Acórdão nº 738/12.0TBCVL.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA instaurou uma acção contra a Caixa BB, Instituição de Crédito, pedindo – que fossem “declarados nulos os contratos a que se refere a presente acção e as suas renovações, nomeadamente: 1 – Contrato de cláusulas gerais denominado «Crédito à tesouraria das empresas – Crédito integrado flexível» datado de 24 de Março de 2006.

2 – Um «termo de penhor autónomo de depósito» datado de 24 de Julho de 2008.

3 – Contrato datado de 30 de Junho de 2010 – relativo a alterações contratuais”; – que fosse declarado “nulo o aval numa livrança em branco com o nº 37/100023.0”; – “consequentemente”, que a ré fosse condenada “a devolver à autora a quantia de 60.215,56 € (…), acrescido de juros desde a data da citação até efectivo e integral devolução do mesmo”.

Segundo alegou, os contratos referidos em 1, 2 e 3 “são integralmente constituídos” por “cláusulas contratuais gerais” e em nenhum deles “houve (…) um comportamento activo da R. (…) que possibilitasse à ora Autora o conhecimento adequado, completo, efectivo” das cláusulas, tendo-lhe sido negados os mais elementares direito de informação e comunicação”. O mesmo vale em particular para a cláusula relativa ao aval. A autora não conhecia o significado do que assinou, nem para tanto tinha condições.

Assim, “todas as cláusulas dos documentos (…) em que houve intervenção ou obrigam a Autora devem ser excluídos dos respectivos contratos, sobrevivendo apenas aquelas que somente obrigam os restantes intervenientes nos referidos contratos por violação do disposto nos arts. 5º e 6º e de acordo com o disposto no art. 8º todos do Decreto-Lei nº 446/85 de 25 de Outubro”.

A ré contestou, sustentando que, contrariamente ao alegado, a autora conhecia perfeitamente o significado dos actos que praticou; e que cumpriu os deveres de informação e de comunicação a todos os intervenientes nos contratos em causa.

A acção foi julgada procedente, pela sentença de fls. 98, nestes termos: “Pelo exposto, julgo a acção totalmente procedente, por totalmente provada e, ao abrigo das supra referidas normas, decido: 1. declarar nulos os contratos e as suas renovações celebrados entre a autora AA e a ré Caixa BB, S.A.

, nomeadamente:

  1. Escrito denominado Crédito à tesouraria das empresas – Crédito Integrado Fléxivel, datado de 24 de Março de 2006; b) Verso da livrança em branco com o n.º …; c) Escrito denominado “TERMO DE PENHOR AUTÓNOMO DE DEPÓSITO”, datado de 24 de Julho de 2008.

    d) Escrito denominado "carta/contrato", datada de 30 de Junho de 2010.

    1. Declarado nulo o aval numa livrança em branco com o nº …; e, consequentemente, condenar a ré Caixa BB, S.A.

    a devolver à autora AA a quantia de 60.215,56€ acrescida de juros desde a data da citação até efectivo e integral devolução da mesma.” Em síntese, a sentença considerou: que o contrato designado por “Crédito à tesouraria das empresas – Crédito integrado flexível”, datado de 24 de Março de 2006, era constituído por cláusulas relativamente às quais não houve (nem sequer havia margem para tanto) negociação, sendo abrangido pelo Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro; que, ainda que não fosse, “sempre o regime aplicável seria o emergente do artº 227º do Código Civil”; que a ré não cumpriu o “dever de informação e esclarecimento cabal e eficaz do conteúdo das cláusulas constantes” desse contrato; que, por isso, o contrato é nulo (artigo 12º respectivo); que este “raciocínio é igualmente válido mutatis mutandis para os restantes contratos celebrados uma vez que todos os três são consequentes e subsequentes do primeiro dos contratos celebrados, inclusive a letra na qual foi aposta, por terceiro que não a autora, bom para aval, “violando desta forma as próprias regras atinentes à Lei Uniforme das Letras e Livranças (…) sem, deixar de referir que chega a tocar a burla a conduta da ré que, em conluio com os sobrinhos da autora, obtiveram na prática, de uma forma absolutamente ilícita, as assinaturas por esta apostas, servindo-se do facto de a autora ter pouca instrução e depositar toda a confiança na ré".

    Mas a sentença foi revogada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de fls. 155, que considerou ter ficado provado que a ré cumpriu os deveres de informação e comunicação que lhe incumbiam.

    Para assim concluir, o acórdão recorrido começou por observar que a sentença “não identifica, nem concretiza, as cláusulas do contrato que não terão sido alvo de negociação e que estão por isso sujeitas ao regime estabelecido” no Decreto-Lei nº 446/85, sendo portanto nulas se não tiverem sido “devidamente comunicadas e informadas. O regime em questão aplica-se apenas relativamente às cláusulas pré-estabelecidas (…) e não ao contrato no seu todo”. Ora o contrato de crédito à tesouraria concretamente em causa é “individualizado”, pelos menos em certos pontos, como sejam “o valor do crédito, prazo do contrato e forma de pagamento”; além disso, a prova revela que a iniciativa da sua celebração partiu da autora e dos seus sobrinhos CC e mulher, e que a ré, “depois de aceitar dar resposta à solicitação de empréstimo que lhe foi apresentada pelo sobrinho da A. e por esta, houve o cuidado de informar a A. relativamente aos contratos que a mesma estava a assinar, dando-lhe conta das garantias que a mesma estava a assumir, sendo além do mais tais informações e explicações, quanto aos termos e condições do contrato, prestadas em reunião com a A. e o seu sobrinho, aí se esclarecendo a necessidade de serem constituídas garantias adicionais pela A. mediante a prestação de aval e constituição de penhor autónomo do depósito, tendo sido explicado, em especial à A., em que consistiam tais garantias e o que implicava o penhor do depósito e que o mesmo responderia pelo incumprimento, caso tal se viesse a verificar. Nessa reunião a A. prontificou-se a intervir nesse financiamento, por forma a que o mesmo pudesse vir a ser aprovado.

    Com esta conduta da R. não pode deixar de concluir-se que a mesma prestou à A. todo o dever de informação a que estava obrigada, relativamente aos contratos em questão e concretamente no que se refere não só à comunicação, mas também à informação e esclarecimento das garantias que a A. estava a assumir, em cumprimento do que impõem o artº 5º nº 1 e nº 2 e 6º nº 1 do Decreto-Lei 446/85 de 25 de Outubro. Realça-se até que as informações relativas ao contrato e suas garantias foram prestadas não só à A., mas a todos os intervenientes no contrato, e mais, em reunião com esta e o seu sobrinho, pessoa da confiança da A.

    Refira-se também que, dos factos provados não resulta que a A. tenha pedido quaisquer esclarecimentos adicionais, ou que os mesmos lhe tenham sido recusados, nem decorre ainda, contrariamente ao que refere a sentença recorrida, que a A. não tenha compreendido o conteúdo daquilo que assinou. Pelo contrário, os factos provados dão-nos conta de que houve não só uma comunicação das condições dos contratos à A., mas ainda que lhe foi dada uma explicação das mesmas, porventura por a R. saber que a A. tinha pouca instrução, ainda que viesse acompanhada de sobrinho da sua confiança. Em face dos factos apurados, não pode deixar de concluir-se que a R. fez prova de que deu cumprimento ao dever de comunicação previsto no artº 5º nº 1 e nº 2 do diploma mencionado.” 2. A autora...

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