Acórdão nº 1695/12.8TBMTJ.L1.S1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Maio de 2017
Magistrado Responsável | OLINDO GERALDES |
Data da Resolução | 04 de Maio de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA instaurou, em 9 de julho de 2012, no então 2.º Juízo da Comarca de Montijo (Juízos Centrais Cíveis de Almada, Comarca de Lisboa), contra BB, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que a Ré fosse condenada a restituir-lhe a quantia de € 328 800,00, acrescida de juros legais, desde 4 de março de 2010.
Para tanto, alegou, em síntese, ser cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de CC, falecida em 5 de março de 2010; a R., na véspera do óbito, levantou a quantia de € 328 000,00 de conta, de que também era co-titular, na Caixa DD, pertencente integralmente à falecida, tendo entrado no património da R., sem justificação; por isso, está obrigada à restituição.
Contestou a R., por impugnação, alegando, designadamente, que foi por indicação de CC que levantara o dinheiro, que lhe pertencia, e concluindo pela improcedência da ação.
Replicou ainda a A., finalizando como na petição inicial.
Na audiência prévia, foi proferido despacho saneador, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 17 de junho de 2015, a sentença, julgando-se a ação improcedente.
Inconformada com a sentença, a Autora apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 8 de novembro de 2016, confirmou a sentença.
De novo inconformada, a Autora recorreu, em revista excecional, para o Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou essencialmente as conclusões:
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A doação por morte é proibida pelo art. 946.º, n.º 1, do Código Civil.
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O simples contrato de abertura de conta é insuficiente para titular a doação em vida.
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Factos provados afastam o animus donandi.
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O acórdão recorrido interpretou incorretamente o Direito, violando o estatuído nos arts. 946.º e 947.º, n.º 2, do Código Civil.
Com a revista, a Recorrente pretende a revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outro que condene nos termos constantes da petição inicial.
Contra-alegou a R., designadamente no sentido da improcedência do recurso.
Por acórdão de 23 de março de 2017, a Formação a que alude o art. 272.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC), admitiu a revista excecional, nomeadamente ao abrigo do pressuposto da alínea a) do n.º 1 do mesmo art. 272.º.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Nesta revista excecional, está em discussão o enriquecimento sem causa e a invalidade da doação de coisa móvel.
II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. No acórdão recorrido, após modificação, foram dados como provados os seguintes factos: 1.
No dia 5 de março de 2010, faleceu CC, no estado de viúva de EE, sem ascendentes ou descendentes vivos, tendo deixado testamento público, lavrado no 27.º Cartório Notarial de Lisboa, em 7 de março de 2001, onde fez vários legados e instituiu herdeira do remanescente da sua herança a A., bem como nomeou testamenteiras a A. e a R., nos termos constantes fls. 17 a 21.
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À data do falecimento, CC era titular, na Caixa DD, de três contas bancárias: uma sendo também titular EE, seu marido, e autorizada a A.; outra, com o n.º 05…/0…, sendo também titular a R.; e a terceira, sendo também titular EE.
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Na conta n.º 05…/0…, a falecida recebia a sua pensão de sobrevivência.
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Em 4 de março de 2010, essa conta bancária, desdobrada em três produtos bancários, apresentava um saldo de € 328 811,72.
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Nesse dia, a R. procedeu ao levantamento da quantia de € 328 000,00 dessa conta.
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O levantamento foi efetuado depois de ter sido transmitido às pessoas mais próximas, como a A. e a R., no hospital, onde CC se encontrava internada, que o falecimento estava por horas, dada a sua avançada idade e de se encontrar em coma há já algum tempo.
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Em 17 de março de 2010, foi efetuado pela Caixa DD o pagamento da pensão de março, no valor de € 663,90.
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Nesse mesmo dia, a R. procedeu ao levantamento dessa pensão e do restante saldo existente na conta.
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EE faleceu em 18 de janeiro de 2006, sem ascendentes ou descendentes vivos, tendo deixado testamento público, lavrado no 27.º Cartório Notarial de Lisboa, em 7 de março de 2001, onde declarou que, para o caso da sua mulher não lhe sobreviver, fez vários legados e instituiu herdeira do remanescente da sua herança a A., bem como nomeou testamenteiras a A. e a R., nos termos constantes de fls. 131 a 135.
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Quer CC quer EE haviam outorgado os testamentos públicos a que se referem as fls. 108 a...
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