Acórdão nº 370/15.6JALRA.C1. S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

Nestes autos, foi condenado por acórdão de 04.07.2016, da Comarca de Leiria, o arguido AA, nos seguintes termos: «

  1. Absolver o arguido AA, da prática do crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos art. 131.° e 132.°, n.ºs 1 e 2, al. e) e h), do CP.

  2. Condenar o arguido AA, como autor material e em concurso real: - Por um crime de homicídio agravado, p. e p. pelo art. 131.°, do CP e art. 86.°, n.° 3, do AJAM, na pena de 18 (dezoito) anos de prisão; - Por um crime de ofensas à integridade física agravado, p. e p. pelo art. 143.°, do CP e art. 86.°, n.° 3, do RJAM, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; - Por um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 86.°, n.° 1, al. c), do RJAM, por referência ao art. 3.°, n.° 4, al. a) da Lei n.° 5/2006 de 23/2, na redacção da Lei n.° 50/2013 de 24/7 na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

    - Em cúmulo jurídico, na pena única de 19 (dezanove) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  3. Julgando parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por BB em representação de seu filho CC, condenou o demandado/arguido a pagar à demandante a quantia global de 108 800,00 € (cento e oito mil e oitocentos euros), a que acrescem juros, sobre 28.800,00 € desde a notificação e sobre 80 000,00 desde a data do acórdão.

    Quanto ao demais pedido (144.000,00€ a título de despesas de saúde + 3.900,00€ a título de despesas escolares (infantário) +499.000,00C a título das demais despesas escolares) a fixação da indemnização correspondente remeteu para decisão ulterior — art. 564.°, n.° 2 do Cód. Civil.

  4. Julgando parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por DD, condenou o demandado/arguido a pagar à demandante a quantia global de 30.

    000,00e (trinta mil euros) a que acrescem juros, contados desde a data do acórdão.

  5. Ordenou a recolha de amostra para análise de ADN nos termos do art. 8.°, da Lei n.° 5/2008 de 12/2.

  6. Declarou perdidos a favor do Estado os bens apreendidos a fls. 55 e ordenamos a sua destruição, caso o MP não mostre interesse na manutenção dos mesmos.

  7. Ordenou a entrega à família da vítima FF os bens apreendidos a fls. 90.

    » 2.

    Deste acórdão o Ministério Público e o arguido interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 08.02.2017 decidiu: «negar provimento ao recurso interposto pelo arguido e parcialmente provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, e, em consequência, fazendo também uso do conhecimento oficioso decide-se, revogar o acórdão recorrido quanto ao enquadramento penal dos factos relativamente aos crimes de homicídio agravado, p. e p. pelo art. 131°, do CP e art. 86.°, n.° 3, do RJAM, e ofensas à integridade física agravado, p. e p. pelo art. 143.°, do CP e art. 86.°, n.° 3, do RJAM, com a consequente alteração das penas parcelares e respectivo cúmulo jurídico, decisão que se substitui nesta parte, condenando o arguido AA nos seguintes termos:

  8. Por um crime de homicídio qualificado agravado, p. e p. pelos art. 131.° e 132.°, n.° 1 e 2, al. e), do CP e art. 86.°, n.° 3, 4 e 5, do RJAM, na pena de 19 (dezanove) anos de prisão.

  9. Um crime de ofensa á integridade física simples p. e p. pelo art. 143.°, do CP, na pena de 1 (um) ano de prisão.

  10. Manter quanto ao crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.°, n.° 1, al. c), por referência ao art. 3.

    0, n.° 4, al. a), do RJAM, aprovado pela Lei 5/2006, de 23/2, na actual redacção, a pena de 2 anos e 6 meses de prisão.

  11. Nos termos do art. 77.º, n.° 1 e 2, 40.° e 71.°, n.° I e 2, da CP, condena-se o arguido na pena única de 20 (vinte) anos de prisão.

  12. No mais mantem-se o decidido no douto acórdão.

    » 3.

    O arguido interpõe agora recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões (transcrição): «1º - Por uma questão de economia processual reproduz aqui integralmente todo o supra exposto.

    1. - O Tribunal ad quo procedeu a uma incorreta subsunção das normas penais aos factos dados como provados, o que determinou uma incorreta determinação da moldura da pena nomeadamente na determinação da moldura concreta da pena única e por consequência da pena resultante do cúmulo jurídico.

    2. - Ao não considerar, a confissão do arguido (ainda que parcial), a omissão patente no douto Acórdão, configura uma nulidade eventualmente suprível, mas, que ainda assim terá efeitos no desvalor da conduta do arguido.

      Para menos, e nunca para mais como se pretendeu no Recurso, a que parcialmente o TRC deu provimento parcial, agravando a pena do arguido em seis meses de prisão – fixando a pena única em 20 anos.

    3. - Mutatis Mutandis, se dirá quanto à não consideração do medo e da manifesta provocação da vitima ao arguido, que poderá ter-se sentido " ameaçado" na sua virilidade sexual suportando com dificuldade e também alguns receios e medos – os intensos olhares do arguido sobre a sua namorada.

      A Psicologia e a sociologia podem explicar tais condutas como problemática de auto estima, baixa ou alta. Perante a troca de olhares intensos, a vítima, vai lá (dirige-se ao arguido) para trocar razões…intimidar….

      Razões mais que suficientes para afastar a qualificação dos factos por motivo fútil, como sabiamente nesta parte fizeram o ilustre tribunal ad quo, e o ilustre magistrado do MP junto do TRC; no entanto em nossa modesta opinião existe excesso de dolo aplicado ao arguido desde logo em sede de primeira instância.

    4. - A consideração do exposto (nomeadamente medo, confissão, nítida provocação da vitima - bravata), não justificando a conduta do arguido, a qual deverá ser sempre censurável, é contudo esvaziada de conteúdo, ou desvalorizada perante tais argumentos exposto pela defesa.

    5. - Circunstâncias estas, que existiram, que em concreto, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor do arguido, as quais não foram consideradas pelo I. T. ad quo nem pelo TRC.

    6. - Nesta parte, o Acórdão do I. T. ad quo, é nulo, porque omisso, o que se invoca; “comungando” do também deste “pecado”, em nosso modesto entender o douto acórdão do TRC.

    7. - O in dubio pro reo, sendo o Princípio basilar do D. Penal, obriga o aplicador da leis, o “cirurgião "a equacionar todas as circunstâncias, que não justificando a conduta de um qualquer arguido, desde logo na desvalorização das razões da sua acção. Porque razões houve – foi tirar a vida – seguido de uma discussão – o que desde logo afasta o motivo fútil.

      Ficou por averiguar o tom e modo dessas palavras. Se proferidas com ar sereno, brincalhão, sério, intimidatório… 9º - Ou seja, todas as circunstâncias devem ser equacionadas que permitam o “menos”; o “comando” do princípio é claro: em caso de dúvida o julgador deve absolver, logo por exclusão de partes deve aplicar o menos ou mínimo.

    8. - Mas, também em caso de dúvida, sobre as circunstâncias, o julgador deve aplicar o menos. Por isso não tem o TRC fundamentos plausíveis para agravar a pena do arguido.

    9. - Por todo o exposto, o douto Acórdão (como também já pecava o douto acórdão proferido em primeira instancia) do TRC peca por excesso de dolo aplicado ao arguido não equacionando a manifesta provocação da vítima ao arguido nem a confissão parcial.

    10. - Factos, dados por provados, que em conjugação com outros elementos de prova, e regras da experiência comum, permitem concluir que existiu nítida provocação da vitima ao arguido. Ainda que não devidamente apurada em sede em audiência de julgamento.

      Tudo leva a crer que existiu, houve discussão verbal seguida de tiros.

    11. - Ora, quem se dirige…para algum lado… das duas uma? (Neste caso a vitima dirigiu-se ao arguido): -ou vai com Deus (como diria o poeta e canta Roberta Miranda) e pacificamente? - ou “vai á má fila”, como se dirá na gíria popular com “ar” intimidatório? Foi a vítima que se dirigiu ao arguido… 14º - No caso concreto, tudo leva a crer, atenta a experiência comum, que a vítima se terá dirigido ao arguido um pouco à laia de: “à má fila”, com uma postura intimidatória, ameaçadora e em tom de voz agressiva, com sentimentos de eventual ciúme a toldarem-lhe as emoções.

    12. - Apenas essa conduta intimidatória da vítima poderá explicar a “brutal” reacção do arguido (franzino e magrinho) perante e com excesso de medo. Lembrando que a vítima era segurança de casas nocturnas, e exibia fisicamente dotes culturistas, não obstante ser uma pessoa muito querida, conhecida e respeitada publicamente em ....

    13. - Afinal, a caminho da Nazaré - terra do MC Nammara - o arguido até estava na “dele” bebendo uma cervejinha. e observando com ar de “gingão.” a EE namorada da vitima.

      “O arguido fixou o olhar na direcção da EE – que estava na companhia do FF e que se encontravam à entrada do café Mineira.” (factos provados… 7) “Então o arguido colocou-se junto à porta do condutor e com esta porta aberta, colocou uma cerveja que trazia consigo em cima do tejadilho, ficando voltado na direcção da porta do café ...”.

      (factos provados 6) 17º - A não consideração da confissão integral e sem reservas e o medo manifestado pelo arguido face à nítida provocação da vítima, no decorrer de uma “brava” que afasta a qualificação dos factos por motivo fútil, leva-nos a concluir que existe em nítido excesso de dolo aplicado aos factos cometidos pelo arguido que ora invoca.

    14. - Claramente o tribunal ad quo, é o mais bem preparado para aferir dos factos, porquanto lida directamente com as provas, com testemunhas e arguido. Interage activamente nos autos em virtude da imediação das provas.

    15. - Ao proceder a uma qualificação dos factos por motivo fútil, dando provimento parcial ao recurso do MP, o TRC, claramente derroga ou declina na obediência a que estão sujeitos todos os tribunais – a observar o Principio do Contraditório (art. 3 do CPC) pedra basilar do direito processual. Portanto podemos dizer, que não foi dado em sede de audiência de julgamento no tribunal ad quo oportunidade ao arguido de se defender dos factos integradores do...

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