Acórdão nº 02090/06.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelDrº Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Data da Resolução25 de Outubro de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “MUNICÍPIO DO PORTO”, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, datada de 13.10.2008, que julgou procedente a acção administrativa comum, sob forma sumária, que contra o mesmo havia sido instaurada por “T…, LDA.” e que o condenou no pagamento a esta da “... quantia de 6708,85€ (seis mil setecentos e oito euros e oitenta e cinco cêntimos), correspondendo 5044,85€ à reparação do veículo automóvel e 1664,00€ à reparação do muro e vedação, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados da citação e até integral pagamento ...

”.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 198 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões: “...

1 - Os factos dados como provados, salvo o devido respeito, por si só seriam suficientes em nosso entendimento para que se tivesse julgado de forma diferente, isto é deveriam ter conduzido à absolvição da ora recorrente.

2 - O que em face dos documentos e depoimentos prestados em audiência de julgamento, nos parece que a sentença ora posta em crise padece de erro na apreciação das provas.

3 - A matéria de facto assente permite concluir que o ora recorrente deu, efectivamente cumprimento ao citado dever legal e por outro lado, mostra-se que circunstâncias de força maior determinaram a queda da aludida árvore.

4 - A árvore caiu sem intervenção de terceiro, considerando tratar-se de uma árvore de grande porte, em bom estado fito - sanitário visível por fora e após corte do lenho da mesma, tal facto só pôde ser resultado da violência das condições atmosféricas que se fizeram sentir naquele dia.

5 - Ainda que a árvore fosse vigiada e fiscalizada semanalmente nada faria impedir a queda da mesma, considerando as circunstâncias em que tal facto ocorreu.

6 - O aqui recorrente demonstrou que os seus serviços se encontram devidamente organizados e que fiscaliza, com diligência, regular e sistematicamente o seu parque arbóreo, ou seja, demonstrou que a sua conduta não se situava abaixo do nível médio de funcionamento que lhe era exigível.

7 - O recorrente demonstrou que actuou como seria licito esperar, no caso, no exercício das suas funções, e que nada mais estaria ao seu alcance para evitar a queda da referida árvore.

8 - Não se mostram verificados nos presentes autos todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público por actos ilícitos e culposos ...

”.

Conclui no sentido de que deve dar-se provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a decisão recorrida, absolvendo-o totalmente do pedido.

A A., ora recorrida, apresentou requerimento (cfr. fls. 222), no qual concluiu pela manutenção do julgado sem formular quaisquer conclusões.

O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA não emitiu qualquer pronúncia (cfr. fls. 236 e segs.).

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. J.C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 9.ª edição, págs. 453 e segs.; M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa”, in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71).

    As questões suscitadas reconduzem-se, em suma, em determinar se ocorreu ou não violação dos arts. 483.º, 486.º e 493.º do CC por parte da decisão jurisdicional objecto de impugnação quando esta julgou procedente a acção administrativa comum, sob forma sumária, em presença e condenou o aqui recorrente no pagamento de indemnização emergente de responsabilidade civil extracontratual [cfr. alegações e conclusões de recurso supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Da decisão recorrida resultaram provados os seguintes factos: I) A A. é dona e legítima possuidora do veículo automóvel da marca “Nissan” Pick Up, com a matrícula …NP.

    II) No dia 20 de Outubro de 2004 a A. viu-se confrontada com a queda de uma árvore de grande porte em cima do seu veículo.

    III) Naquele momento a viatura encontrava-se estacionada no parque de estacionamento propriedade da A., sito na Rua …, na cidade do Porto.

    IV) A árvore estava plantada na via pública, junto ao referido parque de estacionamento propriedade da A..

    1. A queda da árvore provocou o esmagamento parcial da viatura em referência e de várias outras que se encontravam junto, bem como o derrube do muro das suas instalações e vedação metálica.

      VI) Em 22.11.2004, o Instituto da Meteorologia emitiu a certidão junta aos autos a fls. 41, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

      VII) Entre a “I…, SA” e o R. foi celebrado o contrato de seguro titulado pela apólice n.º RC54188385.

      VIII) De acordo com as condições particulares da apólice, em vigor na data do sinistro, ficou a cargo do R. uma franquia de 1.000,00€, por sinistro, no caso de queda de árvores.

      IX) A A. não podia imaginar que a árvore haveria de se abater sobre o seu veículo e sobre o seu muro.

    2. Sendo impossível para a A. prever a perigosidade existente.

      XI) A queda da árvore provou danos no veículo automóvel da marca “Nissan” Pick Up, com a matrícula …NP no montante de 5.044,85€ (cinco mil e quarenta e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos).

      XII) Tendo provocado o derrube do muro e vedação metálica das instalações da A., provocando-lhe um prejuízo no montante de 1,664.00€, valor sem IVA.

      XIII) No dia 20 de Outubro de 2004, no Porto, soprou vento forte tendo sido atingidos pontualmente valores superiores a 100Km/h.

      XIV) Sendo que, a árvore em apreço é de grande porte - “Populos sp”, e conhecida como Choupo - tendo atingido quatro viaturas, entre elas a da A..

      XV) Em deslocação ao local, os técnicos do R., afectos ao Departamento Municipal de Espaços Verdes e Higiene Pública, constataram que a árvore em causa apresentava um bom desenvolvimento vegetativo, sem qualquer sinal de exterior de problemas sanitários.

      XVI) Tendo-se confirmado, aquando a sua remoção do local, que o lenho da árvore se apresentava em boas condições.

      XVII) O R., dispõe de funcionários e técnicos habilitados - engenheiros técnicos agrários entre outros - que verificam regularmente a saúde das árvores, avaliam a existência de doenças e determinam a limpeza ou poda das árvores.

      XVIII) E, para além disso inspeccionam de forma regular e sistemática as espécies arbóreas existentes no Concelho.

      XIX) A A. mandou reparar a veículo automóvel da marca “Nissan” Pick Up, com a matrícula …NP bem assim como o muro das instalações e vedação metálica.

      *Não resultaram provados os seguintes factos: XX) Que, no caso em apreço, e como é habitual, verificou-se por parte dos técnicos adequada e continuada fiscalização das condições de implantação, desenvolvimento e estado fitossanitário da árvore cuja queda provocou danos à A..

      XXI) Que, só por força das anormais condições meteorológicas o acidente ocorreu.

      3.2.

      DE DIREITO Assente a factualidade apurada que não se mostra, aliás, posta em causa devida e correctamente (cfr. arts. 690.º e 690.º-A do CPC “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA) cumpre, agora, entrar na análise das questões suscitadas para se concluir pela procedência ou improcedência da argumentação desenvolvida pelo recorrente no recurso jurisdicional “sub judice”.

      *3.2.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA O TAF do Porto em apreciação da pretensão deduzida pela A., ora recorrida, na acção administrativa comum em presença veio concluir, em 13.10.2008, no sentido de que, “in casu” e nos termos, nomeadamente, dos arts. 06.º do DL n.º 48051, 493.º. n.º 1 do CC, estavam preenchidos todos os pressupostos de responsabilidade civil extracontratual e como tal condenou o R. no pagamento de indemnização nos termos supra referidos.

      *3.2.2. DA TESE DO RECORRENTE Argumenta o mesmo que a decisão judicial em crise fez errado julgamento de facto e de direito já que, no caso, não estariam reunidos aqueles requisitos, visto haver empreendido todas as acções necessárias para a fiscalização e conservação do património arbóreo e o acidente dever ser considerado como devido a circunstâncias de força maior (forte temporal que se abateu no dia), pelo que o pedido indemnizatório formulado nos autos deveria ter sido julgado improcedente e o mesmo absolvido totalmente do pedido.

      *3.2.3. DO MÉRITO DO RECURSO Decorre do art. 22.º da CRP que o “… Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem”.

      A disciplina em sede de lei ordinária do regime da...

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