Acórdão nº 651/13.3GDLLE.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Instância Central Criminal – Secção 1 – Juiz 3, e no âmbito do processo comum colectivo nº 651/13.3GDLLE, o arguido AA foi julgado e condenado, por acórdão de 04.11.2014, como autor material de um crime tentado de homicídio voluntário, previsto e punido pelos artigos 131º e 132º, números 1 e 2, alínea e), parte final, 22º, 23º e 73º, todos do Código Penal, no que, ora, releva para o caso, na pena de 11 (onze) anos de prisão.

  1. Inconformado com esta decisão, o arguido AA interpôs recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça, extraindo da motivação que apresentou as seguintes conclusões: “A douta decisão recorrida, ao condenar o arguido na pena de prisão em que o condenou, fez aplicação incorrecta do Direito, violando os princípios da proporcionalidade e adequação da pena ao tipo de ilícito cometido.

    Face ao ilícito cometido pelo arguido e ora recorrente é suficiente, adequada e proporcional a condenação do recorrente numa pena de prisão de prisão não superior a seis anos de prisão.

    Ao aplicar ao arguido uma pena de 11 anos de prisão, o Tribunal a quo fez errada aplicação do Direito, nomeadamente dos artigos 70º e 71º do Código Penal.

    É suficiente, adequada e proporcional, de forma a assegurar os fins das penas, a aplicação ao arguido de uma pena de prisão inferior à efectivamente aplicada e nunca superior a seis anos.

    Nestes termos, e nos melhores de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, revogada a douta decisão recorrida na parte em que condena o arguido na pena de 11 anos de prisão, e portanto ser aquela decisão revogada e substituída por outra que: Condene o arguido, pelo crime de homicídio qualificado na forma tentada numa pena de prisão inferior, sendo suficiente, justa, adequada e proporcional a condenação do arguido numa pena de prisão inferior àquela em que foi condenado e nunca superior a seis anos.

    E assim dê ao arguido uma maior probabilidade de se reintegrar na sociedade com sucesso e vir a ter uma vida decente e honrosa.

    Pelo exposto e pelo mais e melhor de Direito que V. Exas. não deixarão de suprir, deve dar-se provimento ao recurso aplicando ao arguido a pena acima proposta, nos termos referenciados na presente motivação”.

  2. O recurso foi admitido por despacho de folhas 925.

  3. Notificado o assistente BB e o Ministério Público do motivado e assim concluído pelo recorrente, respondeu apenas o Ministério Público (confira-‑se folhas 928 a 937), que concluiu assim: “1. Não se conformando com o douto Acórdão, proferido a 04.11.2014, no qual foi o arguido AA condenado, na pena de 11 anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. nos termos do art. 131° e 132°, n.ºs 1 e 2, al, e), conjugados com os arts. 22°; 23°, do Código Penal, veio o mesmo interpor o competente recurso para o Tribunal da Relação de Évora.

  4. Refere o recorrente, muito sucintamente, que o Tribunal a quo" errou na determinação da medida da pena aplicada ao arguido, a qual entende excessiva para os factos em apreço e para a situação pessoal do mesmo.

  5. Invoca o recorrente; para o efeito, que: «o arguido não tem antecedentes criminais; estudou até ao 12° ano. Acresce que sempre desempenhou actividade no ramo da hotelaria como empregado de mesa/barman de forma contínua em várias entidades patronais, desempenhava as suas funções com responsabilidade e assiduidade.

  6. Aditou ainda que: «o arguido confessou os factos bem como o pedido de indemnização civil e mostrou arrependimento tendo justificado os factos com a circunstância de se encontrar sob o efeito do álcool e estar a atravessar uma fase de depressão».

  7. Ora, desde já consignamos que, em nosso modesto entender, não assiste razão ao recorrente, nem os argumentos, por si aduzidos, podem fundamentar a redução da pena aplicada ao arguido.

  8. Da análise dos factos, constata-se que os mesmos são de extrema gravidade, atenta não só a motivação que esteve alicerçada à sua prática (totalmente desproporcionada, sem qualquer razão ou fundamento), como pela energia criminosa empregue (com utilização de extrema força física); pela forma de cometimento dos factos, reveladores de uma total insensibilidade e desprezo (uma vez que o arguido não se limitou a socar e a pontapear a vítima, como lhe chegou a pisar a cabeça); pela persistência com que actuou (tendo-se ausentado e regressado com uma pedra de grandes dimensões, a qual utilizou para esmagar a cabeça da vítima) e pela postura da vítima (a qual não ofereceu qualquer resistência física).

  9. Importa ainda ter em consideração as consequências nefastas que resultaram para o ofendido, da conduta levada a cabo pelo arguido, as quais se encontram exaustivamente descritas e fundamentadas no acórdão e devidamente documentadas nos autos. Na verdade, o ofendido, pese embora não tenha morrido (o que só aconteceu pela rápida intervenção de terceiros), as suas limitações são de tal ordem e repercussão, que não se pode afirmar que tenha o mesmo, após os factos, recuperado todas as faculdades que lhe permitam fazer uma vida normal, ou seja, minimamente autónoma.

  10. Acresce que, e ao contrário do que o arguido quis fazer crer, o mesmo não demonstrou, a nosso ver, arrependimento, pois inicialmente não quis prestar declarações, afirmando que pretendia: «ouvir as mentiras e as verdades que o ofendido tinha para dizer».

  11. Quis pois o arguido apreciar a prova que entretanto fosse produzida e verificar se a mesma seria suficiente para o condenar. Deste modo, e pese embora seja um direito que lhe assiste - o de prestar declarações em qualquer altura - o facto é que a sua atitude de confessar depois de verificar que os factos que lhe eram imputados se encontravam demonstrados, faz ressaltar que o arguido apenas quis beneficiar de uma eventual atenuação da pena, com a sua confissão e demonstração de arrependimento, o qual, atenta a postura já salientada, suscita sérias dúvidas quanto à sua autenticidade. 10. Por outro lado, verifica-se que o arguido, na data a que se reportam os factos, encontrava-se socialmente isolado, sendo-lhe conhecidos hábitos de consumo excessivo de álcool. Acresce que o arguido já se encontrava referenciado, junto das autoridades policiais, pela prática de actos desajustados.

  12. Por outro lado, a circunstância de não ter antecedentes criminais, não significa que não tenha o arguido cometido outros ilícitos. No caso em apreço, constata-se que o mesmo já havia sido denunciado e acusado, pela prática de um crime de furto qualificado tentado, não tendo o arguido sido responsabilizado criminalmente, em virtude do ofendido ter desistido da queixa e de ter operado a desqualificação jurídica do ilícito em causa, conforme se pode aferir do douto acórdão e das certidões juntas ao mesmo.

  13. Analisando-se o douto acórdão recorrido, constata-se pois que se trata de uma decisão bem alicerçada nos factos dados como provados e na fundamentação...

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