Acórdão nº 168/12.TRPRT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução22 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: AA, depois constituída assistente, apresentou queixa-crime contra BB, juíza de direito, constituída arguida, imputando-lhe factos que qualificou como crimes de injúria, usurpação de funções, abuso de poder e denúncia caluniosa.

Foi aberto inquérito, no final do qual foi proferido despacho de arquivamento relativamente aos crimes de usurpação de funções, abuso de poder e denúncia caluniosa.

A assistente deduziu acusação particular contra a arguida, pela prática de um crime de injúria p. e p. pelo artº 181º, nº 1, do Código Penal, acusação que o Ministério Público acompanhou.

A arguida requereu a abertura de instrução.

Realizada a instrução, foi proferido despacho de não pronúncia.

A assistente interpôs recurso dessa decisão, concluindo a sua motivação nos termos que se transcrevem: «A. Discordando em absoluto com a decisão instrutória que decidiu não pronunciar a arguida BB pela prática do crime de injúria, ilícito criminal p. e p. pelo artigo 181°, n° 1 do Código Penal, a assistente dela vem interpor o presente recurso.

  1. Pretende com o presente recurso demonstrar que o despacho de não pronúncia incorre em erro notório de apreciação da prova e de interpretação das normas jurídicas aplicáveis, nomeadamente o artigo 181°, n° 1 do Código Penal.

  2. Pretende-se demonstrar que a ilação contida no despacho recorrido de que “tais expressões foram proferidas no âmbito de uma discussão por causa das «pen» e dos documentos que, como resulta dos autos, foi objecto de apreciação noutros, revelando-se deselegantes por parte da arguida, mas sem dignidade para merecerem a tutela penal, por inadequadas a atingir o núcleo essencial das qualidades morais inerentes á dignidade da pessoa humana” é totalmente errada.

  3. Em causa está a apreciação de factos que integram a prática de um crime de injúria. E. Dispõe o artigo 181° do Código penal que “1. Quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra e consideração, é punido com pena de prisão até três meses ou com pena de multa até 120 dias”.

  4. Embora o despacho recorrido seja quase omisso no que toca à factualidade em apreciação, na medida em que se limita a proceder à transcrição das expressões proferidas pela arguida, resultou demonstrado em sede de inquérito, pelas testemunhas que presenciaram os factos, o local e o contexto em que tais expressões foram proferidas.

  5. Sendo que, em nosso entendimento, tais factos são elementares para apreciar o grau de censurabilidade da conduta da arguida.

  6. No que toca ao depoimento da testemunha CC realça-se “que durante o tempo em que esteve no gabinete presumiu que a Sra. Juíza estava alterada falando em voz muito alta e esbracejando, e ria-se em tom de gozo face ás respostas da AA” acrescentando ainda que “(...) a AA estava nervosa e melindrada, estava emocionalmente afectada”: I. Por sua vez, do depoimento da testemunha DD deve realçar-se “que, uma vez no interior do gabinete, a Sra. Juíza, em tom de voz alterado, perguntou à AA se a conhecia” e que “(...) o depoente ficou estupefacto com as acusações e se lembra de a AA ter começado a chorar”.

  7. Importa reter, antes de mais, que tudo se passou no gabinete da Sra. Juíza, aqui arguida, e que a mesma se encontrava suspensa do exercício de funções.

  8. Com interesse para o preenchimento do tipo legal de crime temos que: -a arguida disse à assistente que na escola onde ela tinha andado já ela era professora; -a arguida chamou “farsola” à assistente.

    L. Estas expressões surgem num contexto em que a arguida imputou à assistente fatos pejorativos e fez acusações desprendidas de qualquer fundamento.

  9. A arguida utilizou abusivamente a posição de superioridade conferida pelo facto de ser juíza, bem como pelo facto de o ser num Tribunal onde é assistente a aqui Oficial de Justiça.

  10. Usou ainda a arguida a sua inerente posição de superioridade para amedrontar a assistente, ameaçando-a de que iria ter terríveis consequências, tanto a nível pessoal como profissional.

  11. Tudo se passando num registo puramente inquisitório e na presença dos superiores hierárquicos da assistente, que pela arguida foram convocados para estarem presentes.

  12. Analisados os factos é clarividente que a arguida tinha uma intenção específica e concreta de, por um lado, imputar factos verdadeiramente kafkianos à assistente e por outro de a injuriar, vexar, com clara intenção de ofender a sua honra e consideração.

  13. Contrariamente ao que concluiu a decisão instrutória, somos do entendimento que as expressões proferidas pela...

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