Acórdão nº 190/13.2T2STC.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução02 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: Caixa AA - Instituição Financeira de Crédito, S.A., intentou, em 14 de Fevereiro de 2013, a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra o Município de …, peticionando a condenação deste no pagamento da quantia de € 391.891,27, e, bem assim, de juros de mora à taxa dos juros comerciais sucessiva e legalmente em vigor, acrescida de dois pontos percentuais, desde a data de vencimento até integral pagamento, computando os vencidos em € 53.158,03.

Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, que no dia 3 de Fevereiro de 2011 celebrou com a Sociedade BB - Engenharia, S.A., um contrato de factoring que teve por objecto a aquisição, por cessão, de créditos comerciais a curto prazo derivados da respectiva venda de mercadorias ou prestação de serviços a terceiros considerados devedores, designadamente, os créditos que a esta sociedade eram devidos pelo Município de Santiago do ….

Notificado da cedência, o réu deixou de efectuar pagamentos, em Março de 2011, encontrando-se em dívida à autora facturas que totalizam o montante peticionado.

Contestou o réu, alegando, em suma, não lhe ter sido comunicado e desconhecer o conteúdo do contrato celebrado entre a sociedade BB – Engenharia, S.A., e a autora. Ainda assim, pagou inicialmente as facturas à autora, designadamente algumas cujo pagamento foi agora solicitado, mas após a declaração de insolvência da BB – Engenharia, S.A., passou a efectuar os pagamentos à respectiva administradora por solicitação desta. Mais alegou que resolveu os contratos de empreitada de obras públicas celebrados com a BB que estão na origem das facturas em causa devido ao incumprimento desta sociedade.

Concluiu pela improcedência da acção.

Na réplica a autora respondeu à matéria da excepção do cumprimento parcial.

Realizado julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu julgar: «a) parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido formulado pela A. CAIXA AA - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DE CRÉDITO, S.A., e, consequentemente, condena[r] o R. MUNICÍPIO DE … a pagar-lhe a quantia de € 388.528,67, acrescida de juros de mora (…), absolvendo o R. do demais peticionado».

Desta sentença apelou o réu, tendo o Tribunal da Relação de Évora proferido acórdão, em 3 de Dezembro de 2015, decidindo «revogar parcialmente a sentença recorrida e, consequentemente: a) Atento o invocado pelo Réu nos art.ºs 24º e 13º da sua Contestação e o disposto no art.º 4º, n.º1, e) e f) do ETAF declara-se o Tribunal “a quo” incompetente em razão da matéria para apreciar o presente litígio quanto à matéria das seguintes facturas: u) - Factura n.º HC-00… emitida em 05/05/2011 e vencida em 04/07/2011 no valor de €4.305,00.

k) - Factura n.º HG-C-00… emitida em 31/08/2011 e vencida em 31/10/2011 no valor de €3.834,76; n) - Factura n.º HC-C-00… emitida em 31/08/2011 e vencida em 31/10/2011 no valor de €5.196,79; q) - Factura n.º HC-C-00… emitida em 26/09/2011 e vencida em 26/11/2011 no valor de €1.904,72; b) Mantendo-se a sua competência para apreciar o presente litígio quanto à restante matéria.

c) Altera-se a decisão da matéria de facto nos termos acima expendidos; d) Condena-se o Município de … a pagar à Caixa AA - Instituição Financeira de Crédito, S.A., a soma global das facturas constantes do Ponto 9) dos factos assentes, que ascende ao valor global de € 373.287,40 (trezentos e setenta e três mil, duzentos e oitenta e sete Euros e quarenta cêntimos).

e) Condena-se o Município de … a pagar à Caixa AA - Instituição Financeira de Crédito, S.A., a quantia relativa a juros de mora, a calcular em função dos juros comerciais estabelecidos nos Avisos supra citados, contados desde a data de vencimento de cada uma das facturas elencadas no Ponto 9) e até integral pagamento».

Ainda inconformado interpôs o réu recurso de revista, aduzindo na respectiva alegação a seguinte síntese conclusiva: «A - O presente recurso vem interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora que julgou parcialmente improcedente o recurso da sentença proferida pela Comarca de Setúbal, no processo em referência, na parte em que julga o Tribunal Judicia! competente para dirimir parte do litígio e condena o Município no pagamento de facturas no valor de 373 287,40€ provenientes de contratos de empreitada, que a autarquia já pagou à massa insolvente do co-contratante do Município, BB, SA.

B - A decisão ora recorrida julgou, e bem, a Comarca de Setúbal incompetente em razão da matéria para apreciar o presente litígio quanto a quatro das facturas emitidas pela BB, SA ao Município de …, resultantes de CONTRATOS DE EMPREITADAS DE OBRAS PÚBLICAS, cujo pagamento era peticionado pela Caixa AA, SA, primitiva Autora e ora recorrida, contra o primitivo R. ora recorrente; B - Julgou erradamente, no nosso entender a Comarca de Setúbal competente para apreciar o litígio quanto às restantes facturas peticionadas por Caixa AA, SA ao Município …, o que, no entender do recorrente, não está devidamente fundamentado de direito e, está em contradição, aliás, com asserções do próprio Acórdão e viola regras processuais constitucionais e legais.

C - Revogou bem a sentença da Comarca de Setúbal quanto à taxa de juros aplicável ao caso - a fixada na cláusula 12a do contrato de factoring celebrado entre a BB, SA e a aqui recorrida - decidindo que são aplicáveis "…as taxas de juro devidas pelo atraso de pagamento de trabalhos executados no âmbito de empreitadas de obras públicas..." que "...correspondem às taxas de juro das operações comerciais." ; D - Na sequência de concursos públicos, o Município recorrente, entre Setembro de 2010 e Fevereiro de 2011 celebrou com a BB, SA os contratos de empreitada de " Requalificação da EM 5… - Acolhimento a M…" e de Requalificação Urbana dos bairros da …, … e … em ….

E - Logo em Fevereiro de 2011, BB, SA., celebrou com a aqui recorrida, Caixa AA, SA, o contrato de factoring COM RECURSO constante dos autos.

F - Os créditos da BB, SA sobre o Município, cedidos à sociedade recorrida eram, pois, emergentes dos contratos administrativos de empreitada referidos na alínea D) que tinham por objecto obras públicas, e foram celebrados na sequência de procedimentos concursais, e são obrigatoriamente submetidos a normas de direito público.

G - Em Dezembro de 2011, a BB, SA foi declarada insolvente por sentença judicial de 5 de Dezembro de 2011.

H - Notificado o Município de que tinha sido celebrado o contrato de factoring aludido, autarquia acusou a recepção da comunicação, sem qualquer termo de consentimento e pagou algumas facturas (em Março e Novembro de 2011) à recorrida, que documentavam execução de obras pela BB, SA, no âmbito dos referidos contratos de empreitada de obras públicas.

I - Declarada insolvente a BB, SA por sentença publicada no diário da república, 2a série, que advertia os credores para pagarem os créditos devidos à insolvente à massa insolvente, o recorrente Município pagou à respectiva administradora de insolvência, facturas emitidas pela BB, SA, no âmbito dos contratos de empreitada de obras públicas.

J - Em Outubro de 2011, a BB deixou ao abandono as obras que vinha executando, criando, aliás, numa delas - reabilitação da Estrada Municipal 5… - fortes condicionantes de acesso dos habitantes a Bairro Residencial, e criando risco de não financiamento das obras candidatadas a fundos europeus, obrigando o Município a realizar novos procedimentos concursais para a realização das obras deixadas ao abandono.

L - Face ao que antecede o recorrente RESOLVEU SANCIONATORiAMENTE OS CONTRATOS e reteve o pagamento de facturas em dívida à BB, no montante de 8 761€, para compensação dos prejuízos que lhe foram causados.

M - A primitiva A. instou o Município, em Junho e Julho de 2012, a pagar-lhe 391 891,27€ relativo às facturas emitidas pela BB, ao que o recorrente respondeu...

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