Acórdão nº 59/14.3PDPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelSOUSA FONTE
Data da Resolução30 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório 1.1.

No processo em epígrafe, da «Instância ..., Secção de ..., ...», da comarca do ..., que correu perante o tribunal singular, sob a forma de processo abreviado, respondeu o arguido AA, nascido em ... na freguesia de ..., titular do BI nº ..., filho de ... e de ..., ..., residente na Rua...., sob a acusação de ter praticado um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artº 25º, alínea a), do DL 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-A, anexa ao mesmo diploma legal.

Pela sentença de fls. 233 e segs., proferida em 12.12.2014, foi absolvido da prática do referido crime.

1.2.

Inconformado, o Ministério Publico recorreu para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo acórdão de 08.07.2015, fls. 371 e segs., decidiu (transcrevemos o respectivo dispositivo): «a) alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, julgando-se provados os seguintes factos julgados não provados na sentença recorrida: • Nas circunstâncias de tempo e lugar atrás descritas, o arguido de imediato após se ter apercebido da presença dos agentes da PSP, a fim de evitar ser encontrado na sua posse, atirou para o chão uma embalagem contendo heroína, com o peso líquido de 5,295 g, produto estupefaciente que detinha.

• O arguido AA agiu sempre de forma livre e consciente, sabendo quais eram as características, natureza e efeitos dos produtos estupefacientes que detinha.

• O arguido sabia ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei.

b) julgar provada a acusação deduzida pelo Ministério Público contra o arguido … e, por via disso, o mesmo autor da prática de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelo art.º 25.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência à Tabela I-A anexa a esse diploma legal e condená-lo na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) de prisão» (negrito da nossa autoria).

1.3.

Não concordando com este desfecho, o Arguido interpôs recurso daquele acórdão condenatório para o Supremo Tribunal de Justiça cuja motivação encerrou com as seguintes conclusões que transcrevemos: «A.

O Douto Acórdão sob recurso vai contra a interpretação do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de fixação de jurisprudência n.º 3/2012, de 08-03-2012, prolatado no processo n.º 147/06.0GASJP.P1-A.S1-3.ª Secção, publicado no Diário da República, 1.ª Série, n.º 77, de 18 de Abril de 2012; B.

Porquanto “o Ministério Público recorrente não observou os ónus legais decorrentes do art.º 412.º, nos. 3, alínea b), e 4 do Código de Processo Penal” – (ver ponto 2.2, pág. 21 do Ac. RP); C.

O recurso interposto pela Ex.ma Sra. Procuradora Adjunta da sentença da Secção de Pequena Criminalidade do Porto – J2 deveria ter sido rejeitado.

D.

Não pode menosprezar-se e, muito menos, olvidar que o arguido/recorrente já tem várias condenações em penas de prisão e uma delas é por tráfico de estupefacientes; E.

Mas, se é inegável que a existência de condenações anteriores constitui um índice de exigências acrescidas de prevenção, também se aceita facilmente que a existência dessas condenações “não é impeditiva, a priori, da concessão da suspensão” (ainda, Figueiredo Dias, ob. cit., 344); F.

Também não pode desvalorizar-se a circunstância de o arguido/recorrente ter reincidido na prática do crime em período de suspensão da execução de penas de prisão, deve ser de realçar o esforço de reinserção social que o arguido vem fazendo; G.

Quando se indaga sobre a inserção social de um indivíduo, um dos fatores essenciais a ter em consideração é a existência de uma ocupação duradoira, profissional ou outra, ou, pelo menos, que tenha hábitos de trabalho, e o arguido/recorrente tem hábitos de trabalho e mostra empenho em manter-se laboralmente ocupado; H.

O arguido/recorrente está sujeito a regime de prova, com acompanhamento por técnico de reinserção social, e a sua postura tem sido de “participação e colaboração, com diligências concretas direcionadas ao sucesso do seu plano de reinserção social”; I.

Sem menosprezar a persistência dos fatores de risco de assunção de novos comportamentos anti-normativos, afigura-se-nos ser de estimular o esforço e a vontade revelados pelo arguido de trilhar novos caminhos; J.

Deve privilegiar-se a socialização em liberdade e há razões para crer que é genuína a vontade de regeneração do arguido, pelo que – assim o cremos – a suspensão não fará com que se frustre a função de tutela de bens jurídicos que a pena, irrenunciavelmente, desempenha; K.

Uma das dimensões de prevenção geral positiva é o restabelecimento ou revigoramento da confiança da comunidade na efetiva tutela penal dos bens jurídicos fundamentais à vida coletiva e individual e é através da condenação penal, enquanto reafirmação efetiva da validade das normas violadas e, portanto, da importância dos bens jurídicos lesados, que essa mensagem de confiança é dada; L.

Este juízo de prognose positivo sobre o futuro comportamento do arguido comporta um risco elevado (que, no entanto, pode ser mitigado com a sujeição a regime de prova a efetivar de acordo com o que vier a ser determinado pela DGRS, podendo aproveitar-se o plano que está em execução e, eventualmente, adaptá-lo à nova realidade); M.

Cabe ao arguido demostrar que é merecedor desta nova oportunidade de reinserção em liberdade que lhe é concedida, na certeza de que não haverá complacência para novos comportamentos criminosos que assumam; N.

Deveria ir neste sentido uma pena mais reduzida, mas sempre suspensa na sua execução, suspensão que seria acompanhada de regime de prova, mediante plano individual de reinserção social a elaborar e a fazer executar pelos serviços da DGRSP; O.

No que concerne ao ponto 2.2 do Douto Ac. da RP, pág. 22, explicita-se na nota 9, que “nenhuma contradição existe entre estes três depoimentos, precisavam era de ser adequadamente focalizados no tempo e não o foram na sentença recorrida”; P.

Da mesma forma que estes três depoimentos não foram focalizados no tempo pelo Douto Acórdão sob recurso, pois que tal exercício apenas seria possível com a repetição destes três depoimentos, questionando-os diretamente a fim de os focalizar no tempo; Q.

Não entendemos, por isso, como se conseguiu agora pela mera audição destes depoimentos – num autêntico suplício digno de Tântalo, nos dizeres do Senhor Juiz Desembargador Relator – obter aquela focalização que permite uma outra decisão; R.

O Douto Ac. da RP sob recurso ultrapassa os limites à reponderação de facto, já que a Relação fez um segundo/novo julgamento integral, em vez de um reexame necessariamente segmentado, envolvendo tal reponderação um julgamento/reexame meramente parcelar, de via reduzida, substitutivo; S.

O Douto Ac. da RP sob recurso ao reapreciar, só poderia determinar alteração à matéria de facto assente se concluísse que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitam uma outra decisão; T.

No fim de contas o Douto Ac. da RP sob recurso veio agora contrapor a sua versão dos factos à convicção da 1.ª Instância, colhida na imediação e na oralidade (princípios estes que o Tribunal Superior não tem à sua disponibilidade) e abalar esta convicção; U.

Ora, se atentarmos na fundamentação dos factos provados e dos factos não provados que consta da sentença e para a qual remetemos (dado a forma exaustiva e pormenorizada do modo que conduziu a Senhora Juiz na 1.ª Instância a considerar não provados aqueles factos), não se vislumbra que o Tribunal recorrido, na sua livre convicção, não tenha tido dúvidas mais que razoáveis quanto à prática do crime pelo arguido; V.

Pelo contrário, resulta da fundamentação, suficientemente objetivada, que os elementos referidos conjugados com as normas da experiência...

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