Acórdão nº 0635/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Julho de 2009

Data08 Julho 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I.RELATÓRIO A..., advogado, com os restantes sinais dos autos, recorre da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF), que negou provimento ao recurso contencioso de anulação que ali instaurou contra o Conselho Superior da Ordem dos Advogados (AR), em que pediu a anulação da deliberação deste Conselho, com data de 03-05-2002, através da qual foi confirmada a decisão do Conselho Deontológico da Delegação do Porto da Ordem dos Advogados que, em sede de processo disciplinar, aplicou ao ora recorrente a pena de suspensão do exercício de profissão por 4 anos com publicidade.

Rematou a sua alegação de recurso com as seguintes CONCLUSÕES: "A. A sentença recorrida é nula por carência de fundamentação no que diz respeito a ter decidido não existir no acto recorrido vício de lei por erro de julgamento da matéria de facto da causa disciplinar; B. Utilizou o argumento não porque não, tautológico e sobretudo vazio que não pode deixar de ser equiparado à carência das justificações que no entanto a lei exige para as decisões judiciais; C. De qualquer modo, a matéria que consta do processo, nomeadamente de documentos subscritos pelo queixoso, não demonstra a tese da acusação disciplinar, mas é bastante para sustentar o ponto de vista da defesa no sentido de o arguido ter agido apenas no interesse da sua constituinte, cujo ponto de vista era contraditório e adverso do da queixa; D. Depois, o recorrente devia ter sido ouvido antes do fecho do acto recorrido, para encerramento do contraditório, à semelhança do procedimento penal antes da sentença e não o foi; E. Foi cometida por conseguinte a nulidade procedimental de carência de audição completa do visado, infringidos os arts 100º e segs do CPA; F. Ao não a ter declarado, a sentença recorrida infringiu a citada disposição legal.

  1. Para além do mais o procedimento disciplinar tinha já prescrito e o acto recorrido padece de vício de lei por não ter reconhecido esta causa de extinção da lide: devem contar-se 3 ou 5 anos, no máximo, visto neste ultimo caso, o disposto no art. 118° 12 do C. Penal.

  2. Depois, sendo o procedimento disciplinar oficioso, a identidade de sujeitos que importa considerar para a preclusão não é a dos queixosos, porque o autor é sempre e só a OA.

    1. Ora, a identidade do objecto e do arguido são aqui inquestionáveis.

  3. Portanto, a sentença da 1ª Instância, ao ter considerado não ter ocorrido a prescrição nem a preclusão do procedimento disciplinar, fez errada aplicação da lei, a qual, pelo contrário, marca vício de infracção legal ao acto recorrido.

  4. Enfim, o acto recorrido deve ser anulado pela ocorrência de todos os vícios de lei que o recorrente lhe opôs e persiste em opor-lhe.

    [L. Um entendimento do acto normativo constituído pelos arts. 3°/g), 43/1/a], 54°/a], 109º/1, 110º e 111º/1 EOA, no sentido de permitir aos órgãos disciplinares da AO um juízo penal - ferramenta, torna-o inconstitucional, por contrariar o art. 32º/2 da CRP] Conclusão para prevenir recurso para o Tribunal Constitucional.".

    A AR contra-alegou, sem apresentar conclusões, sustentando a bondade da sentença.

    O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte Parecer: "Vem o presente recurso jurisdicional interposto da sentença do TAF do Porto que negou provimento ao recurso contencioso, de anulação da deliberação do Conselho Superior da Ordem dos Advogados que confirmou a decisão do Conselho Deontológico do Porto da Ordem dos Advogados de, em sede de processo disciplinar, aplicar a A..., a pena de suspensão do exercício de profissão por 4 anos com publicidade.

    O recorrente jurisdicional alega, em síntese, que a sentença recorrida: - padece de nulidade, por carência de fundamentação; - violou o art. 100º do CPA, ao não ter anulado o acto impugnado, por procedência do vício de omissão da audiência do interessado; - fez errada aplicação do direito ao considerar não ter ocorrido a prescrição, nem a preclusão do procedimento disciplinar.

    Quanto à arguida nulidade de sentença, é sabido que a causa de nulidade prevista na al. b), do n° 1, do art. 668°, do CPC, falta de especificação dos fundamentos da decisão, ocorre quando haja ausência absoluta de motivação, ou seja, total omissão dos fundamentos de facto e de direito em que a decisão assenta.

    Assim e acompanhando a argumentação expendida pelo Mmo. Juiz "a quo" no despacho de fls. 299, creio não se verificar a arguida nulidade.

    Por sua vez, quanto à alegada violação do art. 100º do CPA, importa sublinhar, como aliás sustenta a sentença recorrida, que o processo disciplinar tem normas específicas, pelo que, a audiência do arguido em sede deste procedimento não corresponde exactamente à audiência prévia prevista nos arts. 100° e segs. do CPA. Efectivamente, o direito de audiência nos processos sancionatórios é um elemento que integra o próprio direito de defesa, não se limitando a possibilitar a participação do interessado no procedimento.

    Na verdade, o conteúdo dos direitos de audiência e de defesa, garantidos constitucionalmente no art. 32°, n° 10, da CRP, consiste em conhecer os factos individualizados no tempo e no espaço, bem como as normas jurídicas que conferem a tais factos a qualidade de ilícitos disciplinares.

    Resulta do probatório fixado, que o ora recorrente foi notificado da instauração do processo disciplinar e depois, da acusação, bem como do prazo de 20 dias para apresentar por escrito a sua defesa, indicar prova testemunhal e documental. Como tal, no processo disciplinar em causa foi garantido o direito de audiência e de defesa constitucionalmente consagrado, não se verificando preterição de formalidade essencial, improcedendo a alegada violação do art. 100° do CPA.

    Por fim, a meu ver, bem andou também a sentença recorrida ao considerar que o procedimento disciplinar não se encontra prescrito e que não se verifica preclusão do poder disciplinar.

    Isto porque, tratando-se de infracção disciplinar que seja simultaneamente infracção criminal, como é o caso, aplica-se o prazo da prescrição estabelecido no C. Penal para a prescrição do procedimento disciplinar, quando aquele for superior (art. 99° do Estatuto da Ordem dos Advogados).

    Assim, na situação em apreço, o prazo de prescrição do procedimento disciplinar não é de 3 anos, mas de 10 anos, por força do disposto nos arts, 117°, n° 1, al. b), do CP/82 e 118°, n° 1, al. b), do CP/95, com referência ao artº 300°, n°s. 1 e 2, al b), do CP/82. Pelo que, não ocorreu a prescrição do procedimento disciplinar.

    E, não se verifica preclusão do poder disciplinar, uma vez que, citando a sentença, . . . "a realidade apreciada no processo disciplinar tem outro enquadramento, outra contextualização que não foi considerada no processo de inquérito...".

    Do exposto, sou de parecer que o presente recurso jurisdicional não merece provimento".

    Foram colhidos os vistos da lei.

    II.FUNDAMENTAÇÃO A sentença decidiu com base na seguinte MATÉRIA DE FACTO: 1. Em 27-04-1999 deu entrada no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados requerimento subscrito por B... que consta de fls. 3 do PA apenso relativo ao Processo Disciplinar n° ... e cujo teor aqui se dá por reproduzido, 2. Na sequência daquele requerimento foi deliberado na sessão Conselho Distrital de 22-10-99 mandar instaurar procedimento disciplinar contra o aqui recorrente, tendo o mesmo sido notificado em conformidade, através do ofício n.° 472/99, de 02/11/1999, do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados (fls.11 e 10 do PA apenso relativo ao Processo Disciplinar n° ... e cujo teor aqui se dá por reproduzido).

    1. Após autuação e distribuição, coube o n° ... ao aludido procedimento disciplinar, tendo o então relator do mesmo ordenado a notificação do Participante para, em dez dias, juntar documentos relativos à Acção cível que intentou contra o Sr. Advogado arguido, designadamente petição inicial, contestação e termo de transacção; documentos comprovativos da delapidação de património pelo arguido, ou de prática de actos pretensamente simulados, tendo em vista dificultar ou impedir a satisfação dos interesses dos seus credores; a identificação das testemunhas a inquirir (fls. 13 e 14 do PA apenso relativo ao Processo Disciplinar n° ... e cujo teor aqui se dá por reproduzido).

    2. Nesta sequência, o Participante juntou os elementos documentais que constam de fls. 17 a 33 do PA apenso relativo ao Processo Disciplinar n° ... e indicou duas testemunhas que foram inquiridas tal como resulta dos Autos de Inquirição que constam de fls. 36 e 37 do PA apenso relativo ao Processo Disciplinar n° ....

    3. Em seguida, o relator do Proc. Disciplinar n° ... proferiu acusação em 04-02-2000 contra o ora recorrente, imputando-lhe a violação do disposto nos arts, 76° n°s 1 e 3, 83° n° 1 als. d), g) e h) todos do E.O.A., na redacção então em vigor, ou seja, antes das alterações nele introduzidas pelas Leis n.°s 30-E/2000, de 20 de Dezembro e 80/2001, de 20 de Julho, aí se aludindo aos seguintes factos praticados pelo ora recorrente: - foi incumbido pelo Sr. Eng. B... de proceder a regularização de uma dívida fiscal de um empreiteiro e promotor imobiliário, a fim de garantir o levantamento do arresto incidente sobre um prédio, cujas fracções estavam prometidas vender ao participante e outros compradores.

      - para tal efeito, recebeu do participante e aqueles outros compradores a quantia de esc 22.234.000$00, os quais se destinavam justamente ao pagamento do que era devido à Fazenda Nacional.

      - o sr advogado arguido não liquidou à Fazenda Nacional a referida quantia, como a não devolveu ao participante e demais compradores.

      - esse seu comportamento levou a que o Eng. B... tivesse intentado contra ele acção cível, pedindo aí a si condenação no pagamento da quantia acima, referida.

      - nessa acção judicial, foi outorgado termo de transacção, através do qual o sr. advogado aqui arguido se obrigou a participar a...

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