Acórdão nº 3435/05.9TBVNG-D.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE SEABRA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 3435/05.9TBVNG- D.P1 - Apelação Origem: Vila Nova de Gaia – Instância Central – 5ª secção – Família e Menores - J3 Relator: Jorge Seabra 1º Adjunto Des.

Maria de Fátima Andrade 2º Adjunto Des.

Oliveira Abreu* *Sumário: ......................................................

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* *Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO: 1.

B...

propôs o presente processo contra C...

, requerendo, a final, que seja decretada a cessação de alimentos do autor em favor da ré, sustentando, no essencial, ter ocorrido, após a fixação do valor de alimentos que acordou pagar à ré, uma diminuição significativa ao nível dos seus rendimentos [por via da situação actual de reformado em que se encontra] e, ainda, ao nível da composição do seu agregado familiar, pois que veio a contrair novo matrimónio, fruto do qual veio a nascer o seu filho D..., a 2.08.2010.

Destarte, sustentou que, em face deste seu novo circunstancialismo, os seus rendimentos diminuíram, as suas despesas são maiores (por ter constituído família e ter agora um outro filho menor a seu cargo), o que, a seu ver, à luz do preceituado nos arts. 2012º e 2013º, n.º 1 al. b) do Cód. Civil, deve determinar a cessação da sua obrigação alimentar em favor da ré, sua ex-cônjuge.

*2.

Realizada conferência, não foi possível obter o acordo das partes.

*3.

Nesta sequência, veio a ré deduzir oposição à pretensão do autor, alegando não ter condições de saúde para prover ao seu próprio sustento, vivendo em condições muito precárias, sendo certo que o autor vive com conforto, tendo rendimentos suficientes para continuar a suportar o pagamento da pensão oportunamente fixada.

Impugnou, ainda, os rendimentos e as despesas alegadas pelo autor.

*4.

Foi dispensada a realização de audiência prévia, fixado o objecto do litígio e os temas de prova.

*5.

Efectuado o julgamento, veio a ser proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo a ré do pedido de cessação da obrigação alimentar a cargo do autor.

*6.

Inconformada, veio o autor interpor recurso de apelação, em cujo âmbito deduziu as seguintes CONCLUSÕES A- DA MATÉRIA DE FACTO – De acordo com o disposto no nº1 do art.662º ex vi art.640º, ambos do Código de Processo Civil, os documentos juntos pelas partes impõe uma decisão diferente relativamente: 1. Á al.d) da matéria de facto dada como assente, devendo considerar-se provado que a partir de Março de 2010 o Recorrente passou a auferir uma pensão mensal de 1.221,27 €; 2. Á al.g) da matéria de facto dada como assente, que o Recorrente e o seu agregado familiar têm uma média despesas mensais de 1200 €; 3. Á al.i) da matéria de facto dada como assente, que o Recorrente é titular de saldos e aplicações bancárias de 40.561,73 € e 44,01 €; 4. Á al.o) da matéria de facto dada como assente, que a Recorrida não provou ter mais do que 239,74 € - ou seja, electricidade 38,28 €, condomínio 36 €, água 15,46 e alimentação 150 €; B- DA MATÉRIA DE DIREITO 5. A sentença recorrida violou os arts.2004º, 2016º e 2016º-A do Código Civil porquanto a Lei 61/2008, de 3/10 – que introduziu alterações significativas ao regime de alimentos entre ex-cônjuges, que aderiu ao chamado princípio da auto-suficiência, conferindo, em regra, o direito a alimentos entre cônjuges um caracter temporário e natureza subsidiária; 6. Sendo que o nº 3 do art.2016º do Código Civil preceitua que, o direito a alimentos poderá ser negado por razões de equidade; 7. Entende-se que o Tribunal a quo violou estas normas, pois, face à matéria de facto que deverá ser tida como provada, por força dos documentos juntos aos autos, o pressuposto da impossibilidade económica do Recorrente manter o pagamento da pensão de alimentos, se verifica; 8. Na medida em que, se o Recorrente tem um rendimento mensal médio de 1200 € e um valor de despesas (suas e do agregado familiar) no mesmo valor, não tem possibilidade económica de continuar a de pagar a pensão de alimentos à sua ex-mulher e é completamente injusto que a mesma tenha de ser paga com recurso as poupanças que o Recorrente conseguiu arrecadar em toda a sua vida e que, relativamente às quais, a Recorrida foi contemplada com tornas no valor de 90.000 €, aquando da partilha de bens subsequente ao divórcio de ambos.

  1. Por outro lado, também se considera que, face à alteração que se impõe relativamente à matéria de facto relativa às despesas mensais médias da Recorrida, e tendo em consideração que a Recorrida terá direito ao Complemento Social para Idosos (DL nº 232/2005, de 29/12) e a outras regalias, tais como benefícios sociais relativos a electricidade, passe social e medicamentos, não terá necessidade da manutenção da pensão de alimentos por parte do seu ex-cônjuge; 11. Sendo que, pelos motivos expostos e por razões de equidade, nem sequer é exigível que a manutenção do pagamento da pensão de alimentos se faça em detrimento das obrigações alimentares que o Recorrente tem em relação à sua actual cônjuge e aos seus filhos, todos dependentes económica e exclusivamente do Recorrente, de acordo com o preceituado no nº2 do art.2016º-A do Código Civil.

  2. A sentença recorrida é contrária à lei e, a actual jurisprudência, além de dar relevância ao caracter excepcional das pensões de alimentos a ex-cônjuges, ainda refere que não pode a obrigação alimentar sacrificar o mínimo necessário à vida normal do cônjuge devedor.

  3. E mesmo o Acordão Constitucional nº 394/2014, de 7 de Maio, publicado no DR, 2ª Série, nº 108 de 5.06.2014, considera que não pode ser deduzida a uma pensão auferida pelo obrigado uma prestação alimentar que não acautele o direito a não ser privado do que se considera essencial a uma existência minimamente condigna, na medida em que prive o obrigado à prestação de alimentos ao mínimo indispensável à sua sobrevivência (e neste caso do seu agregado familiar economicamente dependente), por violação do princípio da dignidade humana.

  4. É que a sentença recorrida teve como preocupação exclusiva acautelar a situação da recorrida sem atender à normal subsistência do Recorrente e do seu agregado familiar.

*7.

Não foram oferecidas contra-alegações.

*8.

Foram cumpridos os vistos legais.

* II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não sendo lícito a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas se mostrem de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, n.º 4, 637º, n.º 2, 1ª parte e 639º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013 de 26.06 [doravante designado apenas por CPC].

Por outro lado, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não antes suscitadas pelas partes em 1ª instância e ali apreciadas, sendo que a instância recursiva, tal como configurada no sistema de recursos vigente no nosso Código de Processo Civil, não se destina à prolação de novas decisões judiciais, mas ao reexame ou à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias, em função das questões convocadas pelas partes perante a 1ª instância. [1] Neste enquadramento e no seguimento de tais princípios, em função das conclusões recursivas do autor, as questões a dirimir são as seguintes: (i.) se o tribunal recorrido incorreu em erro na apreciação da prova produzida e quanto aos pontos concretamente impugnados pelo recorrente; (ii.) se incorreu o tribunal recorrido em erro de julgamento quanto à cessação da obrigação de alimentos do autor a favor da ré.

*III. FUNDAMENTOS de FACTO: Em 1ª instância consideraram-se provados os seguintes factos:

  1. Por decisão homologatória de acordo, proferida a 19.06.2006 e transitada em julgado, foi decretado o divórcio entre C... e B..., tendo, além do mais, os cônjuges aí requerentes definido por acordo que o aqui autor ficaria obrigado a pagar à ora ré a quantia mensal de € 200,00, actualizável anualmente, consoante o índice de inflação verificado no ano civil anterior, de acordo com a informação do INE, até ao dia 1 de cada mês, com início em Julho de 2006.

  2. O autor trabalhou ao serviço de “E..., Grupo SGPS “, como encarregado de construção civil, até ao ano de 2010, auferindo o salário mensal de € 2.820,95.

  3. Em 2010, reformou-se e, a partir de Março de 2010, passou a auferir a pensão mensal do regime contributivo do Centro Nacional de Pensões, pensão que, em Junho de 2014, se cifrava no valor líquido (abatidos os descontos) de € 1.182,17.

  4. O autor é casado com F..., desde 15.11.2008, vivendo com a sua mulher e com dois filhos, D... e G..., nascidos a 2.08.2010 e 11.03.1997, respectivamente, sendo ambos estudantes, a cargo dos pais.

  5. A mulher do autor não exerce actividade profissional remunerada.

  6. O autor tem despesas mensais, com pagamento de despesas de alimentação e vestuário do agregado familiar e despesas escolares dos filhos, IMI e seguro da habitação em que residem, fornecimento de água, electricidade, gás, tv cabo, telefone e internet, e despesas de saúde, a quantia mensal média e aproximada de, pelo menos, € 1.050,00.

  7. Nos anos fiscais de 2013 e 2014, o autor declarou o rendimento global de € 18.228,26, tendo recebido reembolsos de IRS de € 2.337,44 e € 2.151,13, respectivamente.

  8. À data de 17.10.2016, o autor era titular de saldos bancários e aplicações financeiras de poupança, depositados na H..., com os montantes de € 8.000,00, € 40.561,73 e € 466,01.

  9. O autor não aufere qualquer outra pensão ou prestação social, além da pensão identificada em c).

  10. A ré foi submetida a artroplastia total do joelho direito, com mau resultado cirúrgico, mantendo défice marcado da flexão do joelho direito e défice da força muscular do quadricepete, apresentando dor intensa no joelho direito, incapacitante, com claudicação na marcha.

  11. A ré padece ainda de gonartrose do joelho esquerdo...

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