Acórdão nº 636/12.7T4AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Fevereiro de 2016

Data15 Fevereiro 2016
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 636/12.7T4AVR.P1 Autor: B… Ré: C…, S.A.

Relator: Jorge Manuel Loureiro 1º adjunto: Joaquim Jerónimo Freitas 2º adjunto: Eduardo Petersen Silva Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - Relatório O autor propôs contra a ré a presente acção especial emergente de acidente de trabalho, peticionando a condenação desta, enquanto responsável pelo acidente de trabalho que sofreu e que descreve na petição, a pagar-lhe: - a quantia de € 8.668,44 a título de indemnização pelo período de incapacidade temporária absoluta para o trabalho; - a pensão anual e vitalícia que vier a ser fixada em função da incapacidade permanente parcial para o trabalho a fixar na junta médica; - todas as despesas referentes a medicamentos, consultas, internamento e tratamentos médicos e fisioterapêuticos que realizar, por força das lesões e sequelas resultantes do acidente; - juros vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde da data do acidente.

Como fundamento da sua pretensão alegou, em resumo, que no dia 20/12/2011, sofreu um acidente que deveria qualificar-se como de trabalho, em resultado do qual sofreu as consequências que melhor descreve na petição, razão pela qual deveria responsabilizar-se a ré, enquanto seguradora para quem estava transferida a responsabilidade civil emergente daquele acidente, pela reparação infortunística devida, nos exactos termos em que é peticionada.

Citada, a ré contestou, pugnando pela improcedência da acção, pois, em resumo, não aceita a existência de um acidente, nem a sua caracterização como de trabalho, porquanto não existe relação de causalidade entre as lesões que o sinistrado apresenta e o acidente relatado na petição, sendo aquelas lesões produto de doença natural de que o autor padecia.

Saneado e condensado o processo, procedeu-se a julgamento, com observância dos legais formalismos, logo após o que foi proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte: “Nestes termos, e sem necessidade de mais considerações, decide-se : 1º- Que o A. sofreu um acidente de trabalho no dia 20.12.2011 em consequência do qual esteve com incapacidade temporária absoluta para o trabalho até ao dia 1.3.2012, data em que ficou curado sem qualquer incapacidade permanente, sendo a R. responsável pela reparação legal mercê do contrato de seguro celebrado com a entidade empregadora.

  1. - Absolver a R. dos demais pedidos formulados.

”.

Não se conformando com o assim decidido, apelou o autor, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: “A.

Impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, nos termos do artigo 640.º do Código de Processo Civil.

B.

Consideramos incorrectamente julgados os pontos melhor identificados na motivação do presente Recurso, nomeadamente os Pontos 5.º, 6.º, 8.º, 9.º e 10.º da douta Sentença recorrida, assinalados na fundamentação do presente Recurso. De facto, tais pontos devem considerar-se incorrectamente julgados, devendo antes tal matéria ser dada como não provada, impondo, consequentemente, decisão diferente da recorrida.

C.

Em contrapartida, deve ser dado como provado que o mecanismo descrito para o acidente de trabalho (o taipal escorregar para o lado direito e o sinistrado efectuar o movimento rotativo com o braço para puxar o taipal) é susceptível de provocar a rotura do tendão do supra espinhoso.

D.

Não poderia ter sido dado como provado os pontos 5., 6., 8., 9. e 10. da matéria de facto, porquanto não foi produzida qualquer prova que permita sustentar tais factos, pois conforme resulta da ecografia do ombro esquerdo a fls. 35, realizada em 05/01/2012, que mostra uma rotura parcial de espessura completa do tendão do músculo supra-espinhoso, bem como a ressonância magnética constante de fls. 42, efectuada em 24/02/2012, a qual apresenta as mesmas lesões, em nenhum dos exames efectuados é referida qualquer entorse. Também dos depoimentos do perito Dr. E… (vide depoimento de 14/05/2015, 06m12s, 06m27s, 07m06s, 07m43s, 10m51s, 13m46s, supra transcritos que por uma questão de economia processual se dão aqui por inteiramente reproduzidos), como do depoimento do perito Dr. F… (vide depoimento de 09/06/2015, 01m28s, 04m10s, 06m30s, supra transcrito que por uma questão de economia processual se dão aqui por inteiramente reproduzidos), e ainda do depoimento das testemunhas G… (vide depoimento de 14/05/2015, 02m14s, 04m02s, 04m58s) e H… e do próprio sinistrado (vide depoimento de 14/05/2015, 02m30s, 03m08s, 03m14s, 05m19s, 05m48s, 14m10s), consideramos que se mostra provado, sem sombra de dúvida, que o ora recorrente não apresentava qualquer patologia ao nível do ombro esquerdo antes do acidente ocorrido em 20/12/2011.

E.

Pelo que, salvo o devido e merecido respeito por opinião diversa, estamos convictos de que deveria ter sido dado como provado que o recorrente não apresentava alterações degenerativas hipertróficas na articulação acrómio-clavicular.

E que apresenta sequelas que lhe determinam incapacidade permanente para o trabalho em consequência do evento ocorrido no dia 20/12/2011.

F.

Estamos convictos de que deveria ter sido dado como provado tanto o quesito 3.º como o quesito 4.º da base instrutória nos exactos termos em que foram transcritos, ou seja, que em consequência do esforço feito a puxar o referido taipal, o recorrente sofreu rotura parcial da coifa dos rotadores à esquerda, de forma repentina e inesperada, pelo que merce da lesão sofrida o recorrente apresenta uma ruptura de espessura completa do tendão do supra-espinhoso, com 14 mm de extensão e um pequeno volume de derrame na bolsa sub cromial sub-deltoideia. Mais, deveria considerar-se como não provado que a lesão sofrida curou clinicamente em 01/03/2012, pois o sinistrado apresenta sequelas do mencionado acidente.

G.

O sinistrado é pessoa de modesta condição social, com hábitos e culturas diferentes de pessoas citadinas, com um baixo grau de escolaridade, pelo que tem alguma dificuldade em se expressar. Tanto o perito Dr. F… como o Dr. E… quando questionados sobre o mecanismo do acidente, nomeadamente, se o taipal escorregar para o lado direito e o sinistrado efectuar o movimento rotativo com o braço para puxar o taipal se poderia originar a rotura do tendão do supra-espinhoso, os mesmos responderam afirmativamente, pelo que tal matéria se deve dar como provada e consequentemente os quesitos 3.º e 4.º da base instrutória.

H.

Tomando em consideração tudo o já alegado na fundamentação que antecede, somos forçados a concluir que o recorrente apresenta uma lesão ao nível do ombro esquerdo com rotura do tendão supra espinhoso, decorrente do acidente de trabalho ocorrido em 20/12/2011, sequelas que são enquadráveis no capítulo I 3.2.73. a) da TNI, sendo de lhe atribuir um coeficiente de desvalorização de pelo menos 4,5%, que atendendo à idade deverá ser atribuído o factor de bonificação de 1,5%, resultando assim uma IPP de 6%, conforme resulta do auto de exame médico de 18/10/2013 a fls.

I.

Mesmo que não se prove o nexo de causalidade em questão, o que apenas por mera questão de raciocínio e por imperativos de consciência profissional se admite, interessa, todavia, analisar se a pretensão reparatória do Autor pode proceder, tratando-se de matéria relativa a direitos indisponíveis e, portanto, no quadro do conhecimento oficioso. Como tem apontado a nossa jurisprudência, para que se reconheça um acidente de trabalho importa que se verifiquem três requisitos: um elemento espacial, em regra, o local de trabalho, um elemento temporal, em regra, correspondente ao tempo de trabalho e um elemento causal, ou seja, o nexo de causa e efeito entre, por um lado, o evento e a lesão, perturbação funcional ou doença e, por outro, entre estas situações e a redução da capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte.

J.

Acresce que, nos termos do artigo 10.º da LAT “A lesão constatada no local e tempo de trabalho ou nas circunstâncias previstas no artigo anterior presumem-se consequência do acidente de trabalho”.

K.

Dispõe o artigo 11.º, n.º 1 e 2, do mencionado Diploma, tal como já dispunha o anterior artigo 9º da Lei 100/97, de 13.09, que: “1. A predisposição patológica do sinistrado num acidente não exclui o direito à reparação integral, salvo quando tiver sido ocultada.

  1. Quando a lesão ou doença consecutiva ao acidente for agravada por lesão ou doença anterior, ou quando esta for agravada pelo acidente, a incapacidade avaliar- se-á como se tudo dele resultasse, a não ser que pela lesão ou doença anterior o sinistrado já esteja a receber pensão ou tenha recebido um capital de remição nos termos da presente lei.”.

    L.

    O supra citado n.º 1, como diz Carlos Alegre, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, Regime Jurídico, Almedina, 2ª Edição, pág. 69, trata da predisposição patológica que, “não é, em si, uma doença ou patogenia: é, antes, uma causa patente ou oculta que prepara o organismo para, em prazo mais ou menos longo e segundo graus de várias intensidades, poder vir a sofrer determinadas doenças. O acidente de trabalho funciona...

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