Acórdão nº 1919/15.0T8OAZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução07 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc.1919/15.0T80AZ.P1.S1 R-630[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, intentou, em 29.4.2015, na Comarca de … – …- Unidade Central, acção de nulidade e anulação de deliberações sociais com processo comum, contra a Ré: “BB, S.A.”.

Pedindo que se declare a nulidade das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral da ré realizada no dia 30.3.2015, sob os pontos 4 e 6 da ordem do dia, formulando pedido subsidiário de anulação das mesmas deliberações sociais. Para tal alegou, em síntese, que a sociedade ré sempre foi gerida pelos seus três sócios fundadores, onde se inclui o autor que, em Julho de 2014, não aceitou avalizar uma garantia bancária pelo que, ao regressar de férias, em Setembro de 2014, constatou que lhe tinham sido retiradas todas as responsabilidades. Para o dia 30.3.2015, foi convocada uma assembleia geral da ré que veio a deliberar a eleição dos membros dos órgãos sociais para o quadriénio 2015 a 2018 e a remuneração a auferir pelos membros do Conselho de Administração. As deliberações em causa não têm a suportá-las qualquer proposta do Conselho de Administração para além do que, ao ser nomeado para o conselho de administração um funcionário da ré, pretendeu esta afastar o autor da vida da ré. E ao assim deliberar, ficaram os demais accionistas livres para gerirem a ré sem a opinião e intervenção do autor, obtendo vantagens directas, especiais e pessoais, sendo certo que a remuneração aprovada em Assembleia Geral representa um custo que a ré não pode suportar. Terminou, alegando que as deliberações em causa violam o princípio da igualdade entre os sócios e são ofensivas dos bons costumes, satisfazendo os propósitos dos accionistas CC e DD e provocando à ré danos financeiros e morais. Citada a requerida, esta deduziu oposição invocando que, quanto à escolha dos membros dos órgãos sociais da ré, o próprio autor avançou com duas listas mas nenhuma delas venceu, sendo certo que nunca a Administração da ré apresentou qualquer proposta para tal eleição. O autor não obteve o voto de confiança para integrar os órgãos sociais porque assumiu posturas que prejudicaram a ré, designadamente ao recusar dar o seu aval à garantia bancária que veio a ser ainda assim emitida pela BANCO EE, mas em termos mais onerosos para a ré e recusando-se a prestar qualquer outra garantia a seu favor. E quanto às remunerações aprovadas, alegou a ré que, para além de ter uma saúde financeira que as suporta, tais remunerações são perfeitamente ajustadas às funções exercidas. Terminou pedindo pela improcedência da acção e a absolvição da ré do pedido que contra ela vem formulado. Realizou-se audiência prévia, em sede da qual foi proferido o despacho que fixou o objecto do litígio e indicou os temas da prova. Instruída a causa, realizou-se audiência de julgamento com observância dos legais formalismos. *** Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a ré do pedido contra ela formulada.

*** Inconformado, o Autor recorreu para o Tribunal da Relação do …, que, por Acórdão de 16.5.2017 – fls. 671 a 721 –, julgou parcialmente procedente o recurso de apelação e, em consequência, anulou a deliberação tomada na Assembleia Geral da ré “BB, S.A.” sob o ponto 6 da ordem do dia referente à remuneração a auferir pelos membros do Conselho de Administração.

No mais manteve o decidido.

*** Inconformada, a Ré recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões: I. Por acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do … no dia 16 de Maio de 2017, foi julgado parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo autor AA e, em consequência, anulada a deliberação tomada na Assembleia Geral da Ré, ora Recorrente, sob o Ponto 6 da Ordem do Dia referente à remuneração a auferir pelos membros do Conselho de Administração.

Entendeu o douto Tribunal a quo sustentar a anulação de tal deliberação social em dois vectores argumentativos, embora convergentes: “ (...) ao deliberar-se um acréscimo tão significativo da remuneração dos accionistas maioritários, membros do Conselho de Administração, superior ao dobro da anteriormente praticada, tal prejudicou de forma manifesta a posição do sócio minoritário, que para além de ter deixado de fazer parte do órgão de gestão e de auferir a correspondente remuneração, vê ainda diminuído o valor das suas acções e dos inerentes lucros a distribuir, ficando igualmente dificultada umo eventual venda da sua participação social.

E se a deliberação aqui em causa é susceptível de causar dano ao sócio minoritário, designadamente porque vê diminuídos os lucros a distribuir, esta contraria também o “interesse social”, entendido este como a relação entre a necessidade de todo o sócio enquanto tal na consecução do maior lucro e o meio julgado apto a satisfazê-lo (...) ”...

  1. Com este enquadramento jurídico não se pode a ora Recorrente conformar, pelo que interpôs o presente recurso de revista.

  2. São duas as grandes ordens de razão que levam a Recorrente a discordar da decisão revidenda e a confiar em que mesma deve ser revogada.

  3. A primeira prende-se com aquilo que se afigura ser uma curta sucessão de equívocos que conduziram a um erro de julgamento (error juris).

  4. Entende-se no douto acórdão recorrido, na esteira do aí citado e não menos douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15.03.2007 - Proc. 900712006.6 (disponível em www.dgsi.pt), que a deliberação tomada na Assembleia Geral da Ré, ora recorrente, realizada em 30.03.2015 relativamente ao Ponto 6 da ordem do dia - remuneração a auferir pelos membros do Conselho de Administração “se configura como abusiva sendo por isso anulável ao abrigo do art. 58º, n.º1, al b) do Código das Sociedades Comerciais" (Código das Sociedades Comerciais).

  5. Esta conclusão é alcançada a partir da consideração de dois factos assentes: (i) “a aprovação da nova remuneração de € 22 000,00€ mensais influencia negativamente o valor de cada acção que, por referência ao ano de 2015, passa de € 20,7939€ para € 18,3017 (cfr. n.º 42); e (ii) “anteriormente, nenhum dos accionistas com funções de gerência ou administração retirou da empresa valor superior a € 8.000,00€ mensais por 14 meses (cfr.47, aditado) ”.

  6. Ora, conforme se pode ler no douto aresto recorrido, com atinência ao segundo ponto antes mencionado: “Por último, pretende a autora/recorrente que seja aditada à factualidade provada o seguinte facto: - os accionistas, pelas funções de gerência ou administração, em 2014, acertaram retirar da empresa o valor mensal de € 8.000,00, limpos, por 14 meses, por antecipação de dividendos.

    Radica este no art. 30.º da petição inicial, onde se alegou que “...anteriormente, nenhum dos accionistas com funções de gerência ou administração retirou das empresas o valor mensal superior a € 8.000,00” Do relatório pericial consta que nos exercícios de 2011 a 2014 os accionistas, na sua qualidade de administradores, não auferiram qualquer remuneração, tendo beneficiado da distribuição de dividendos, na proporção das acções detidas - resposta ao quesito 1 d).

    No documento de fls. 218, manuscrito, datado de 16.1.2014, e com o título “Ordenado ou dividendos eis a questão?”, considerou-se como referencial a verba de 8.000,00€ limpos por 14 meses.

    Assim, com reporte ao art. 30.º da petição inicial, entendemos que deve ser aditado à factualidade provada o n.º47 com a seguinte redacção: “Anteriormente, nenhum dos accionistas com funções de gerência ou administração retirou da empresa valor superior a € 8.000 mensais por 14 meses”.

  7. Não podem subsistir dúvidas quanto a duas das questões suscitadas neste segmento do douto acórdão em revista: A prática que vinha sendo adoptada no período temporal compreendido entre 2011 e 2014 e que ocasionou a pergunta “Ordenado ou dividendos eis a questão?” era ilícita porquanto violava o disposto no artigo 297º do Código das Sociedades Comerciais (“ 1 - O contrato de sociedade pode autorizar que, no decurso de um exercício, sejam feitos aos accionistas adiantamentos sobre lucros, desde que observadas as seguintes regras: a) O conselho de administração ou o conselho de administração executivo, com o consentimento do conselho fiscal, da comissão de auditoria ou do conselho geral e de suspensão, resolva o adiantamento; b) A resolução do conselho de administração ou do conselho de administração executivo seja precedida de um balanço intercalar, elaborado com a antecedência máxima de 30 dias e certificado pelo revisor oficial de contas, que demonstre a existência nessa ocasião de importâncias disponíveis para os aludidos adiantamentos, que devem observar, no que seja aplicável, as regras dos artigos 32.º e 33.º, tendo em conta os resultados verificados durante a parte já decorrida do exercício em que o adiantamento é efectuado; c) Seja efectuado um só adiantamento no decurso de cada exercício e sempre na segunda metade deste; d) As importâncias a atribuir como adiantamento não excedam metade das que seriam distribuíveis, referidas na alínea b). 2 - Se o contrato de sociedade alterado para nele ser concedido a autorização prevista no número anterior, o primeiro adiantamento apenas pode ser efectuado no exercício seguinte àquele em que ocorrer a alteração contratual.”) X. A falta, aliás manifesta, de verificação dos requisitos previstos pela citada norma para a admissibilidade de distribuições antecipadas de dividendos tornaria ilícitos os adiantamentos, com as consequências para os accionistas previstas no artigo 34º (“restituição de bens indevidamente recebidos”) e para os administradores as responsabilidades elencadas nos artigos 72.º e ss. e 574.º, todos do Código das Sociedades Comerciais.

  8. Por outro lado, não é menos claro que se mostra viciado o raciocínio jurídico formulado no douto acórdão aqui em crise (mais adiante, na página 49), quando considera, à semelhança do que se refere no convocado acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que “na Assembleia Geral da ré...

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