Acórdão nº 784/14.9GBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelCRAVO ROXO
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 784/14.9GBVNG.P1*Acordam na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:*No processo comum nº 784/14.9GBVNG, do 3º Juiz da Secção Criminal, Instância Local, de Vila Nova de Gaia, comarca do Porto, foi proferida decisão com o seguinte contexto: - Condenar o arguido B…, pela prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203°, n° 1 do Código Penal, na pena de 5 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, acompanhada de regime de prova.

- Condenar o arguido C…, pela prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203°, n° 1 do Código Penal, na pena de 4 meses e 15 dias de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, acompanhada de regime de prova.

*Desta decisão recorre o Ministério Público, formulando as seguintes conclusões (sic), que balizam e limitam o âmbito do recurso (Ac. do STJ, de 15.04.2010, in http://www.dgsi.pt: “Como decorre do Art. 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso”):*1. Foram os arguidos absolvidos da prática do crime de furto qualificado, p. e p. pelos art. 203º, n.º1 e 204º, n.º2, alínea e), ambos do Código Penal - e condenados pela prática do crime de furto simples, por se ter entendido que a conduta daqueles, pese embora se tenham introduzido ilegitimamente num espaço fechado, não integra a prática do referido crime.

  1. Ora, não podemos, de todo, concordar com tal absolvição e subsequente condenação pela prática de um crime de furto simples. E mesmo até com base nos factos dados como demonstrados na sentença ora colocada em crise.

  2. Com efeito, se concordamos que os factos demonstrados não cabem no âmbito da previsão da alínea e), do n.º2, do citado artigo 204º, do referido Código (não pela noção de espaço fechado, mas antes pela definição do que deva entender-se por arrombamento ou escalamento), entendemos outrossim que os mesmos integram a prática do crime previsto e punido pelos artigos 203º, n.º1 e 204º, n.º1, alínea f), ambos do mencionado diploma legal.

  3. Com efeito, resultou demonstrado que “No período compreendido entre as 9 as 10 horas do dia 03 de Setembro de 2014, os arguidos, juntamente com um outro indivíduo de identidade desconhecida, em execução de um plano previamente elaborado e em conjugação de esforços, dirigiram-se ao Estaleiro de obras, da propriedade da empresa “D…, Lda.”, sito na rua …, .., …, Vila Nova de Gaia, com o intuito de aí entrarem e de daí levarem todos os objectos que lhes interessassem e que pudessem transportar. Uma vez lá chegados, escalaram o muro que veda o dito estaleiro, acedendo, desse modo, ao seu interior”. Ora, a ser assim, é nosso entendimento que o crime cometido pelos arguidos é um crime de furto qualificado, pois aqueles se introduziram num espaço totalmente fechado.

  4. Se é inegável que um estaleiro não corresponde a uma casa nem a um espaço fechado dela dependente, a verdade é que constitui, indubitavelmente, um espaço fechado a que alude alínea f), do n.º 1, do artigo, pois como tal devem considerar-se os locais simplesmente vedados (seja por uma rede, seja por um muro), ainda que sem qualquer ligação a uma habitação ou a um estabelecimento comercial ou industrial. Com efeito, como resulta, aliás, dos factos dados como provados, o estaleiro propriedade do ofendido era vedado em toda a sua extensão - e por um muro. Não é, então, um espaço fechado? 6. Concluindo-se que o estaleiro (de construção civil) é um espaço fechado, entendemos que os arguidos deveriam ter sido condenados pela prática do referido crime. Não se desconhece o Acórdão citado na sentença ora colocada em crise e que a mesma segue de muito perto. Nem mesmo o AUJ n.º 7/2000 ali citado. A verdade é que este aresto do STJ se refere exclusivamente ao disposto no artigo 204º, n.º2, alínea e) e à noção de espaço fechado aí referida, sendo certo que não nos parece que possa fazer-se a transposição para o n.º1, do citado artigo 204º, como é feita, pois que o AUJ fala expressamente na remissão para os conceitos do artigo 202º, do Código Penal e do que deva entender-se por “penetração em espaço fechado” nos termos da citada norma (por arrombamento ou escalamento).

  5. Pelo que deviam B… e C… ter sido condenados pela prática do mencionado crime, cuja moldura penal é de pena de prisão até 5 anos ou pena de multa até 600 dias.

  6. Ao não o fazer, violou a sentença ora colocada em crise o disposto no artigo 204º, n.º1, alínea f), do Código Penal.

  7. Assim, dentro dos limites abstractos definidos pela lei, e apelando a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, depõem a favor ou contra os arguidos - art. 71º, n.º2, do Código Penal - tendo em consideração que os arguidos agiram com a modalidade mais forte de culpa, representando e querendo o resultado obtido, e que B… e C… já tinham antecedentes criminais pela prática de crimes contra o património (sendo que o B… veio, entretanto, a ser condenado pela prática de um crime de dano), e se é certo que o Tribunal deve dar preferência à pena de multa, quando esta seja prevista em alternativa à pena de prisão, a verdade é que só o pode fazer, quando ela se mostre adequada às finalidades da punição.

  8. Parece-nos evidente que a pena de multa não surtiu qualquer efeito ressocializador naqueles, ou seja, a pena de multa não satisfaz de modo adequado as finalidades da punição.

  9. Deve, pois, optar-se pela pena de prisão, só se assim se alcançando as finalidades da punição. Quanto à fixação concreta, deveremos ter presentes todos os circunstancialismos referidos supra, por um lado e, por outro, o facto de os bens subtraídos terem sido recuperados.

  10. Tudo ponderado, afigura-se-nos que os arguidos deverão ser condenados pela prática do crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, n.º1 e 204º, n.º1, alínea f), ambos do Código Penal, atentos os factos dados como provados na sentença recorrida e o supra referido, nas penas de 15 meses de prisão, quanto ao arguido B… e 12 meses de prisão, quanto ao arguido C….

  11. Penas essas que devem ser suspensas na sua execução, pois que se está em crer que a mera ameaça do cumprimento da pena de prisão servirá para os afastar da prática de novos crimes - mais se concordando com a decisão de fazer depender essa suspensão de regime de prova.

  12. Mas, e para a hipótese de assim não se entender, o que só por mera hipótese de raciocínio se concede, entendemos que devia, então, o Tribunal a quo ter condenado os arguidos, em concurso efectivo com tal crime, pela prática do crime de introdução em lugar vedado ao público, p. e p. pelo artigo 191º, do Código Penal.

  13. Com efeito, resultou demonstrado que os arguidos “No período compreendido entre as 9 as 10 horas do dia 03 de Setembro de 2014, os arguidos, juntamente com um outro indivíduo de identidade desconhecida, em execução de um plano previamente elaborado e em conjugação de esforços, dirigiram-se ao Estaleiro de obras, da propriedade da empresa “D…, Lda.”, sito na rua …, .., …, Vila Nova de Gaia, com o intuito de aí entrarem e de daí levarem todos os objectos que lhes interessassem e que pudessem transportar. Uma vez lá chegados, escalaram o muro que veda o dito estaleiro, acedendo, desse modo, ao seu interior. Do interior do estaleiro, os arguidos retiraram um bidé em cerâmica de cor branca, um cabo trifásico de cor preta, diversas torneiras cromadas em latão, diversos sifões cromados em latão e diversos cabos eléctricos monofásicos, tudo no valor total declarado de €250,00 (duzentos e cinquenta euros).” 16. Ou seja, os arguidos introduziram-se, sem autorização de quem de direito, num espaço inacessível ao público em geral.

  14. A ser assim, e na hipótese académica de se considerar que o...

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