Acórdão nº 125/04.3TBSAT..C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelNUNO CAMEIRA
Data da Resolução27 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Resumo dos termos essenciais da causa e da revista AA e mulher BB propuseram uma acção ordinária contra CC e mulher DD, EE, FF, GG e mulher HH, pedindo:

  1. Que seja reconhecido aos autores o direito de preferir na venda do prédio rústico que identificam no artº 1º da petição inicial, a que se refere a escritura pública junta como doc. 4, inscrito na matriz sob o artº ... e descrito na CRP do ... sob o nº ..., da freguesia de ...; b) Que seja considerada sem qualquer efeito jurídico a escritura realizada e consequentemente cancelados todos os registos efectuados sobre o prédio com base nela, e outros consequentes com base na mesma que se encontrem inscritos a favor dos primeiros réus.

    Alegaram que têm o direito de preferência na venda por serem donos e legítimos possuidores de um terreno rústico que confina com o terreno rústico vendido (artº 1380º do CC), e ainda por sobre o seu terreno recair uma servidão de passagem, constituída por usucapião, a favor do terreno vendido (artº 1555º do CC).

    Apenas os réus CC e mulher DD contestaram; por impugnação, pondo em causa a propriedade dos autores sobre o prédio confinante, a natureza do prédio como rústico e a relevância da servidão constituída por usucapião como fundamento de preferência; por excepção, invocando a caducidade e o abuso do direito dos autores preferirem por um preço declarado muito inferior ao valor real do imóvel (logradouro) em causa.

    Para o caso de assim não se entender pediram, em reconvenção, a condenação dos autores a pagar-lhes o valor de 30.000 €, correspondente ao valor real do prédio à data da transacção.

    Realizado o julgamento, foi proferida em 28/2/14 sentença nos seguintes termos: “Pelo exposto, de facto e de direito, decide-se: I) Julgar procedente, por provada, a presente acção e consequentemente:

  2. Reconhece-se aos AA. o direito de preferir na venda do prédio inscrito na matriz sob o artº ... e descrito na CRP do ... sob o nº..., da freguesia de ..., ..., melhor identificado sob al.G) supra, e de o haverem para si, substituindo-se assim ao Réu comprador, CC, na compra e venda de que este foi objecto através da escritura pública mencionada em K); b) Ordenando-se que, após trânsito em julgado, se comunique à Conservatória de Registo Predial competente o teor desta sentença (com certidão da mesma com nota de trânsito em julgado e do registo de fls 566-8) para averbamento oficioso da alteração correspondente; c) Absolvendo-se todos os RR. de tudo o mais contra si peticionado; II) Julgar improcedente, por não provada, a reconvenção e consequentemente absolver os AA. reconvintes do pedido reconvencional.

    III) Julgar improcedente o incidente de litigância de má-fé e consequentemente absolver os RR. do respectivo pedido.

    Custas da acção e reconvenção pelos RR”.

    Os réus apelaram, mas sem êxito, pois a Relação de Coimbra, por acórdão de 21/4/15, julgou a apelação improcedente, confirmando a sentença.

    Mantendo-se inconformados, os réus interpuseram recurso de revista para o STJ, sustentando a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por outro que os absolva do pedido ou, em alternativa, julgue a reconvenção procedente, condenando os autores a pagar-lhes a quantia de 30 mil €.

    Fizeram-no com base nas seguintes conclusões úteis: 1ª - À data em que se constituiu o direito de preferência – 22/2/2001 – o prédio referido em A) formava com o referido em X) da base instrutória uma unidade material e física, constituindo o seu logradouro; aplica-se, assim, a excepção do artº 1381º, a), do CC; 2ª - O disposto no artº 1555º do CC não se aplica às servidões constituídas por usucapião; 3ª - Constitui flagrante abuso do direito a pretensão dos autores de adquirir o prédio objecto da preferência por um valor que é quarenta e seis vezes inferior ao seu; 4ª - Em caso de colisão de direitos – direito de preferência e direito de propriedade – deve dar-se prevalência a este quando o exercício daquele exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé e pelo fim económico e social do direito; 5ª - O acórdão recorrido violou os artºs 334º, 335º, 437º, 1380º, 1381º e 1555º do CC.

    Os autores contra alegaram, defendendo a manutenção do julgado.

    Tudo visto, cumpre decidir.

    II.

    Fundamentação 1.

    Matéria de Facto (circunscrita ao seu núcleo essencial, tendo em atenção o âmbito do recurso):

    1. Encontra-se descrito na CRP de ... sob o n.º 01647/021003 o predito rústico denominado ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., composto de terra de pastagem, com a área inscrita de 290 m2, a confrontar do norte com II, do nascente com GG, do sul com JJ e do poente com caminho.

      B) Pela Ap.02/021003 este prédio rústico encontra-se inscrito a favor da Autora BB, casada com o Autor AA, constando como causa de aquisição “partilha extrajudicial da herança de II e mulher KK”; e C) inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ..., constando AA como titular inscrito do direito ao respectivo rendimento.

      D), E) e F) Os Autores, por si e pelos seus ante possuidores, ocupam esse prédio há mais de 30 anos, pagando as respectivas despesas de conservação do mesmo, designadamente os impostos devidos, o que ocorre continuamente e sem qualquer interrupção, à vista de toda a gente, sem oposição de qualquer pessoa, agindo os Autores e os seus ante possuidores na convicção de exercerem um direito próprio e sem lesarem direitos de outrem.

    2. Encontra-se descrito na CRP de ... sob o n.º 00.../081097 um predito rústico denominado …, sito nas …, inscrito na matriz sob o artigo ..., composto de terra de semeadura com videiras, com a área de 2350 m2, a confrontar do norte com caminho, do nascente com LL e outro, do sul com MM e do poente com II.

    3. e I) Pela Ap.1 de 2001/02/28 este prédio encontra-se inscrito a favor do Réu CC, casado com a Ré DD, constando como causa de aquisição “compra a EE, FF e GG, casado com HH”, aquisição esta registada como provisória por dúvidas, tendo sido convertida pela AP.03/280201.

    4. Este prédio rústico encontra-se na matriz predial rústica sob o artigo ..., constando GG como titular inscrito do direito ao respectivo rendimento.

    5. Por escritura pública denominada “Compra e Venda”, celebrada no dia 22/2/01, no 2º Cartório Notarial de Viseu, em que interveio como primeiro outorgante Dr. NN, advogado, em representação dos co-Réus EE, FF e GG, casado com a co-Ré HH sob o regime da comunhão de adquiridos, e como segundo outorgante o co-Réu CC, o primeiro outorgante declarou que, pelo preço de um milhão de escudos, que já recebeu, em nome dos seus representados vende ao segundo outorgante, e este declarou aceitar a venda, dos prédios constantes de um documento complementar, organizado nos termos do artigo sessenta e quatro do Código do Notariado, que faz parte integrante desta escritura, adiantando que tais prédios vieram à posse dos representados do primeiro outorgante por óbito de GG, de quem foram os únicos herdeiros, conforme escritura de habilitação de herdeiros, exarada a folhas noventa e nove e seguintes do livro duzentos e três-H deste Cartório.

    6. Consta como verba nº 7 desse documento complementar “um prédio rústico composto de uma terra de semeadura com videiras, pastagem e palheira, sito ao ..., no lugar de ..., freguesia e concelho ditos, inscrito na matriz sob artigo ..., com o valor declarado de cento e trinta mil escudos.

    7. No dia 13 de Fevereiro de 2001 o co-Réu CC entregou um termo de declaração na Repartição de Finanças de ..., declarando pretender pagar a SISA devida pela mencionada aquisição.

    8. Correram termos no Tribunal Judicial de ... os autos de procedimento cautelar...

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