Acórdão nº 2685/15.4T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução11 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 2685/15.4T8MTS.P1 – 3ª Secção (apelação) Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Matosinhos Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Judite Pires Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

“B…, LDA.”, sociedade comercial, com sede na Avenida …, n.º …, …. - …, freguesia de União de Freguesias de …. (… e …) e …, do concelho de Viana do Castelo, instaurou ação declarativa com processo comum contra C…, S.A., com sede na Rua …, nº …, …. - …, freguesia de …, Matosinhos, alegando essencialmente o seguinte:[1] A A. dedica-se à construção, reparação e montagem de tubagens, dedicando-se a R. ao exercício da atividade de transitário, incluindo a intervenção em despachos aduaneiros, no transporte nacional e internacional de mercadorias por qualquer meio e via, no armazenamento e distribuição de quaisquer produtos, bem como na prestação de quaisquer serviços conexos com essas atividades.

Naquele exercício, a A. acordou com a “D…, S.A.”, com sede na Suíça, o fornecimento de trinta e três varandins, com um total de duzentos e vinte e cinco metros e sessenta e três centímetros lineares, pelo valor global de €15.777,40.

A encomenda foi executada em Portugal, ficando concluída em 10 de julho de 2012. Na véspera desse dia, a A. contactou os serviços da R. para que informasse se realizaria o transporte das mercadorias de Portugal para a Suíça e qual o respetivo preço, referindo desde o primeiro contacto que as mercadorias eram frágeis, tendo que ser transportadas num veículo em uso exclusivo para as mesmas, com capacidade para as transportar na posição vertical.

Em 9 de julho de 2012, a R. informou a A. que efetuaria o transporte pelo preço de €1.865,00.

Em 13 de julho de 2012, a R. colocou um veículo de transporte nas instalações da A., em …, para carregar a encomenda. Sucede que esse veículo não permitia o transporte das mercadorias na posição vertical. Os funcionários da A. reclamaram o facto de o veículo não ser adequado à concretização do acordo que haviam celebrado, respondendo os funcionários da R. que a mercadoria iria ser transferida para outro veículo em …. Mais informaram que eram eles os responsáveis pela carga, pelo que sabiam como fazê-la chegar sem danos ao respetivo destino. Os funcionários da A. colocaram os varandins no veículo, com a matrícula OM-...-.., para que fossem transportadas dos estaleiros da demandante, em …, para a central de cargas da R., em …. Quando o fizeram, tiveram o cuidado de colocar proteções a separar cada uma das grades para que não fossem danificadas no transporte. O gerente da A. alertou o motorista da R. para que a carga fosse acondicionada por forma a que nada fosse transportado em cima da mesma e garantindo que o transporte era feito na vertical.

A R. transportou as mercadorias para a Suíça no veículo com reboque identificado pela matrícula . - …….

Em 18 de julho de 2012, a carga chegou ao cliente final, na Suíça.

Nesse dia a “D…” reclamou o estado em que a mesma se encontrava quando foi entregue. Nomeadamente, reclamou que os varandins se encontravam riscados, amolgados e empenados, bem como a falta de um varandim com o comprimento de 9 metros.

Em 18 de julho de 2012 a A. reclamou junto da R. os referidos danos, resultantes do transporte por ela efetuado.

Os bens que a A. entregou à R. para transportar tinham o valor de mercado de €15.777,40.

A R., quando carregou os varandins no veículo em que os transportou para a Suíça, não teve o cuidado de os colocar livres de pesos sobre os mesmos e com alguma barreira que evitasse que se riscassem por efeito da fricção entre eles ou com outros materiais. A R. acondicionou a mercadoria na horizontal, em cima de paletes de sacos, sem qualquer proteção a separá-las e apertadas com cintas.

A R. e os respetivos trabalhadores atuaram com dolo, tendo a intenção manifesta de rentabilizar o percurso do camião que utilizaram no transporte, não se preocupando com os danos que sabiam que iam provocar na mercadoria que a A. entregou, pese embora estivessem avisados desse facto. A R. e os respetivos trabalhadores sabiam que podiam produzir os danos com a forma como efetuaram o transporte e conformaram-se com a possibilidade de os produzir.

Para poder cumprir com o acordo que celebrou com a “D…”, a A. teve de garantir que os bens entregues eram substituídos por outros, sem danos, ou reparados os que estavam danificados. Teve que expedir para a Suíça, novamente, um corrimão danificado, o que comportou um custo global de €980,00. Despendeu ainda a quantia de €98,25 em material para o referido corrimão. A “D…” procedeu a reparações do material entregue pela R., as quais comportaram um custo global de 14.429,85 CHF (€11.738,87) que a A. pagou.

Apesar de interpelada para o efeito, a R. não assumiu os danos que provocou à A., nunca tendo também recusado ressarci-la dos mesmos.

Nas comunicações que trocou com a A., apenas informou que a seguradora com a qual terá contratado a transferência da responsabilidade pelos danos que pudessem ocorrer, recusou ressarcir a A., nunca tendo referido que se recusava, ela própria, a pagar esses danos.

Acresce que a A. ia ter mais encomendas por parte da “D…”, sendo que após a entrega da primeira encomenda com os defeitos descritos, a “D…” não quis contratar a A. para qualquer outro serviço, perdendo a confiança que depositava no seu trabalho. A A. teve, assim, um dano de imagem e de quebra de confiança com a respetiva cliente que deve ser ressarcido em valor nunca inferior a €5.000,00.

Citada, a R. contestou a ação por duas vias.

Defende-se, em primeiro lugar, por exceção, invocando a prescrição do direito da demandante.

Alega para o efeito que a A. refere ter contratado os serviços da R., agente transitário, em 9 de julho de 2012, aceitando a troca de correspondência verificada nessa data entre as partes e consubstanciada no documento 3 junto com a petição.

A R. aceita que a carga chegou ao seu destino no dia 18 de julho de 2012.

Tal como a A. reconhece, a R. é um agente transitário, regendo-se a sua atividade pelo disposto no DL 255/99 de 7 de julho. Nos termos do disposto no artigo 16º desse diploma, qualquer eventual “(…) direito de indemnização resultante da responsabilidade do transitário prescreve no prazo de 10 meses a contar da data da conclusão da prestação de serviço”. A citação da R., que teria a virtualidade de interromper a prescrição, apenas ocorreu em janeiro de 2017, cerca de 4 anos e meio após a data da entrega da mercadoria, pelo que a prescrição se completou já há muito tempo.

Sem prescindir, alega que, caso assim não se entenda, qualquer direito da A. a ver ressarcidos os prejuízos que alega ter sofrido estaria mesmo assim prescrito. Efetivamente, o contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada está regulamentado pela Convenção CMR, a qual foi tornada direito interno pelo Decreto- Lei 46235, de 18 de março de 1965. De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 32º da referida Convenção CMR, “As acções que podem ser originadas pelos transportes sujeitos à presente Convenção prescrevem no prazo de um ano”, o qual deverá ser contado “(…) a partir do dia em que a mercadoria foi entregue, no caso de perda parcial, avaria ou demora”. Conforme a A. reconhece, a carga foi entregue no destino no dia 18 de julho de 2012.

Defendeu-se a R. também por impugnação, invocando o desconhecimento, sem obrigação de conhecer, bem como a falsidade dos demais factos alegados pela A. Concretamente, refere ser falso que não tenha recusado ressarcir a A., porquanto rejeitou a reclamação da mesma, de forma categórica, em 3 de junho de 2013.

Notificada para o efeito, a A. pronunciou-se sobre a matéria de exceção invocada pela R. na contestação.

Discorda da aplicação, no caso em apreço, do disposto no Decreto-lei n.º 255/99, de 7 de julho, na medida em que a A. apenas contratou com a R. o transporte de mercadorias, atividade que não se enquadra no citado diploma.

Já no que respeita à aplicação da convenção CMR, refere que, de facto, o n.º 1 do seu artigo 32.º prevê que as ações originadas pelos transportes sujeitos à Convenção prescrevem no prazo de um ano a contar da data em que a mercadoria foi entregue. No entanto, também prevê o n.º 2 do mesmo artigo um regime especial para a suspensão da prescrição dessas ações: o prazo da prescrição suspende-se a partir do dia em que for realizada uma reclamação escrita, o que foi feito pela autora em 18 de julho de 2012. E esse prazo apenas recomeça a contar no dia em que o transportador rejeitar, também por escrito, a reclamação e devolver os documentos entregues com a mesma (artigo 32º, n.º 2, da CMR). A R. nunca enviou à A. uma comunicação escrita em que recusasse ressarcir os danos e nunca devolveu os documentos que a mesma lhe enviou com a reclamação que apresentou. Consequentemente, o prazo de prescrição nem sequer começou a contar.

Sem prescindir, acrescenta que o prazo de prescrição a considerar sempre seria de três anos e não de um ano, na medida em que a A. invocou que a R. atuou com dolo (artigo 32º, n.º 1, da CMR). A A. instaurou a ação em 25 de maio de 2015 e requereu a citação da R. Até 9 de junho de 2015, não existe registo de qualquer movimentação processual por parte da secretaria ou do tribunal. Assim, o prazo para a prescrição interrompeu-se em 31 de maio de 2015 (artigo 323º, n.º 2, do Código de Processo Civil). Em 9 de junho de 2015, o prazo começou a contar (novamente, de três anos), sendo que apenas terminaria em 9 de junho de 2018. A R. foi citada em janeiro de 2017. Consequentemente, também por esta razão não ocorreu a prescrição.

Dispensada a audiência prévia, o tribunal entendeu que os autos já permitiam, nessa fase, conhecer de imediato do objeto da ação, pelo que passou a apreciar a referida exceção perentória, ao abrigo do art.º 595º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil, especificando desde logo como provados os seguintes factos:[2] 1.

A autora é uma sociedade comercial que se...

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