Acórdão nº 44/1999.E2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução23 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. A fls. 36 foi proferido o seguinte despacho: 1. AA e mulher, BB, vieram interpor recurso para uniformização de jurisprudência do acórdão deste Supremo Tribunal, de 18 de Setembro de 2014, que concedeu provimento à revista interposta pelo Município de Setúbal, condenando-os a reconhecer a natureza pública do “caminho que sai da E.N.10 e atravessa a sua propriedade até à Igreja de S ….” Como fundamento, invocaram contradição com o acórdão deste Supremo Tribunal de 2 de Dezembro de 1992, proc. nº 80324, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº 422, 1993, pág. 355 a 364, “sobre as mesmas questões e conceitos jurídicos, a saber, «qual o período temporal que, para o STJ é determinante, quanto ao conceito de tempo imemorial, para que um caminho seja considerado público» e qual o conceito de «tempo de memória dos homens» que é atendível para a definição de tal conceito”.

    O Município de Setúbal veio sustentar a inadmissibilidade do recurso, por não existir “qualquer divergência jurisprudencial (…); do que se trata é que a subsunção de tal jurisprudência uniforme [no sentido de que é uso imemorial aquele “cujo início já não é alcançado pela memória das pessoas vivas”] e incontestada aos factos apurados num processo, aquele em que foi proferido o acórdão recorrido, conduziu à atribuição ao caminho de uma natureza dominial, enquanto a subsunção de tal jurisprudência aos factos no processo onde foi proferido o acórdão fundamento, conduziu a uma solução contrária”.

  2. O recurso para uniformização de jurisprudência é um recurso extraordinário; ou seja, é interposto de decisões transitadas em julgado (artigos 627º, nº 2 e 689º, nº 1 do Código de Processo Civil).

    O seu objecto é estritamente a “questão fundamental de direito” (nº 1 do artigo 688º) sobre a qual se verificou a divergência jurisprudencial; o conhecimento do recurso restringe-se à apreciação dessa “questão controvertida” e às implicações que o respectivo julgamento tenha no acórdão recorrido, que é revogado pela “decisão que verifique a existência da contradição jurisprudencial” (nº 2 do artigo 695º).

    Significa isto, no caso concreto, que ainda que o recurso fosse admissível, não se poderia reponderar qual o uso público relevante, que os recorrentes fixam no “final da década de 1970” – “(…) e cuja utilização, para os efeitos de relevância para determinação de afectação aos interesses públicos relevantes (para acesso à capela e festa anual) se iniciou, pelo menos, nos finais da década dos anos 70 do século XX”.

    Como então se escreveu no ponto 4. do acórdão recorrido, estava “apenas em causa saber se a matéria de facto provada, no que respeita ao tempo de utilização pública do caminho dos autos, é suficiente para o considerar como um caminho público”.

  3. Segundo os recorrentes, a divergência entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento desdobra-se em dois aspectos: – “qual o período temporal que, para o STJ é determinante, quanto ao conceito de tempo imemorial, para que um caminho seja considerado público» – e qual o conceito de «tempo de memória dos homens» que é atendível para a definição de tal conceito”(…).”.

    Quanto ao primeiro, cumpre observar que não ocorre qualquer contradição de jurisprudência, uma vez que o acórdão fundamento não tem o sentido que os recorrentes lhe atribuem.

    No ponto C das alegações de recurso (pag. 15), maxime na sua parte final, os recorrentes dizem que “o acórdão fundamentador afirma que, nem sequer a prova da existência de um caminho por cerca de 120 anos constitui tempo mínimo necessário para a verificação da característica de tempos imemoriais, sendo tempo imemorial aquele cujo início se perdeu na memória dos homens pela sua antiguidade”.

    E que o “acórdão recorrido entende bastar o uso durante mais de 60 anos de um caminho e que, para efeitos de tempo de memória útil é suficiente o tempo de média útil da vida humana”.

    No entanto, da interpretação do acórdão fundamento não resulta de forma alguma que o Supremo Tribunal tenha excluído a utilização imemorial afirmando que nem 120 anos são suficientes para o efeito.” O que ali se diz, textualmente, é o seguinte: “(…) o tempo imemorial é aquele tão antigo que o seu início se perde na memória dos homens ou, dito de outro modo, aquele cujo...

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