Acórdão nº 1523/13.7T2AVR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2017

Data27 Abril 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, na qualidade de cabeça de casal da herança indivisa de BB, propôs uma acção contra CC - Companhia de Seguros, SA, pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização de € 106.875,00, acrescida de juros vencidos e vincendos desde 12 de Agosto de 2010, até integral pagamento.

Para o efeito, e em síntese, alegou que, em 12 de Agosto de 2010, BB morreu em consequência de “uma infecção respiratória grave” determinada por inalação de fumos num “incêndio de grandes dimensões” em cujo combate participara, “em pleno exercício das suas funções de bombeiro”, e que provocara a sua hospitalização.

Alegou ainda que a morte de BB se encontrava coberta por um seguro de vida contratado com a ré, no montante de € 106.875,00.

A ré defendeu-se invocando ilegitimidade de AA por estar desacompanhada dos demais herdeiros e negando que a morte estivesse abrangida pelo seguro, uma vez que “o agravamento das dificuldades respiratórias, que conduziu à (…) lamentável morte” de BB “deveu-se a peritonite bacteriana espontânea e ao seu estado clínico debilitado por antecedentes de cirrose hepática e insuficiência hepática, que conduziram a uma situação de septicemia”, não ocorrendo “nexo causal entre a morte e a factualidade alegada pela autora”.

Disse ainda a ré não ter podido conhecer “de qualquer situação clínica pré-existente” porque ficou provado numa outra acção que BB declarara, “ embora com respeito a outro contrato de seguro, (…) não estar nem nunca ter sido sujeito a tratamento médico regular por doença ou acidente”.

Na sequência do despacho de fls. 79, a autora provocou a intervenção principal dos demais herdeiros, DD, EE e FF, bem como as dos cônjuges GG e HH, que foi admitida pelo despacho de fls. 97.

Pela sentença de fls. 217, a acção foi julgada improcedente, por se entender não ter ficado provado “que o evento morte (…) ocorreu por causa das funções de bombeiro e por via disso não é susceptível de se encontrar abrangido pelo seguro de responsabilidade civil, celebrado com a ré”.

Para assim decidir, a sentença começou por afastar a exclusão invocada pela ré – “ao que parece, a ré limitou-se a aceitar o seguro, com a listagem” das pessoas seguras “enviada, sem aquilatar ou exigir uma declaração individual de cada uma das pessoas seguras. Apenas se o tivesse feito, e daí decorressem declarações inexactas ou desconformes coma realidade, era-lhe lícito invocar a exclusão” –, verificando seguidamente não estar provado que a morte tenha resultado do incêndio.

Esta sentença foi confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto de fls. 368, aprovado com um voto de vencido, também por não se considerar estabelecido o necessário nexo de causalidade entre o combate ao incêndio e a infecção respiratória de que resultou a morte, nestes termos: “Os Apelantes continuam a sustentar que a inalação de fumo durante mais de 27 horas, foi conditio sine qua non da infecção respiratória grave que consta do certificado de óbito como causa da morte, num registo meramente empírico e baseado na circunstância de o falecido ter estado a combater um incêndio antes do internamento.

Contudo, como se decidiu no recurso da matéria de facto, com base nos depoimentos dos médicos e nos registos clínicos, a infecção respiratória causa da morte ao marido da A. foi nosocomial, ou seja, teve origem no internamento hospitalar e não no incêndio.

Assim, não se provaram factos donde se possa concluir que a causa da morte do marido da A. e pai dos intervenientes se tivesse devido a qualquer evento súbito e inesperado, exterior ao próprio, que pudesse, de algum modo, ser imputável a ter estado a combater o incêndio.

Não há, pois, fundamento para se considerar que ter estado a combater o incêndio foi concausal da infecção respiratória grave que foi causa directa da sua morte.

Em suma, não tendo os AA. logrado provar, como lhe competia nos termos do art. 342º n.º 1 do CC, o nexo causalidade entre a inalação dos fumos no incêndio nos dias 23 e 24 de Junho de 2010 e a infecção respiratória grave que lhe causou a morte em 12 de agosto de 2010, a apelação terá de improceder.” 2. Os autores recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça.

Nas alegações que apresentaram, formularam as seguintes conclusões: “(…) IV. Resultaram provados os factos elencados na sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, a qual foi sujeita a recurso para o Tribunal da Relação, vindo este Tribunal a confirmar a decisão da 1ª Instância, pese embora com um voto vencido, que com o devido respeito por opinião em contrário, deveria o mesmo ter sido corroborado pelos restantes desembargadores, vindo a confirmar-se a apelação apresentada pelos autores.

  1. Entendem os aqui recorrentes que deveria, também, ter sido dado como provado, pelo Tribunal de 1ª Instância, o artigo 15° da p.i., nos seguintes termos: "o falecimento de BB ficou a dever-se, única e exclusivamente, ou também, à grande inalação de fumo aquando da sua presença no incêndio durante 27 horas seguidas, que lhe determinou uma infecção respiratória grave, que o levou à morte".

  2. Tal facto deveria ter sido dado como provado, com base quer na prova documental quer na prova testemunhal, quer documental existente nos autos.

    Sendo certo que a certidão de óbito indica como causa directa da morte "infecção respiratória grave ", embora a médica Dra. II, que certificou o óbito, tenha consignado que essa infecção foi "nosocomial", apanhada no hospital e não causada pelo incêndio, tendo esta posição sido corroborada pelos médicos que assistiram o doente na urgência e no internamento.

    Ora, é aqui que reside a questão, a de saber qual a origem da infecção respiratória grave em si também determinante para o falecimento do bombeiro BB.

    (…) VIII.

    In casu pretende-se saber se à luz da matéria de facto dada como provada é possível estabelecer uma relação de imputação de resultado – morte do bombeiro – à inalação do fumo no incêndio onde se encontrava a trabalhar. Resulta da matéria provada que da declaração de óbito que a mesma se ficou a dever a infecção respiratória e outros estados mórbidos, factores ou estados fisiológicos que contribuíram para o falecimento da vítima. Ponderando globalmente o processo causal de que derivou a morte do bombeiro, constata-se que se inserem neste processo como condições essenciais do mesmo, ou seja, condições sem as quais o resultado não teria ocorrido, a inalação de fumos.

    (…) XI. (…) Não se provaram quaisquer circunstâncias anormais que...

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