Acórdão nº 0155/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução05 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1.

A… e seu marido B…, em representação do filho menor C… intentaram acção declarativa contra o Município de Ponte de Lima, com base em responsabilidade civil extracontratual, pedindo a condenação do Réu ao pagamento de uma quantia nunca inferior a 77.571.988$00 mais juros vincendos, para indemnizar o lesado dos prejuízos que sofreu em consequência dum acidente causado por ausência de sinalização, péssima conservação da estrada, inoperacional sistema de recolha de águas pluviais, localização da sarjeta, ausência de meios de canalização das águas pluviais, existência de pedras na berma.

1.2.

Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 20 de Outubro de 2008, foi a acção julgada totalmente improcedente e absolvidos do pedido o Réu Município de Ponte de Lima e as intervenientes Freguesia de … e Freguesia de ….

1.3.

Inconformado, o autor interpôs o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões: “1. Os réus violaram culposamente o dever de sinalizar uma estrada perigosa, de sinalizar e remover um obstáculo existente na via e de sinalizar e remover um obstáculo existente na berma; 2. Não está provado nenhum facto que permita justificar o comportamento dos demandados; 3. O comportamento dos demandados presume-se culposo nos termos do artigo 493.° do CC; 4. A presunção acima referida abrange uma presunção de ilicitude, de culpa e de causalidade; 5. Porém, o nexo de causalidade entre o comportamento dos demandados e o acidente está positivamente demonstrado nos autos; 6. A prova de que o condutor perdeu o controlo da motorizada depois de descrever uma curva (contracurva à esquerda) onde existia areia (1.1.), de que a curva do acidente era relativamente fechada (1.3), de que não existia sinalização (1.10), de que existia areia na estrada (2.9) e de que o lesado só podia avistar a areia “no último momento” (2.11) é suficiente para dar ao juiz a certeza prática de que os factos (ilícitos) são causa do acidente e do dano; 7. Acresce que, está ainda provado que o condutor lesionou a espinha dorsal ao cair contra a pedra que se encontrava logo após a plataforma de rodagem do lado direito, atento o sentido de marcha da motorizada.

8. Estando provado, sem nada que o justificasse, que existiam pedras na berma, e que foi nessas pedras que o Autor lesionou a espinha dorsal, está suficientemente indiciada de que essa circunstância - existir pedras na berma - configura a prática de um acto ilícito, culposo e gerador de danos ao autor; 9. Estão provados todos os pressupostos dos quais depende a responsabilidade civil dos demandados; 10. Os demandados devem ser condenados a indemnizar o autor pelos danos por si sofridos, nos termos peticionados na petição inicial; 11. A decisão recorrida violou os artigos 483.° e 493.° do Código Civil, o artigo 5.° do Código da Estrada e a Lei 2110, de 19 de Agosto de 1961.” 1.4.

O Município de Ponte de Lima contra-alegou nos seguintes termos: “1.º A douta sentença em mérito decide com rigor e bom critério os factos colocados ao merecimento, que subsumidos ao direito aplicável determinaram a improcedência da acção.

O recurso a que responde elaborado com apelo a uma retórica notável não conduz à lógica que imediatamente pretende atingir, na medida em que evidencia isso sim o inverso pela flagrância das contradições e erros que integram as premissas das conclusões que expressa.

  1. Situemos o enquadramento dos factos e o juízo que o tribunal colectivo sobre eles formou.

    Do probatório vertido na sentença extraem-se, com relevo os seguintes factos: A ─ “À data do acidente o menor C… tinha 17 anos de idade”─ fls. 282, ІІІ, 1.1; B ─ “Naquele dia o menor tinha sido aprovado no exame de condução” fls. 283, ІІІ.2.3; C ─ “e levava a motorizada que tinha sido usada para o exame, vindo de Viana do Castelo para a casa de D…, instrutor da referida escola” — ibidem, 2.4; D ─ “A aquisição do veiculo motorizado, ... …-…-… ... encontra-se registada a favor de “E…” 282, 1.11; E ─ “A sociedade “E…” tem como objecto o ensino de condução de viaturas automóveis” ibidem 1.12; F ─ “ O acidente dos autos ocorreu no caminho que estabelece a ligação entre o lugar da …, freguesia de …. e o lugar do …, freguesia de … ..., o qual é normalmente destinado para acesso às propriedades rústicas agrícolas e florestais, através das quais se inscreve, e demais trânsito rural”, (todos os sublinhados são nossos) ─ fls. 284, III, 2.22; G ─ “Este caminho destina-se essencialmente ao trânsito rural” ibidem, 2.23; H “E é classificável como caminho vicinal” ─ ibidem, 2.25; І ─ “Um caminho vicinal não se encontra nas mesmas condições de circulação de uma estrada nacional, no qual de um momento para o outro podem encontrar-se diferentes situações do estado do pavimento”.

    J ─ “O acidente dos autos ocorreu numa zona com uma sequência rápida de curvas e contracurvas apertadas” ─ ibidem, 2.26; K ─ “ ...O menor... perdeu o controlo da motorizada depois de descrever uma curva (contracurva à esquerda) onde existia areia” ─ fls.. 283, 2.1.; L ─ “Existia areia localizada na curva que antecede o local do sinistro” ─ ibidem, 2.9.

  2. O julgado pelo colectivo dos juízes não pode conduzir a sentença diversa porquanto o recorrente “não logrou provar, como lhe era legalmente imposto, a factualidade necessária à integração e verificação dos pressupostos de responsabilidade porquanto não deriva daquela mesma factualidade que o estado do piso e/ou a ausência de sinalização seja ou tenha estado na origem do embate.

    Nada do que se logrou provar permite perceber ou ligar as condições concretas da via em questão ao acidente que vitimou o C… de molde a que a situação do piso e/ou ausência de sinalização tivesse, de algum modo contribuído, para a produção do acidente de viação em questão.

    Na verdade, com referência ao desenho esboçado pelo A., nada resultou apurado quando à(s) causa(s) que contribui(ram) ou gerou(aram) a perda de controlo da motorizada por parte do C… e consequente acidente, inexistindo qualquer ligação entre as condições da via e o despiste mormente a existência de areia no pavimento, tanto mais que a perda de controlo do aludido veículo se pode dever a múltiplas e variadíssimas causas que não a situação do piso ou a sinalização.

    Todavia, tal não basta já que o A. não logrou provar que o embate e seus correspectivos danos tenham sido provocados, gerados, em termos causais, pelas condições da via e da sua sinalização.

    O A. não logrou provar os factos que servem de base ao funcionamento da presunção de culpa, ou seja, da ocorrência do facto (positivo ou omissivo) causador dos danos o facto causal ilícito, assumindo-se este, neste contexto, como o elemento desencadeador da operacionalidade da presunção de culpa.” 4.º É certo que não foi feita prova das circunstâncias causais em que ocorreu e que motivaram o acidente.

    A tese do recorrente não pode merecer acolhimento ao convocar a presença da areia para tal, desde logo porque perdeu o controlo do veículo motorizado depois de descrever uma curva. A areia estava localizada na curva que antecede o local do sinistro (cf. 2.1 e 2.9) O recorrente perdeu o controlo do veículo motorizado “depois de descrever uma curva antecedida por uma outra (contracurva) onde estava localizada a areia, isto é depois de passar pela curva com areia.

    Sobre esta circunstância nada ficou provado em termos de indução do sinistro.

    A perda de controlo do veículo motorizado na ausência de melhor prova, pode ter sido motivada por um infindável número de circunstâncias, que destacamos por hipótese: velocidade excessiva; falta de destreza e domínio na condução, erro de manobra falta de equilíbrio, perda de equilíbrio provocado por desatenção, perda de consciência adormecimento, etc.

  3. O recorrente não demonstrou ao tribunal que a perda de controlo do veículo foi devida à existência de, qualquer obstáculo na via.

  4. Não tendo feito tal prova, não tem sentido algum imputar, também, o sinistro à falta de sinalização.

    Mas que sinalização é que é devida colocar num caminho estreito, apertado que não passa da antiga cangosta melhorada, pela colocação de um pavimento alcatroado, destinado para acesso às propriedades rústicas agrícolas e florestais e demais trânsito rural. Caminho no qual de um momento para outro podem encontrar-se diferentes situações do estado do pavimento.

    Qualquer sinalização permanente colocada num caminho com as características da dos autos não tem qualquer pertinência e utilidade. Um caminho vicinal pelas suas características naturais não revela quaisquer circunstâncias que motivam acidentes. O condutor de qualquer veículo ao circular num desses caminhos muito bem se apercebe das limitações dessa via e tem de tomar especiais cuidados em termos de velocidade para não colidir com outros veículos de tracção animal e outros de serviço agrícola, máquinas agrícolas, etc, e com os animais em trânsito para os campos e montes. Qualquer sinal que aí se coloque, pelas dimensões mínimas legais, constitui-se isso sim como um elemento susceptível de incómodo pelo espaço que ocupa.

  5. A matéria assente constante da alínea b), fls. 115, consubstancia no facto de o menor após o despiste ter embatido contra uma das pedras situadas na berma da estrada, a última, tem de ser interpretada com o auxilio dos documentos fotográficos que revelam uma quase inexistência de berma e, que não existe no local nenhuma pedra que constitua obstáculo imprevisto. A pedra que se refere como sendo a última, é efectivamente a última de um conjunto alinhado solto que separa o caminho da bouça que o ladeia. Não existe aí nenhum obstáculo à circulação, nem os autos o referem como tal, no sentido de permanência da pedra abandonada ou em local impróprio.

  6. O recorrente efectivamente goza da presunção de culpa, nos termos do artº 493, n° 1, C C impende sobre o recorrido, mas para que a efective em concreto carece de...

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