Acórdão nº 24/15.3YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução05 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. AA, preso no Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, à ordem do processo nº 891/12.2PAPTM da Comarca de Faro – Portimão - Instância Central, 2ª Secção Criminal-J1, veio, por intermédio de Advogado, requerer, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, a presente providência de habeas corpus, ao abrigo do disposto no artigo 222º, número 2, alínea c), do Código de Processo Penal e 31º da Constituição da República Portuguesa.

    Alega, em suma, o requerente: “

    1. Da factualidade apurada e do excesso de prisão preventiva 1. A medida de coacção Prisão Preventiva foi aplicada ao Arguido em sede de 1º interrogatório judicial em 22 de Agosto de 2013.

  2. Não tendo sido declarada a excepcional complexidade dos autos, temos que se aplicam os prazos máximos de prisão preventiva previstos no artº 215º, nºs 1 e 2 do Código do Processo Penal.

  3. O arguido foi notificado em 23 de Janeiro de 2015 da colenda decisão sumária do relator sobre o recurso deduzido para o Supremo Tribunal de Justiça, por considerar o mesmo manifestamente improcedente.

  4. O arguido não se conformou com o teor e os fundamentos utilizados na colenda decisão sumária para (a) considerar o seu recurso manifestamente improcedente, pelo que deduziu reclamação para a conferência, ao abrigo do disposto no artº 420º, nº 1, alínea a) e do artº 417º, nº 6, ambos do Código do Processo Penal.

  5. O arguido ainda não foi notificado da decisão sobre a referida reclamação, pelo que o douto acórdão condenatório da 1ª instância ainda não transitou em julgado.

  6. O conceito de trânsito em julgado não resulta expressamente de qualquer disposição do Código do Processo Penal, pelo que é necessário percorrer o caminho do artº 4º do Código do Processo Penal até ao actual artº 628º do Código do Processo Civil (ex-artº 677º), de acordo com o qual se considera transitada em julgado a decisão logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação.

  7. Nestes termos, dada a data de aplicação da referida medida de coacção e o dispositivo legal aplicável, resulta que o prazo máximo de prisão preventiva do arguido expirou em 22 de Fevereiro de 2015, sem o trânsito em julgado do acórdão condenatório proferido no âmbito dos presentes autos.

  8. Pelo que a manutenção da medida de coacção prisão preventiva teria de respeitar os prazos de duração máxima, segundo a previsão do artº 215º do Código do Processo Penal.

  9. À semelhança dos restantes prazos máximos fixados na lei processual penal para a manutenção de medidas de coacção, o prazo máximo de submissão à prisão preventiva visa precaver eventuais violações, e injustiças proporcionais pela manutenção da medida de coacção mais gravosa a arguidos que beneficiam, de resto, até trânsito em julgado de decisão válida do princípio constitucional in dubio pro reo.

  10. O artº 28, nº 4 da Constituição da República Portuguesa confere aos prazos máximos de prisão preventiva a dignidade de imperativo Constitucional, e é indubitável que a situação do arguido é coincidente com o preceito supra referido, na medida em que o mesmo encontra-se preso preventivamente de forma ininterrupta sem que tenha transitado em julgado o douto acórdão condenatório.

  11. Isto posto, tendo sido excedido o período máximo previsto no artº 215º, nº 2, do Código do Processo Penal, com expiração em 22 de Fevereiro de 2015, encontramos fundamentos quer de Direito quer de Facto para que a presente providência seja procedente.

  12. Pelo que, atentos os considerandos supra, consideramos que o arguido se encontra numa situação de precariedade processual, e que por ser actual, legitima o seu pedido de Habeas Corpus por prisão ilegal.

  13. Nestes termos, requer que seja ordenada a sua imediata restituição à liberdade.

    1. Da pertinência da petição de habeas corpus 14. A petição de habeas corpus é uma providência excepcional que visa garantir a liberdade individual contra os abusos de poder consubstanciados em situações de detenção ou prisão ilegal, com suporte no artº 31º da Constituição da República Portuguesa e tem os seus fundamentos taxativamente previstos no nº 2 do artº 222º do Código do Processo Penal, confrontando-se com situações de violação ostensiva da liberdade das pessoas, quer por incompetência da entidade que ordenou a prisão (al. a)), quer por a lei não a permitir com o fundamento invocado ou não tendo sido invocado fundamento algum (al. b)) quer ainda por estarem excedidos os prazos legais da sua duração (aI.c)), havendo, por isso, urgência na reposição da legalidade.

  14. No caso vertente, conhece aplicabilidade o fundamento da alínea c), uma vez que o arguido encontra-se, neste preciso momento, numa situação em que prazo de prisão preventiva expirou em 22 de Fevereiro de 2015, encontrando-se ultrapassado esse prazo sem que a decisão condenatória de 1ª instância tenha transitado em Julgado.

  15. O artº 31º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa integrante do título II (Direitos, liberdades e garantias) e capítulo I (Direitos, liberdades e garantias pessoais), determina que haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude da prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.

  16. “Sendo o único caso de garantia específica e extraordinária constitucionalmente prevista para a defesa de direitos fundamentais, o habeas corpus testemunha a especial importância constitucional do direito à liberdade” (JJ. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP, Constituição da República Portuguesa Anotada, Artigos 1º a 107º, 4ª edição revista, volume I, Coimbra Editora, 2007, II, p. 508).

  17. Atenta a natureza da providência, para que o exame da situação de detenção ou prisão reclame petição de habeas corpus, há que se deparar com abuso de poder, consubstanciador de atentado ilegítimo à liberdade individual - grave, grosseiro e rapidamente verificável - integrando uma das hipóteses previstas no artigo 222º nº 2, do Código de Processo Penal (cfr. Ac. do Tribunal Constitucional de 24 de Setembro de 2003 in proc. nº 571/03).

  18. “Este abuso de poder exterioriza-se nomeadamente na existência de medidas restritivas ilegais de prisão e detenção decididas em condições especialmente arbitrárias ou gravosas”. (JJ .Canotilho e V. Moreira, ibidem).

  19. Como referem JJ. Comes Canotilho e Vital Moreira, (ibidem, P 508) “O habeas corpus vale em primeira linha contra o abuso do poder por parte das autoridades policiais, designadamente das autoridades de polícia judiciária; mas não é impossível conceber a sua utilização como remédio contra o...

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