Acórdão nº 303/13.4GASPS-A.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução05 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

AA, preso no Estabelecimento Prisional Regional de ... vem, formular pedido de Habeas Corpus «em virtude de prisão ilegal, face à detenção para cumprimento de pena de prisão de que foi alvo, expondo e requerendo, ao abrigo do disposto no artigo 31º da CRP, e artigos 222º e 223º do CPP», o seguinte: «1. O presente pedido vem com fundamento no facto do arguido ter sido preso, quando na verdade a lei não permite, no caso sub judice, tal prisão - Cfr. art.º, 222º nº, 2 al. b) do CPP; 2. Por decisão transitada em julgado, o arguido foi condenado na pena única e global de dois anos e dez meses de prisão cuja execução foi suspensa por igual período.

3. Contudo, a referida suspensão tinha como condição a imposição de pagamento ao Município de ... no prazo de 5 meses após o trânsito da quantia de €700,00 (setecentos euros).

4. Por douto despacho de 16/02/2017, foi revogada a suspensão da referida pena, por alegadamente o arguido não ter cumprido o pagamento dos € 700,00 - condição de suspensão da pena de prisão.

5. Sucede que, a quantia de setecentos euros que estava na base da suspensão da referida pena de prisão, encontrava-se na verdade, paga.

6. O seu pagamento, remonta a 02-09-2016 (€ 250,00) e a 28-11-2016 (€ 450,00), tudo conforme Doc.1 e Doc.2 que ora se juntam e se deixam por reproduzidos para os devidos e legais efeitos. Assim, 7. Salvo o devido respeito, deve-se dizer que a aplicação da pena efectiva de prisão, resultante da revogação da suspensão concedida, mostra-se como inadmissível. Senão vejamos, 8. O habeas corpus é uma providência excepcional que visa garantir a liberdade individual contra os abusos de poder consubstanciados em situações de detenção ou prisão ilegal, com suporte no artigo 31º da CRP, que o institui como autêntica garantia constitucional de tutelada liberdade.

9.

Prima facie, da decisão/acórdão notificada ao arguido não se encontra exarada a obrigação de fazer qualquer comprovação desse pagamento, junto do Tribunal 10. Por outro lado, quanto ao despacho que revogou a suspensão da execução da pena, o mesmo nunca foi, e devia ter sido notificado, pessoalmente, ao aqui arguido. Logo, 11. O arguido nunca pôde pronunciar-se sobre o mesmo, ficando coarctado de exercer o seu legal e admissível contraditório, e desde logo, impossibilitado de recorrer daquela decisão.

12. O despacho de revogação deverá ser notificado pessoalmente ao arguido para que dele possa querendo recorrer ou, então, com ele se conformar". “Por isso, entende-se que o despacho que revoga a suspensão da execução da pena é também, nesse sentido, um despacho que põe fim ao processo e é equiparado à sentença para o efeito do disposto no nº 2 do artigo 449° do CPP." (Acórdão nº 73/04.7PTBRG-D.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 07 de Maio de 2009-STJ-id576290744-vlex).

13. Aliás, sabendo o Tribunal que o arguido se encontrava no estrangeiro conforme decorre, quer da própria informação existente no processo no relatório de fls… elaborado pela DGRS, quer do teor da acta de fls. do dia 09-01-2017 (através do contacto telefónico a informar que estava em França), deveria ter-se indagado e questionado sobre a morada deste, para que o mesmo fosse notificado da decisão.

14. Assim sendo, não pode deixar de se reconhecer fundamento à presente providência de habeas corpus.

15. Sendo ainda de realçar que, actualmente, o arguido se afastou definitivamente da delinquência, estando perfeitamente inserido, social e familiarmente, tendo até obtido trabalho que, entretanto, a manter-se a prisão, se encontra em vias de perder.

16. Pelo que a condenação que agora se pretende ser-lhe aplicável sempre lhe traria consequências negativas indesejáveis, nomeadamente, decorrentes da convivência com outros reclusos.

17. Encontrando-se pago valor de setecentos curos ao Município de ..., deverá declarar-se a pena extinta, por cumprida, e consequentemente, restituir-se o arguido à liberdade, com a maior brevidade e urgência possível.

18. Porquanto, atentas as razões já esgrimidas, estamos perante uma situação de prisão ilegal.

Nestes termos e nos mais de direito que v. Exa mui doutamente suprirá, deverá a presente Petição HABEAS CORPUS ser julgada procedente, por provada, declarando-se ilegal a prisão ordenada, e em consequência determinar-se a imediata restituição do Arguido à liberdade, uma vez que este, se encontra recluso, apesar de ter cumprido o pagamento da quantia de €700,00 que estava obrigado para a suspensão da execução da pena, além de que o despacho de revogação não lhe foi notificado pessoalmente.

TERMOS EM QUE SE REQUER A V.ª Ex.ª SE DIGNE A ORDENAR, COM CARACTER DE URGÊNCIA, A RESTITUIÇÃO DO ARGUIDO À LIBERDADE.» 2.

Foi exarada, nos termos do artigo 223.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, doravante CPP, a seguinte informação: «Encontra-se o arguido AA detido, desde 19.4.17, em cumprimento de pena de prisão de 2 anos e 10 meses, pela prática de um crime de furto qualificado.

Não obstante a opção, efectuada em sede de sentença condenatória, pela substituição por pena de suspensão da execução da prisão, esta foi objecto de revogação através de despacho proferido em 16.2.17, notificado seja ao seu Ilustre defensor (à data), seja ao arguido por via postal para a morada do respectivo TIR, sem que reacção ou impugnação alguma tenha sido deduzida até ao momento do cumprimento dos mandados de condução ao EP.

Para esclarecimento e corroboração do conteúdo supra, remete-se cópia de fls. 163, 313 a 321, 436 a 438, 441, 442, 444, 461, 485 e verso.» 3.

Convocada a secção criminal e notificados o Ministério Público e o Defensor do requerente, teve lugar a audiência, nos termos dos artigos 223.º, n.

os 2 e 3, e 435.º do CPP, cumprindo tornar pública a respectiva deliberação.

II - FUNDAMENTAÇÃO A. Os factos Constam dos autos os seguintes elementos fácticos que interessam para a decisão da providência requerida: 1 - Por sentença proferida em 03-03-2016, transitada em julgado em 02-04-2016, o peticionante AA foi condenado na pena de 2 anos e 10 meses de prisão pela prática, em co-autoria material, de um crime de furto qualificado.

2 - Essa pena foi suspensa na sua execução pelo mesmo período sob a condição de ser paga, no prazo de 5 meses após o trânsito em julgado, da quantia de 700,00 euros ao Município de ....

3 - Por decisão de 16-02-2017, foi determinada a revogação da suspensão da execução da pena de prisão e, consequentemente, ordenado o cumprimento da mesma.

4 - Consta dessa decisão que:

  1. Por despacho proferido a 23-11-2016 foi determinada a notificação dos arguidos para comprovarem o cumprimento daquela...

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