Acórdão nº 05498/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Outubro de 2009
Data | 09 Outubro 2009 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1998_02 |
P..., com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. O Recorrente desempenhava funções de assessor desde 2002; 2. Essas funções eram prestadas de forma remunerada, em regime de prestação de serviços (recibo verde); 3. Em Março de 2009, por recomendação da Câmara Municipal de Sintra, foi celebrado contrato com uma sociedade pertencente ao Recorrente; 4. Essa formalização contratual não se traduziu cm qualquer alteração das funções que o Recorrente vinha desempenhando desde 2002 nem em qualquer alteração na remuneração; 5. Constituiu uma forma de ultrapassar a dificuldade de se continuar a emitir recibos verdes; 6. A isenção e independência que o Recorrente tinha, passando recibos verdes, não é diferente da que tem, sendo o contrato celebrado com uma sociedade de que é proprietário; 7. A assembleia municipal tem competência diminuta, estando o poder executivo na câmara; 8. O Recorrente não tem quaisquer possibilidades de influenciar a vontade negocial da Câmara, no que respeita ao contrato celebrado; 9. A inelegibilidade prevista no art° 7°, n°2, alínea c) da Lei n° 1/2001 traduz-se numa restrição do direito do cidadão participar na vida política e aceder aos cargos públicos, direitos fundamentais que, nos termos do art° 18º nº 2 da CRP só podem ser restringidos na medida do necessário à salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos; 10. Pelo que essa inelegibilidade só ocorre quando, no caso concreto, existe o perigo de atentar contra as garantias de isenção e imparcialidade, por o titular do cargo poder, de alguma forma, influenciar a contraparte em qualquer decisão com repercussão no contrato em execução; 11. No caso em análise não existe essa possibilidade; 12. Pelo que não existe inelegibilidade; 13. A douta sentença recorrida violou, assim, a norma do art° 7°,n°2,alínea c) da Lei n° 1/2001, a as normas constitucionais que consagram os direitos de participação na vida política (art° 18°,n°2, da CRP); 14. Impunha-se a produção de prova testemunhal sobre a matéria alegada na contestação, para comprovação dos factos alegados, de forma a determinar se houve ou não culpa (caso se perfilhe o entendimento da primeira instância sobre a inelegibilidade), pelo que violou as normas dos artigos 513° e 515° do CPC; 15. Não havendo culpa, não se podia aplicar a sanção, pelo que a sentença violou o art°10ºdaLei n°27/96; 16. Bem como os princípios da proporcionalidade, consagrados constitucionalmente; 17. Pelo que deve ser revogada, anulando-se, assim, a decisão que determinou a perda de mandato.
* O Recorrido contra-alegou, concluindo como segue: 1. Por força da aplicação conjugada dos artigos, 41°, da Lei n° 169/99, de 18 de Setembro, 7°, 2, c), da Lei Orgânica n° 1/2001, de 14 de Agosto e 8°, 1, b), da Lei n° 27/96, de 01 de Agosto, os membros dos corpos sociais e os gerentes de sociedades, bem como os proprietários de empresas que pertençam aos órgãos das autarquias locais, durante o mandato, não podem celebrar contrato com a autarquia onde exercem funções sob pena de perda de mandato.
-
A actuação do demandado, que, fazendo parte da Assembleia Municipal de Sintra, na qualidade de sócio gerente da sociedade por quotas "Xelentenota -Comunicação, Unipessoal, Lda", celebra com a Câmara Municipal de Sintra um contrato de prestação de serviços, é determinante da perda de mandato, nos termos do disposto no citado art. 8°, n° 1, al. b), da Lei n° 27/96, de 1 de Agosto.
-
Com efeito nos termos do art. 41°, da Lei n° 169/99, de 18 de Setembro (que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias) "a assembleia municipal é o órgão deliberativo do município".
-
E, nos termos da al. c), do n° 2 do art. 7° da Lei Orgânica n° 1/2001, de 14 de Agosto não são elegíveis para os órgãos das autarquias locais onde exercem funções ou jurisdição "os membros dos corpos sociais e os gerentes de sociedades, bem como os proprietários de empresas que tenham contrato com a autarquia não integralmente cumprido ou de execução continuada".
-
Também nos termos do art. 8°, n° 1, al. b), da Lei n° 27/96, de 01 de Agosto, incorrem em perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos ou das entidades equiparadas que "após a eleição, sejam colocados em situação que os torne inelegíveis" 6. A Constituição da República Portuguesa consagra, no seu art. 50°, o "Direito de acesso a cargos públicos", estipulando no n° 3 que "no acesso a cargos electivos a lei só pode estabelecer as inelegibilidades necessárias para garantir a liberdade de escolha dos eleitores e a isenção e independência do exercício dos respectivos cargos " (sublinhado nosso).
-
Em concretização daquela norma constitucional veio o legislador ordinário através da citada Lei Orgânica n° 1/2001, de 14/08, estabelecer inelegibilidades gerais e especiais, respectivamente, nos seus arts. 6° e 7°.
-
Ora, a existência de um regime de inelegibilidade visa assegurar garantias de dignidade e genuinidade ao acto eleitoral e, simultaneamente, evitar a eleição de quem, pelas funções que exerce, se entende que não deve ou não pode representar um órgão autárquico.
-
Assim, tem sido jurisprudência uniforme do Tribunal Constitucional, quer no âmbito da actual Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais - LEOAL, quer da anterior (DL 701-B/76, de 29/09) que o regime de inelegibilidade previsto nos n°s. 1 e 2 do art. 7° da LEOAL, visa garantir a dignificação e a genuidade do acto eleitoral bem como garantir a isenção e a independência com que os titulares dos órgãos autárquicos devem exercer os seus cargos e, assim, gerir os negócios públicos estando em causa "(...) o exercício isento, desinteressado e imparcial dos cargos autárquicos (...)" - cfr entre outros, Acs. T. Constitucional n° 495/01, de 20/11/2001, n° 505/01, de 21/11/2001, n° 510/01, de 26/11/2001, n° 511/01, de 26/11/2001, n°, 515/01, de 26/11/2001 e n° 516/01, de 28/11/2001 in www.tribunalconstitucional.pt e no âmbito da anterior da lei, entre muitos outros, Ac. T. Constitucional 717/93, publicado in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 26°, págs. 407 e ss.
-
Pretende-se, em suma, proteger a independência das funções e, ao mesmo tempo, manter na acção administrativa a moralidade, objectividade e serenidade que lhe deva imprimir o cariz indiscutível do interesse geral afastando-se do exercício de um determinado cargo, quem o não possa desempenhar com as necessárias liberdade e independência, comprometendo o prestígio do órgão respectivo.
-
Ora, é patente o antagonismo de situações existentes entre um membro de um órgão autárquico proprietário de uma empresa e o próprio órgão em caso de contratação sendo que tal divergência é inequívoca em contratos ainda não integralmente cumpridos ou de execução continuada como sucede com os...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO