pelo recorrente que é a de saber se é admissível a declaração de contumácia pelo tribunal a quo, quando a pena exequenda é a de multa convertida em prisão subsidiária.
Nos termos do disposto no artigo 428° do Código de Processo Penal, importa, ora, apreciar e decidir a questão acima enunciada, caso não se torne necessária a apreciação de questão prévia, de conhecimento oficioso.
II – FUNDAMENTAÇÃO Transcrição da fundamentação do despacho recorrido: «Cumpre apreciar e decidir da admissibilidade de declaração da contumácia nos casos de prisão subsidiária.
Desde logo importa consignar que a questão é essencialmente substantiva e que, de forma sustentada, defendemos a não admissibilidade da declaração da contumácia nos casos de execução da prisão subsidiária.
Vejamos, porquê.
A propósito da pena de multa estatui o artigo 47°. do CPenal que "1- A pena de multa é fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos no n°.1 do artigo 71°., sendo, em regra, o limite mínimo de 10 dias e o máximo de 360; 2- Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre os € 5 e os € 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais; 3 - Sempre que a situação económica e financeira do condenado o justificar, o tribunal pode autorizar o pagamento da multa dentro de um prazo que não exceda um ano, ou permitir o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir além dos dois anos subsequentes à data do trânsito em julgado da condenação; 4 - Dentro dos limites referidos no número anterior e quando motivos supervenientes o justificarem, os prazos de pagamento inicialmente estabelecidos podem ser alterados; 5 - A falta de pagamento de uma das prestações importa o vencimento de todas".
Paralelamente ao enquadramento legal da natureza pecuniária da multa, enquanto, pena principal e da admitida susceptibilidade da sua substituição nos termos e efeitos previstos no artigo 48°. do mesmo diploma legal, também, o legislador admite a conversão da multa não paga em prisão subsidiária.
Especificamente para esta última situação, o artigo 49°. do CPenal prevê que: "1- Se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão, não se aplicando para o efeito, o limite mínimo dos dias constantes do n°. 1 do artigo 41°.; 2- O condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado; 3 - Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de um a três anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridas, executa-se a prisão subsidiária; se o forem a pena é declarada extinta; 4- O disposto nos n°.s 1 e 2 é correspondentemente aplicável ao caso em que o condenado culposamente não cumpra os dias de trabalho pelos quais, a seu pedido a multa foi substituída. Se o incumprimento lhe não for imputável, é...
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