Acórdão nº 461/14.0TJLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | ÁLVARO RODRIGUES |
Data da Resolução | 08 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA - Companhia de Seguros, S.A., que actualmente mudou a sua denominação social para BB, S.A., intentou a presente acção declarativa com processo comum contra a Companhia de Seguros CC, S.A.
e contra DD, todas com os sinais dos autos, alegando em resumo o seguinte: Tendo a A. celebrado um contrato de seguro de acidentes de trabalho com a sociedade «EE, Lda.», ocorreu um sinistro que vitimou mortalmente um trabalhador desta, sinistro esse que configura simultaneamente acidente de viação e de trabalho.
No processo de acidente de trabalho que correu termos, tendo o infausto evento ocorrido sido caracterizado, efectivamente, como um acidente de trabalho, a A. assumiu o pagamento ao Fundo de Acidentes de Trabalho da quantia de 20.370,00 €, quantia que efectivamente pagou.
Nos termos do n° 4 do art. 17º da lei 98/2009, de 4-9, a A. pode sub-rogar-se no direito do lesado contra os responsáveis pelo acidente.
A R. DD foi a única responsável pelo acidente de viação que vitimou o dito trabalhador.
A R. DD celebrara com a «Companhia de Seguros CC» seguro de responsabilidade civil automóvel, transferindo para esta a responsabilidade civil decorrente do referido acidente.
Formulou a A os seguintes pedidos:
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Deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, a Primeira Ré, “Companhia de Seguros CC, SA”, ser condenada a pagar à Autora o montante de 20.370,00€ (vinte mil, trezentos e setenta euros), à qual acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, que ascendem, na data da propositura da acção, a 2.656,05€ (dois mil, seiscentos e cinquenta e seis euros e cinco cêntimos), bem como os juros vincendos, igualmente à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; Subsidiariamente, desconhecendo a Autora a validade do contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, celebrado entre a Primeira e a Segunda Rés, à data em que se verificou o sinistro em causa nos presentes autos, que vitimou mortalmente FF, de harmonia com o disposto nos art.° 554°, n.º 1, e 39° do Novo Código de Processo Civil… b) … deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, a Segunda Ré, DD, ser condenada a pagar à Autora o montante de 20.370,00€ (vinte mil, trezentos e setenta euros), à qual acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, que ascendem, nesta data, a 2.656,05€ (dois mil, seiscentos e cinquenta e seis euros e cinco cêntimos), bem como os juros vincendos, igualmente à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento».
Contestou a R. DD, alegando ser parte ilegítima uma vez que à data do acidente existia seguro válido, devendo ser absolvida da instância e pedindo a condenação da Autora, como litigante de má fé, em multa e indemnização a seu favor, não inferiores a € 5.000,00 e € 10.000,00, respectivamente.
Também a Ré CC contestou. Invocou a nulidade do processo tendo em conta alegada nulidade da petição, com a consequente absolvição da instância.
Invocou, outrossim, a prescrição da pretensão deduzida pela, considerando o prazo do n° 4 do art. 17º da Lei 98/2009.
Por fim, invocou a excepção da preterição do tribunal arbitral, face à regulamentação emitida no âmbito da Convenção Regularizadora de Sinistros.
Impugnou, ainda, a R. factualidade alegada pela A.
Foi proferido despacho saneador, no qual o Tribunal de 1ª instância absolveu da instância a R. DD, por esta ser parte ilegítima na acção, assim como absolveu da instância a Ré «CC» por preterição do Tribunal Arbitral.
Inconformada, a Autora apelou para o Tribunal da Relação de …, porém sem sucesso, pois foi julgado improcedente o recurso, embora com diversa fundamentação, confirmado a decisão recorrida por unanimidade.
Não se conformando com tal Acórdão, a Autora trouxe, do mesmo, recurso de Revista para este Supremo Tribunal, rematando a sua minuta recursória com as seguintes: CONCLUSÕES
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O acórdão recorrido não apreciou a exclusão da aplicabilidade do protocolo anexo à convenção de regularização de sinistro, por entender tratar-se de uma questão nova; b) Ora, nos termos das disposições conjugadas do disposto no art. 4°, alínea b) da mencionada convenção e art. 3°, alínea b) do seu Anexo II, a mencionada Convenção Regularizadora de Sinistros não é aplicável ao litígio que aqui se pretende dirimir; c) Nos termos do preceituado no art. 3°, alínea b) do referido Anexo II "excluem-se do âmbito de aplicação do presente Protocolo (...) acidentes em que os titulares do direito exijam, judicial ou extrajudicialmente do subscritor Automóvel, a indemnização integral": d) Ora, a Recorrente referiu que no âmbito do processo judicial que correu termos sob o n.º 1583/11.5TABFA, no extinto 2.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de …, a única herdeira do sinistrado FF, deduziu pedido de indemnização cível contra a Recorrida, no qual peticionou uma indemnização integral nos termos supra aludidos; e) Na sequência da peticionada indemnização, veio a Recorrida requerer a intervenção da Recorrente, com o objectivo de apurar o montante efectivamente pago pela Recorrente na sequência do acidente simultaneamente de viação e de trabalho.
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Assim, tratando-se de um acidente em que já foi judicialmente requerido o pagamento de indemnização integral, conforme acima referenciado, não se aplica a mencionada convenção, pelo que deve ser julgada improcedente a excepção de preterição do Tribunal Arbitral.
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Contudo, o acórdão recorrido entendeu que esta exclusão consubstancia uma questão nova de que não podia conhecer; h) Na verdade, foi a própria Recorrida que suscitou pela primeira vez esta questão quando, no artigo 23° da contestação confessou que requereu a intervenção da aqui Recorrente no processo que correu termos em … com o propósito exclusivo de apurar o montante das indemnizações, despesas, pensões, etc. que tenha sido condenada a pagar aos herdeiros do sinistrado FF, de forma a evitar uma eventual e inadmissível cumulação de indemnizações; i) Face ao confessado pela Recorrida, a sentença deu como provado que foi requerida a intervenção da Autora no processo que correu termos no Tribunal de … com o propósito exclusivo de se apurar o montante das indemnizações, despesas, pensões, em que tenha sido condenada a pagar aos herdeiros do sinistrado, deste modo se evitando uma eventual e inadmissível cumulação de indemnizações" - cfr. sentença proferida a fls. dos autos; j) Assim, e ao contrário do defendido pelo acórdão recorrido, tendo sido alegados aqueles factos pela Recorrida, os quais levariam à exclusão ou inaplicabilidade da Convenção de Regularização de Sinistro e, consequentemente, à improcedência da excepção de preterição do Tribunal Arbitral, deveria o acórdão recorrido conhecer desta questão; k) Não tendo o acórdão recorrido pronunciado quanto à exclusão invocada, deve ser declarado nulo, nos termos do artigo 666°, n º 1, do CPC, ex-vi, artigo 615, n.º 1, al. d), do CPC.
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É da competência do Tribunal estadual a verificação da inaplicabilidade da convenção de arbitragem, tal como decorre do artigo 5°, nº 1, da Lei de Arbitragem Voluntária.
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Constando da própria sentença recorrida factos que levavam à inaplicabilidade da convenção de arbitragem, deveriam os Exmºs. Senhores Juízes Desembargadores no acórdão recorrido declarar a inaplicabilidade da convenção de arbitragem e, em consequência, julgar improcedente a excepção de preterição do tribunal arbitral.
Foram apresentadas contra-alegações pela Recorrida, Cumpre apreciar e decidir, pois nada obsta ao conhecimento do objecto do presente recurso, sendo que este é delimitado pelas conclusões da alegação do Recorrente, nos termos, essencialmente, do artº 635º do CPC, como, de resto, constitui doutrina e jurisprudência firme deste Tribunal.
FUNDAMENTOS Da 2ª Instância, vem fixada definitivamente a seguinte factualidade: 1 – Entre a A. e “EE, Lda.” foi celebrado contrato de seguro obrigatório de acidentes de trabalho, garantindo os trabalhadores por conta doutrem desta sociedade, abrangendo os acidentes ocorridos durante o percurso normal entre os locais de residência e de trabalho, nos termos de fls. 89-95.
2 - Em 19-6-2012, em tentativa de conciliação perante o Ministério Público, nos autos de acidente de Trabalho (morte) nº 508/11.2TTFAR, aquele Magistrado declarou, designadamente, resultar dos referidos autos que no dia 9-7-2011 o sinistrado FF foi vítima de um acidente de trabalho como trabalhador por conta da entidade empregadora “EE, Lda.”, com sede na Rua …, nº 24, em F…, consistindo o acidente em atropelamento ao atravessar a estrada, e que do acidente resultaram as lesões descritas no relatório de autópsia que foram causa directa e necessária da morte do sinistrado ocorrida em 16-7-2011, sinistrado que era solteiro e não tinha descendentes ou familiares com direito a pensão; 3 - O representante da «Companhia de Seguros AA, SA» ali presente, declarou aceitar a existência e caracterização do acidente como de trabalho, o nexo de causalidade entre o acidente, as lesões e a morte, o valor da remuneração anual do sinistrado – 6.790,00 €/ano – e que não havendo benificiários com direito a pensão aceitava efectuar o pagamento ao FAT de uma importância igual ao triplo da retribuição anual da vítima – ou seja 20.370,00 €; 4 – Uma vez que a representante do FAT nada opôs, as partes foram dadas por conciliadas (fls. 14-15).
5 – A Autora pagou ao FAT a quantia referida em 3) (fls. 6).
6 – No âmbito da Associação Portuguesa de Seguradores, a Autora e a R. «CC» são subscritoras da «Convenção de Regularização de Sinistros», documentada a fls. 185 e seguintes e a fls. 329 e seguintes.
É tendo em pauta este quadro factual definitivamente...
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