Acórdão nº 107/15.0YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Fevereiro de 2016

Data23 Fevereiro 2016
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

* Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, a exercer funções como juíza auxiliar no Tribunal da Relação de ...., interpôs recurso contencioso da deliberação de 22 de Junho de 2015 do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, que fixou a graduação final dos concorrentes ao IV Concurso Curricular de Acesso aos Tribunais de Relação, por aprovação do Parecer do Júri do Concurso. No articulado apresentado a recorrente AA alegou[1]: 1º O presente recurso é apresentado, nos termos do artigo 169º, nº 1 e 171.°, nºs 1 e 2 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), no prazo de 30 dias, na secretaria do Conselho, e dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, 2.° Pretende a recorrente a declaração de nulidade (ou a respectiva anulação) da deliberação recorrida na parte em que, quanto a si, aprovou o "Relatório Final do Júri" em sessão Plenária Extraordinária do Conselho Superior da Magistratura realizada no aludido dia, fundamentando a sua pretensão nos vários vícios de que entende aquela padecer, traduzidos na violação dos poderes vinculados atribuídos àquele órgão para a prossecução do fim legalmente estabelecido.

Assim, 3.° Um dos factores de avaliação era a capacidade de trabalho, sendo que sob este item foi a ora recorrente qualificada (apenas) de boa, tendo-lhe sido atribuídos 7 pontos em 12 possíveis.

4º Apesar de se considerar que "o CSM goza nas matérias de graduação e classificação da chamada discricionariedade técnica, insindicável, caracterizada por um poder que, embora vinculado aos preceitos legais, lhe deixa margem de liberdade de apreciação dos elementos fácticos" (cfr. Acórdão do STJ de 22.01.2015), evidencia¬se como indiscutível que aquele órgão está, também nas aludidas matérias, obrigado à observância dos princípios fundamentais estabelecidos na Lei e na Constituição.

  1. Assim, um dos "momentos mais relevantes da vinculação da Administração pelo princípio da igualdade", e a "autovinculação (casuística) da Administração no âmbito dos seus poderes discricionários, devendo ela utilizar critérios substancialmente idênticos para a resolução de casos idênticos, sendo a mudança de critérios, sem qualquer fundamento material, violadora do princípio da igualdade". (Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco Amorim ln Código do Procedimento Administrativo Comentado, Almedina, 2ª edição, página 100) 6.° ln casu, surpreendem-se vários erros de apreciação e de aplicação dos factores de avaliação, nomeadamente quando em comparação com a avaliação de outros candidatos, tendo o Júri (decisão acolhida pelo CSM) adoptado critérios substancialmente diversos para a resolução de casos idênticos, ou seja, diferenciando candidatos com reporte exclusivo a factos objectivos aritméticos iguais ou, ainda mais grave, beneficiando candidatos com factos aritmeticamente mais desfavoráveis. Assim, 7.° 1 - Consta do referido Parecer, quanto à ora recorrente, o seguinte: "1.6.3. A capacidade de trabalho.

    Em primeira instância) os relatórios indicam uma produtividade excelente. Considerando todas as circunstâncias, em especial a pendência processual, o elevado número de despachos diários e o tempo gasto com as diligências, os atrasos detetados foram tidos por justificados. Ulteriormente) registam que a sua produtividade é considerada superior à média, numa atitude de total entrega, fazendo tudo quanto foi chamada a fazer, imprimindo permanente celeridade ao seu exercício.

    No entanto, como Juiz de Direito Auxiliar no Tribunal da Relação, os dados estatísticos manifestam que, desde Setembro de 2012 até ao fim de 2014, tem mantido uma elevada pendência - em Dezembro de 2014 tinha 43 processos pendentes.

    Relatou uma média anual de 71 acórdãos, pelo que globalmente ponderada a sua prestação representa uma boa capacidade de trabalho." 8.° Afirmar que se mantém uma elevada pendência não é, como se sabe, um facto mas sim uma (mera) conclusão.

  2. A conclusão extrai-se de factos.

  3. Em concreto, porém, os factos infirmam a conclusão constante do Parecer em causa.

  4. O referencial numérico para fundamentar a conclusão da "elevada pendência" está errado. Em Dezembro de 20 I 4, a ora requerente não tinha 43 processos pendentes, mas sim 39. (Basta a mera consulta dos elementos estatísticos que o Tribunal da Relação de Évora enviou para o CSM para se constatar este erro grosseiro) 12.° Por outro lado, a ora recorrente não manteve a pendência mas reduziu-a.

  5. Com efeito, comparando as pendências nos 3 anos abrangidos pelo intervalo temporal a considerar, é notória tal redução.

  6. No 1º ano (2012), como juiz auxiliar no Tribunal da Relação de ...., foram-lhe distribuídos, em 4 meses, 48 processos, o que equivale (seguindo o mesmo critério que o júri utilizou para calcular a média anual dos processos findos) a uma pendência anual extrapolada (48 + 4 x 12) de 144 processos.

  7. No 2° ano (2013), a pendência baixou para 43.

  8. No 3° ano (2014), a pendência tomou a baixar para 39.

  9. Afirmar, em face desta realidade aritmética, que a recorrente manteve uma pendência elevada é um erro objectivo desmentido pelos factos aritméticos que a suportam.

  10. Dos factos extrai-se conclusão diversa, ou seja, que a reclamante vem sustentadamente reduzindo a pendência.

    Por outro lado e sem prescindir, 19º Desconhece a recorrente (uma vez que ao mesmo não se faz qualquer referência) qual o critério seguido pelo Exmº Sr. Relator para qualificar a pendência da reclamante como "elevada", 20º Do que se conhece, o CSM não tem qualquer directiva ou estudo que tal determine ou indique.' 21º Assim, a afirmação sobre determinada pendência sendo o juízo sobre uma pendência sem uma análise comparativa (ou, pelo menos, a mera indicação) entre as pendências todos os concorrentes ou uma explicação (inexistente) das razões da qualificação, estamos perante uma afirmação absolutamente infundamentada.

  11. Recorde-se que "a diferenciação [aqui traduzida na pendência elevada face às pendências de outros candidatos] há-de ser sempre feita por ( ... ) categorias e nunca em função de uma situação pessoal, concreta e determinada, porque, então, não há desigualdade, mas arbítrio, discriminação." (idem, ibidem) 23º A qualificação de uma pendência como elevada tem, assim, como pressuposto a determinação da respectiva categoria, em oposição à categoria da pendência não elevada.

  12. Sem tal categorização, caímos na apreciação casuística e, como vimos, arbitrária e discriminatória, apenas da situação pessoal e concreta da ora recorrente.

    Com efeito, 24º Qualquer juízo sobre a pendência de determinado juiz só pode qualificar-se como sério e devidamente fundamentado se levar em conta o número de processos que o mesmo recebeu e relacionar tal número com o número de processos que o mesmo findou.

  13. Efectuando, quanto à reclamante, tal juízo relacional objectivo: Foram distribuídos à ora reclamante, no intervalo temporal em causa (de Setembro de 2012 a Dezembro de 2014, ou seja, em 28 meses), 205 processos cíveis.

  14. Tal distribuição corresponde a uma média anual de 87,857 processos. (205 -ê- 28 x 12) 27º Esta média ultrapassa largamente o VRP (valor de referência processual) cível indicado no estudo do CSM de Julho de 2011, que é de 70 a 75 processos.

  15. Quanto aos processos findos (realidade que originou a supra mencionada redução sustentada da pendência), da mera consulta da tabela que o Tribunal da Relação de Évora enviou para o CSM, extrai-se com meridiana clareza que o seu número aumentou no intervalo temporal considerado: foram findos 14 processos nos últimos meses de 2012, 71 no ano de 2013 e 81 em 2014. Mais uma vez, esta realidade desmente de forma evidente a asserção constante do Parecer de manutenção de uma situação negativa. (elevada pendência) 29º Não será ilegítimo supor, aliás, que esta omissão do rigor aritmético que se impunha quanto a uma realidade objectiva como é a produtividade tenha sido replicada na apreciação dos trabalhos apresentados pela ora reclamante e respectiva notação (apenas 27 pontos em 35 possíveis), ideia tanto mais reforçada pela circunstância de o Exmº Sr. Relator, ter, na entrevista, questionado a mesma sobre o desfecho de uma das sentenças apresentadas, quando a mesma havia sido integralmente confirmada pelo STJ, tendo sido junta pela ora reclamante a respectiva certidão juntamente com os demais elementos. Porém, tal dúvida nunca será cabalmente esclarecida, uma vez que, quanto à apreciação qualitativa dos trabalhos, estamos no âmbito da chamada discricionariedade técnica, in sindicável a não ser nos seus pressupostos normativos. Ficam, assim, os concorrentes sujeitos ao maior ou menor rigor de cada um dos arguentes na apreciação subjectiva dos trabalhos apresentados.

  16. Mas, elo menos tão importante como o acabado de referir, é a contradição flagrante e ostensivamente injusta entre a produtividade dos diversos candidatos, tendo sido adoptados pelo Júri critérios diversos para qualificar situações objectivas semelhantes, ou seja, tratando de forma diferente situações iguais, com ostensiva violação do princípio da igualdade e sem o respeito pelos critérios pré-estabelecidos a que estava vinculado, consagrado constitucionalmente (ver artigos 266.°, nº 2 e 13º da CRP) e no novo Código de Procedimento Administrativo (art." 6.°) 31º Senão vejamos: 1- O Exmº Sr. Magistrado Concorrente nº 49. (fls, 323 e seguintes da Deliberação) Proferiu uma média de 71 acórdãos relatados e foi-lhe atribuída a notação de excelente, a que corresponderam 11 pontos.

    Estamos perante uma discriminação clamorosa, ostensiva e arbitrária.

    Desde logo, relataram os dois exactamente o mesmo número de acórdãos, ou seja, 71, sendo os do Sr. Magistrado Concorrente de natureza criminal.

    Deve aqui sublinhar-se que, para efeitos de produtividade, o próprio CSM entende não ser indiferente estarmos perante acórdãos de natureza criminal ou de natureza cível.

    De acordo com o citado Estudo do CSM de 2011 (cfr. respectivas fls, 105). há um "desvio-padrão" de 5 processos I ano entre...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT