Acórdão nº 189/13.9GLNH.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMAIA COSTA
Data da Resolução09 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA, com os sinais dos autos, foi condenado pelo tribunal coletivo da extinta comarca da Lourinhã, por acórdão de 4.6.2014, pela prática de um crime de homicídio qualificado, p. e p.

pelos arts. 131º e 132º, nºs 1 e 2, a), ambos do Código Penal (CP), na pena de 19 anos e 6 meses de prisão, e ainda pela prática de um crime de furto simples, p. e p.

pelo art. 203º, nº 1, do CP, na pena de 1 ano de prisão.

Em cúmulo jurídico destas penas, foi condenado na pena única de 20 anos de prisão.

Desse acórdão recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 12.11.2014, negou provimento ao recurso.

Novamente inconformado, vem o arguido agora recorrer para este Supremo Tribunal, concluindo: 64-O recorrente vem apresentar recurso do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que considerou improcedente o recurso do recorrente condenou o arguido AA, confirmando o acórdão de primeira instância que condenou o recorrente “pela prática, em autoria material e na sua forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punível, pelos arts.º 131º e 132º, nºs 1 e 2, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 19 (dezanove) anos e 6 (seis) meses de prisão e, em concurso efectivo.

65-O recurso incidiu sobre a matéria de facto, requerendo-se a reapreciação da prova gravada, tendo o recorrente alegado que o douto acórdão recorrido enferma dos vícios de erro notório na apreciação da prova., artigo 410 n.º2, al. c) CPP) e insuficiência para a decisão da matéria provada, artigo 410 n.º2, al.

  1. CPP.

    66- Mais alegou o recorrente que o acórdão em crise violou o princípio “ IN DUBIO PRO REO”.

    67-Por fim, e sem prejuízo de se pugnar pela absolvição do arguido, alegou o recorrente estar a medida da pena incorrectamente avaliada, por excessiva.

    68- Entendeu assim o douto acórdão recorrido, que o Tribunal “a quo” decidiu bem, não merecendo o acórdão proferido em primeira instancia qualquer reparo.

    “Ora, o Tribunal recorrido, como facilmente se alcança da fundamentação da decisão acima transcrita, observou estes princípios, inexistindo quaisquer saltos ilógicos ou arbitrários, respeitando os juízos de inferência, a lógica e regras de experiência de vida, pelo que o conjunto da prova produzida, analisada criticamente, merece-nos a convicção de que o recorrente praticou da forma supra citada os factos pelos quais foi condenado, tendo-se por excluída outra explicação lógica plausível.

    Assim se conclui não haver qualquer razão para colocar em causa a apreciação da prova feita pelo tribunal, porquanto formou a sua convicção por critérios lógicos, objectivos, e em conformidade com as regras da experiencia comum, segundo o princípio consagrado no artigo 127 do CPP, conduzindo tal apreciação da prova àquele resultado probatório.” 69- O recorrente não aceita tal entendimento, porquanto, ao contrário do que se sustenta no douto acórdão recorrido, a discordância do recorrente não está na apreciação feita pelo douto tribunal “a quo”, mas no erro notório da apreciação da prova, nos termos e para os efeitos do artigo 410 n.º2, al. c) CPP, o que se reitera no presente recurso. Vejamos; 70- Nas suas alegações de recurso o recorrente, indicou, como lhe competia, além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios de prova constantes da gravação, ou seja, os depoimentos que, em seu entender, impunham decisão diversa quanto àqueles pontos, por referência ao mencionado na acta (art. 690.º-A, n.º 2, do CPC), referindo o número da cassete, o lado e as rotações em que começa e termina a gravação de cada depoimento (art. 522.º-C, n.º 2, do CPC).

    72-- O recorrente especificou os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados.

    73- Não corresponde à verdade, como se sustenta no douto acórdão recorrido, “que o recorrente se limitou a extrair excertos isolados dos referidos depoimentos, interpretando o depoimento das testemunhas apenas a partir desses excertos descontextualizados, sem atentar no que foi a globalidade de tais depoimentos, e o modo como o tribunal os concatenou com os demais meios de prova” e que “reexaminadas as provas indicadas, verifica-se que o recorrente se limitou a extrair excertos isolados dos referidos depoimentos, interpretando o depoimento das testemunhas apenas a partir desses excertos descontextualizados, sem atentar no que foi a globalidade de tais depoimentos e o modo como o tribunal os concatenou com os demais meios de prova”, de forma a deste modo construir a sua versão dos factos”.

    74- O recorrente transcreveu os depoimentos da matéria de facto que considerou incorrectamente julgada, tendo assim especificado as provas que impõem a alteração da decisão recorrida sobre a matéria de facto, nos termos e para os efeitos do art.º 413º nº 4 do CPP.

    75- Sucede porém que, no entender do recorrente, sem prejuízo do principio da livre apreciação da prova (artigo 127 do CPP), o acórdão em crise enferma de erro notório na apreciação da prova., nos termos do disposto no artigo 410 n.º2, al. c) CPP.

    76- Como é sabido “O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão por provados factos que, face às regras de experiência comum e à lógica corrente, não se teriam podido verificar ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsos: trata-se de um vício do raciocínio na apreciação das provas, evidenciado pela simples leitura do texto da decisão, erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de particular exercício mental; as provas revelam claramente um sentido e a decisão recorrida extraiu ilação contrária, logicamente impossível, incluindo na matéria fáctica provada ou excluindo dela algum facto essencial – cf. Ac. do STJ de 03-07-02, Proc. n.º 1748/02 - 3.ª”.

    77- Entende o recorrente que o douto tribunal “a quo”, por resultar da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, deveria ter dado como provado que; “na data de ocorrência do homicídio, o arguido e BB tinham uma relação amorosa, com encontros de carácter sexual”.

    78- A evidência desta relação amorosa é fundamentada, não apenas pelas declarações do arguido e da testemunha BB, como pela prova documental, junta em audiência de discussão e julgamento.

    79-Os referidos documentos consistem em cartas enviadas por BB ao arguido para o estabelecimento prisional, e extractos bancários da conta do arguido, e comprovam, de forma irrefutável o relacionamento amoroso e os encontros de caracter sexual entre o arguido e BB, a data de ocorrência dos factos.

    80-Estes documentos não foram postos em causa pelo douto tribunal “a quo”, e, claramente fazem prova válida, não podendo ser excluídos pelo julgador, na necessária análise da prova produzida em audiência de discussão e julgamento.

    81-A carta enviada pela testemunha BB ao arguido, conjugada com o seu depoimento, revela sem margem para dúvidas um relacionamento amoroso, chegando ao ponto de dizer que o ama! 82- No entender do recorrente deveria ter sido dado como provado que “No dia 27 de Fevereiro, antes de abandonar a habitação, o arguido furtou combustível da viatura do assistente”.

    A perícia efectuada ao automóvel do arguido encontrou garrafas de água com vestígios de gasóleo, para além de um intenso cheiro a combustível no interior do veículo, facto que também foi confirmado pela Inspectora LL.

    83- Também resultou claramente da prova produzida que “o assistente possuiu um machado, uma catana e dois revólveres”.

    84- O próprio assistente declarou em audiência de discussão e julgamento que “possuía um machado, uma catana e dois revólveres”, daqui resultando não se compreender, dada a inquestionável evidencia, que tal matéria não tenha sido dada como provada.

    85- Se o douto tribunal “a quo” considera o assistente credível nas suas declarações, pela mesma lógica de raciocínio, terá que dar como provada esta matéria, que resulta desde logo das suas próprias declarações.

    86- Dúvidas não restam que o douto tribunal “a quo” não questiona a credibilidade do assistente, podendo ler-se no acórdão em crise “O Tribunal recorrido conferiu fundadamente credibilidade ao depoimento do assistente, mostrando-se o seu depoimento, como vimos, corroborado, por outros meios de prova”.

    87- Também não se aceita que o acórdão em crise não tenha dado como provado que o assistente é uma pessoa agressiva.

    Com efeito, no douto acórdão recorrido, certamente por lapso de escrita, pode ler-se, referindo às alegações do recorrente: “Insurge-se com o facto de o tribunal, contrariando a lógica e o senso comum, ter considerado credível o depoimento do assistente, invocando que o mesmo mentiu ao tribunal, no que se reporta à catana, precisamente para não ser incriminado”.

    Alega ainda que a prova produzida acerca da personalidade do assistente deveria ter dado como provado que “O assistente tem uma personalidade profundamente agressiva e conflituosa (cf. Depoimento da testemunha CC relatando um episódio com o seu marido e o assistente em que este o quis agredir com um tijolo)”.

    88- O recorrente nunca atribuiu, nem o poderia fazer, tais declarações à sua prima CC, como se verifica da análise das suas alegações. Tal depoimento foi feito pela testemunha DD, tia do arguido, relatando um episódio em que o assistente tentou agredir o seu marido com um tijolo na cabeça.

    89- O referido episódio revela, por si só, a natureza agressiva do assistente.

    90-Ao não dar como provada esta matéria, que resulta de prova testemunhal, não posta em causa, e consequentemente inequívoca, o tribunal incorreu no erro notório da apreciação da prova, violando assim o disposto no artigo 410 n.º 2 al.

  2. CPP.

    91- Por outro lado, importa referir que o recorrente não põe em causa, como se pretende no douto acórdão recorrido, a validade da prova indirecta, a qual, como é sabido é válida, e tem suporte na nossa jurisprudência.

    92- “Na ausência de prova...

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