Acórdão nº 263/15.7GAPFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Fevereiro de 2018

Data21 Fevereiro 2018
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

263/15.7GAPFR.P1.

*Acordam na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:*No processo comum nº 263/15.7GAPFR.P1, do 1º Juiz da Secção Criminal, Instância Local de Paços de Ferreira, comarca do Porto Este, foi o arguido B... condenado, como autor material da prática de um crime de desobediência previsto no Art. 348º, nº 1, alínea b), do Código Penal, na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 12 meses, sujeitando-se essa suspensão às seguintes regras de conduta: frequência de tratamento médico para combate à dependência de álcool, realização de entrevistas periódicas com o técnico de reinserção social, apresentação à DGRS sempre que para tal for convocado.

O arguido não cumpriu de forma voluntária tais regras de conduta, pelo que foi proferido despacho a declarar a revogação da suspensão de execução da pena.

*Desta decisão recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões (sic), que balizam e limitam o âmbito do recurso (Ac. do STJ, de 15.04.2010, in http://www.dgsi.pt: “Como decorre do Art. 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso”):*I. Veio o Tribunal "a quo" por douto despacho de fls..., revogar a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao Arguido/Recorrente e em consequência determinar o cumprimento da pena de 8 meses de prisão.

  1. Para tanto, fundamentou o Tribunal "a quo" que o arguido "violou grosseiramente os deveres que lhe foram impostos como condição da suspensão da execução da pena, tendo o programa de tratamento a que se encontrava sujeito sido suspenso e, por sua iniciativa." sendo que, "Tal conduta coloca, definitivamente, em causa o juízo de prognose favorável que esteve na base da suspensão da execução da pena de prisão, revelando-se a simples ameaça da pena de prisão claramente insuficiente para manter o arguido afastado da delinquência, conformando o seu comportamento no respeito pelas normas que regem ética e juridicamente a nossa comunidade." III. Não pode porém o Arguido/ Recorrente concordar com a Meritíssima Juiz de Direito no que respeita à violação grosseira das regras de conduta impostas.

  2. Senão vejamos: O arguido formulou convicção de que não iria ser mais seguido pelo seu médico assistente, pois acreditava ter-lhe sido dada alta médica, tendo informado a Técnica da Direcção-Geral de Reinserção Social desse facto.

  3. O mesmo, em sede de audição, reiterou a sua convicção por a entender em conformidade com o sucedido, contudo após a informação prestada pelo seu médico Assistente, constatou que percepcionou de forma errada o que lhe havia sido dito e assumindo o erro de compreensão, em requerimento apresentado e junto aos presentes autos a fls..., assumiu: "Tudo não terá passado de um mal entendido por parte do arguido", e requereu que fosse "possibilitado ao arguido o cumprimento do tratamento médico que lhe foi imposto".

  4. Daqui resulta indubitável que as declarações prestadas pelo Arguido/Recorrente deveram-se a um "mal entendido", sendo que nunca pretendeu o mesmo desrespeitar o Tribunal.

  5. O Arguido/Recorrente, conforme consta das informações prestadas pela técnica da Direcção-Geral de Reinserção Social, é um homem de 48 anos, com baixa escolaridade (4.° ano), que se dedicou à profissão de "trolha", e que apresenta limitações visíveis ao nível do entendimento, pautando o seu comportamento por modos rudes e brutos, e com diversas dificuldades no trato com as pessoas em geral, sendo tais factores da personalidade exógenos ao processo de desenvolvimento do arguido.

  6. Assim somos a concluir que as limitações de percepção e o difícil trato do Arguido/ Recorrente sendo um traço próprio da personalidade do mesmo não podem, nem devem, ser suficientes para considerar o erro ocorrido como sendo grosseiro, pois que, não foi, nem é intenção do Arguido/Recorrente não cumprir com o tratamento médico imposto.

  7. Reaviva-se que o Arguido/Recorrente realizou todos os exames médicos requeridos pelo seu médico assistente e nunca se furtou a comparecer nas entrevistas com a técnica da Direcção-Geral de Reinserção Social, tanto mais que a mesma veio considerar em sede de relatório que "Tendo em conta a avaliação supra efectuada, consideramos que B... apresentou, uma postura, aparentemente, cumpridora das regras às quais se encontrava sujeito no âmbito do presente processo." X. Mais, o arguido nunca disse, quer em sede de audição, quer nas entrevistas na Direcção-Geral de Reinserção Social, quer nos requerimentos apresentados em juízo, que não pretendia cumprir com as regras de conduta impostas como seja a do tratamento médico, imposição essa recorde-se feita com o consentimento do arguido, tanto que o mesmo foi aos autos declarar expressamente aceitar o tratamento médico e a marcação de novas consultas médicas.

  8. Assim, não pode o Arguido/Recorrente concordar com o douto despacho exarado pela Meritíssima Juiz de Direito, pois, salvo o devido respeito por opinião em contrário, o comportamento do Arguido/Recorrente não reflecte uma violação grosseira dos deveres impostos, quanto muito poderá entender-se como uma violação a título de neglicência.

  9. De outro modo, o comportamento do Arguido/Recorrente não se apresenta como um comportamento indesculpável em que o comum dos cidadãos não incorra e que não mereça ser tolerada nem desculpada.

  10. Acresce que o Arguido/Recorrente entre a data da prolação da douta sentença, 18-05-2015, e a presente data, não foi condenado pela prática de quaisquer outros factos ilícitos, seja de natureza criminal ou de qualquer outra natureza, pois que tem mantido uma conduta de estrito cumprimento das regras e instituições.

  11. Pode-se assim afirmar que a simples ameaça da pena de prisão claramente foi suficiente para o arguido não reincidir na prática de novos crimes, e bem assim, que as finalidades de prevenção geral e especial não foram abaladas de tal forma que justifiquem a revogação da suspensão da pena de prisão aplicada.

  12. Aliás, o Tribunal "a quo" ao determinar que o Arguido/Recorrente cumpra a pena 8 meses de prisão em estabelecimento prisional, em nada promove a sua reintegração na sociedade; pelo contrário, cria-se ainda mais estigma sobre a sua personalidade e maiores dificuldades na sua profissionalização.

  13. Esta imposição extravasa, em muito, as finalidades subjacentes à aplicação de penas, mesmo as de natureza criminal, pois como é do conhecimento geral, os estabelecimentos prisionais são verdadeiras "escolas do crime", em que o efeito de ressocialização que lhe estaria subjacente raramente é bem-sucedido, havendo, pelo contrário, um aperfeiçoamento de técnicas e uma propensão para o aumento de práticas desconformes ao...

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