Acórdão nº 4858/12.2TBMAI.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução12 de Outubro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA, Lda., com sede em B…, instaurou, em 1 de agosto de 2012, no então 2.º Juízo Cível da Comarca da M… (Instância Local da Maia, Juízo Cível, Comarca do Porto), contra Transportes BB, Lda, e Companhia de Seguros CC, S.A., ação declarativa, sob a forma de processo sumário, pedindo que as Rés fossem condenadas a pagar-lhe a quantia de € 24 865,59, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, e ainda a pagar-lhe as despesas decorrentes do transporte efetuado entre Frankfurt e a Holanda.

Para tanto, alegou, em síntese, que, no exercício da sua atividade comercial de produção e venda de carne, em março de 2012, contratou com a primeira R. o transporte de carne de bovino, para entrega em Frankfurt; para além de um dia de atraso, parte da carne chegou em más condições, tendo sido rejeitada e, depois, enviada para a Holanda; com isso, sofreu prejuízo, designadamente no valor de € 24 865,59; por efeito de um contrato de seguro, a mesma R. participou o sinistro à R. CC, mas, até hoje, nenhuma delas a indemnizou dos prejuízos sofridos.

Contestaram ambas as RR., tendo a primeira contestado por impugnação e concluído pela improcedência da ação. Em reconvenção, pediu que a Autora fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 3 984,00, acrescida dos juros de mora, desde a “citação” até integral pagamento, alegando, para o efeito, a falta de pagamento da retribuição do transporte da mercadoria (Alemanha e Holanda).

Replicou a A., concluindo pela improcedência da reconvenção.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido determinado que a ação seguisse os termos do processo ordinário e organizada a base instrutória, da qual reclamaram as partes, sem sucesso.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 25 de novembro de 2015, sentença, e, julgando-se a ação improcedente, absolveu as Rés do pedido, e a reconvenção procedente, condenou a Autora a pagar à R. Transportes BB, Lda, a quantia de € 3 984,00, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, vencidos desde 18 de outubro de 2012 até integral pagamento.

Inconformada, a A. apelou para o Tribunal da Relação de Porto, que, por acórdão de 30 de janeiro de 2017, condenou a R. Transportes BB, Lda, a pagar à A. a quantia de € 24 865,59, acrescida de juros, à taxa de 5 %, a partir da citação e até integral pagamento, e condenou a A. a pagar àquela Ré a quantia de € 3 000,00.

Inconformada, a Ré Transportes BB, Lda, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:

  1. O acórdão violou os artigos 674.º, n.º 1, alínea b), e 5.º do CPC.

  2. Não podia o acórdão proceder à eliminação dos factos n.º s 34 e 48, por não terem sido alegados pelas partes, em violação do princípio do contraditório, e quanto aos factos n.º s 49 e 50, por serem conclusivos.

  3. Cabe ao lesado o ónus de alegar e provar o facto ilícito causador do dano.

  4. Não consta como provado qualquer facto ilícito praticado pela Recorrente.

  5. Recaía sobre a Recorrente a prova das circunstâncias excludentes da sua culpa presumida.

  6. Não existe nexo de causalidade entre a avaria da mercadoria e o transporte.

  7. Foram violadas as normas dos arts. 17.º e 1.º da CMR e 483.º, n.º 1, do CC.

  8. A CMR estabelece, no art. 23.º, um desvio limitativo em matéria de responsabilidade contratual.

  9. Não se encontram afastadas as regras específicas dos arts. 23.º e 25.º da CMR, não podendo ser imputados à Recorrente os prejuízos sofridos pela A.

  10. A A. não provou que a avaria da mercadoria transportada se deveu a ato voluntário do transportador ou do pessoal ao seu serviço.

  11. Na indemnização não entram os lucros cessantes, não incluindo o lucro com a venda da mercadoria.

  12. Assim, o acórdão violou os arts. 23.º e 25.º da CMR e 342.º, n.º 1, do CC.

    Com a revista, a Recorrente pretende a revogação do acórdão recorrido.

    Contra-alegou a A. , no sentido da confirmação do acórdão proferido.

    Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    Neste recurso, está essencialmente em discussão a responsabilidade civil do transportador internacional de mercadoria.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. No acórdão recorrido, foram dados como provados os seguintes factos: 1.

    A A. dedica-se ao comércio de produção e venda de carne.

    1. No dia 2 de março de 2012, DD encomendou à A. a aquisição de 300 pistolas de bovino para consumo humano.

    2. Nos termos dessa encomenda, a carne deveria ser entregue nas instalações da V…, em F…, na Alemanha.

    3. Foi convencionado que a mercadoria deveria sair das instalações da A. no dia 2 de março de 2012.

    4. A A. contratou a R. Transportes BB, Lda, para efetuar o transporte da mercadoria, desde o centro de abate, em B…, até F….

    5. No ato da carga, a mercadoria estava certificada como pertencendo a animais abatidos e aprovados para consumo humano.

    6. O transporte foi efetuado numa viatura da R., tendo sido acompanhado das guias de remessa, do mapa de rastreabilidade com a identificação dos animais e do CMR.

    7. Nessas circunstâncias, a A. instruiu a R. para o transporte ser efetuado com uma temperatura entre os 0.º e 2.º C.

    8. A mercadoria chegou ao destino no dia 6 de março de 2012.

    9. No decurso do transporte, no reboque frigorífico foram registadas temperaturas ambientes superiores a 2.º C.

    10. Parte da mercadoria chegou ao destino com sinais de envelhecimento, mostrando-se pegajosa e macerada e, em certas partes, descolorada e com um muco viscoso.

    11. Tendo a V… rejeitado a receção dessa mercadoria.

    12. Essa mercadoria ficou naquele estado no decurso do transporte.

    13. Aquando da encomenda, a A. e a DD convencionaram que esta lhe pagaria a quantia de € 67 872,16, pela carne encomendada, com o peso de 19 978,50 Kg.

    14. A mercadoria...

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