Acórdão nº 08B3202 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução18 de Junho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e mulher, BB, instauraram uma acção contra CC e mulher, DD, pedindo que fosse declarada nula, por ser simulada, "a cláusula respeitante ao preço constante da escritura pública de compra e venda" do prédio rústico identificado nos autos, celebrada em 12 de Dezembro de 2002 (€ 25.000,00, sendo que o preço realmente acordado foi de 20.000.000$00), e que os réus fossem consequentemente condenados a pagar-lhes € 61.965,32, acrescida de juros sobre € 59.783,62, até integral pagamento.

Os réus contestaram, por impugnação, e deduziram pedido reconvencional.

Alegaram, em síntese: só terem comprado o prédio por estarem convencidos, com base em "documentos que os AA lhes facultaram, que se tratava de prédio misto, com parte rústica com anexos para habitação e com uma área urbana para construção de 0,0720 ha"; que nele pretendiam instalar o seu negócio e a sua residência, construindo uma vivenda na parte urbana; que o preço de 20.000.000$00 foi acordado nesse pressuposto, incluindo a legalização dos anexos existentes; que os autores actuaram com reserva mental e com dolo, sendo o negócio "manifestamente usurário em prejuízo dos RR"; que "o prédio em causa, apenas rústico e exclusivamente ‘para cultura hortícola', vale apenas o preço que consta da escritura"; que há manifesto enriquecimento sem causa dos autores, à sua custa; que o negócio é anulável, mas que a anulabilidade apenas afecta o preço; que a correspondente cláusula é usurária.

Assim, pediram: que fosse decretada "a anulação parcial com redução na cláusula do preço (...) para 25.000 euros"; que os réus fossem condenados a devolver-lhes a diferença entre o que pagaram e o preço reduzido (€ 21.224,76), acrescida de juros, vencidos desde a escritura e vincendos; que fossem "considerados nulos e sem efeito os cheques emitidos pelo RR" para além do valor devido; e que os autores fossem condenados como litigantes de má fé, "em multa e indemnização a favor dos RR, que inclua todas as despesas que os RR venham a efectuar e inclua uma indemnização não inferior a 2.000 Euros".

Os autores replicaram, sustentando a improcedência da reconvenção, e houve tréplica, na qual os réus aumentaram para € 4.500,00 o pedido de indemnização por litigância de má fé.

Por sentença de fls. 272, foi decidido: - Julgar a acção parcialmente procedente, sendo declarada a nulidade da cláusula de preço, por ser simulada, mas "sendo a compra e venda do imóvel válida, incluindo a cláusula do preço real pelo montante de 99.759,58€."; - Julgar a reconvenção também parcialmente procedente, anulando-se "parcialmente a (...) escritura pública, com redução na cláusula de preço, alterando-se este para o montante que se vier a apurar no que se liquidar em execução de sentença, segundo o valor de mercado do prédio rústico em questão"; - Julgar que a apreciação dos pedidos de devolução da diferença entre o que os réus pagaram e o preço reduzido (€ 21.224,76) e de "serem considerados nulos e sem efeito os cheques emitidos pelo RR" para além do valor devido, "sucederá dependendo do que se liquidar em execução de sentença na determinação do preço do negócio de compra e venda"; - Condenar os autores, como litigantes de má, em 4 ucs de multa; - Determinar a notificação dos réus para "juntarem aos autos prova que comprove as despesas por eles efectuadas em consequência da litigância de má fé dos autores".

  1. Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de fls. 509, foi parcialmente julgado procedente o recurso interposto pelos autores, mas apenas quanto à impugnação do ponto 4 da matéria de facto; quanto ao mais, foi confirmada a sentença.

    Os autores recorreram para o Supremo Tribunal da Justiça; o recurso foi recebido como revista, com efeito meramente devolutivo.

    Tendo entretanto falecido AA, foram habilitados como herdeiros a autora BB, na qualidade de cônjuge, e os filhos EE e FF (decisão de fls. 37 do apenso 1).

    Nas alegações que apresentou, BB formulou as seguintes conclusões: 1ª - A douta sentença que julgou a reconvenção parcialmente procedente, com redução na cláusula do preço, e que veio a ser parcialmente confirmada pelo Venerando Tribunal da Relação, não aplicou o direito aos factos provados.

    1. Os RR. negociaram a compra e prometeram comprar em 21.10.2001. o prédio rústico com as c1áusulas constantes do contrato promessa outorgado, para criação, ensino, guarda e manutenção de cães, pelo preço de € 99.759,58 (factos provados no ponto 29).

    2. Esta foi a motivação que levou os RR. a interessar-se pelo prédio e a tomar a decisão volitiva de fazer o negócio, sendo que em 21.10.2001. tinham habitação própria onde residiam. (factos provados ponto 28) 4ª Não tendo sido sequer alegado ou provado, que os RR. na data da outorga do contrato promessa de compra e venda ou depois tivessem transmitido aos AA. que pretendiam o prédio para sua habitação.

    3. Não resultou provado que antes da outorga do contrato promessa de compra e venda a EE terá referido aos RR. que podiam para além de lá instalar os cães e usarem os anexos já existentes e que estavam apenas a ser legalizados, a área urbana do prédio, também em processo de legalização, também podiam construir uma habitação, pelo que não é legitimo concluir que os AA. ocultaram factos ou transmitiram declarações que não correspondiam à realidade com o intuito de enganar e de determinar a declaração negocial dos RR. induzindo-os em erro.

    4. O acórdão ao considerar que os A. agiram com dolo, interpretou e aplicou erradamente o disposto nos atºs 253 e 254º do Código Civil.

    5. Ao considerar que os RR. negociaram em erro, o Meritíssimo juiz interpretou e aplicou erradamente o artº 251 º do Código Civil.

    6. - A douta sentença que julgou a reconvenção parcialmente procedente, com redução na cláusula do preço, alterando-o para o montante que se vier a apurar no que se liquidar em execução de sentença segundo o valor de mercado do prédio rústico em questão, é nula nos termos dos do artº 661 º, nº 1 do C.P.C e artº 668º, nº 1 ai e) do C.P.C.

    7. - Com efeito o pedido dos RR. é a redução da cláusula do preço de € 99.759,58, para € 25.000,00 porque foi por aquele valor que liquidaram, na data da escritura, 12.12.2002, a SISA, e não porque o prédio sendo rústico tivesse aquele valor, não tendo pedido a redução para o valor de mercado atribuído ao prédio como rústico.

    8. - Ora, a sentença ao condenar nos termos em que o fez condena em pedido diferente nos termos supra expostos e em quantidade superior ao pedido se dos valores de mercado se apurar como valor do prédio, preço inferior a € 25.000,00. (decisão que seria mais favorável para os RR. do que o pedido por estes formulado), violando assim, o disposto nos artº 661º, nº 1 do C.P.C. e artº 668º, nº 1, aI. e) do C.PC.

      Quanto à litigância de má fé 11 ª - Os autores foram condenados como litigantes de má fé em virtude de terem alegado que apenas tinham recebido a quantia de 1.000.000$00 como reforço do sinal acordado no contrato promessa de compra e venda, quando segundo a douta sentença resulta dos factos provados que relativamente ao reforço do sinal receberam a quantia de 1.100.000$00.

    9. - Erro que formou a convicção na condenação dos AA. em 1 ª instância como litigantes de má fé e que já veio a ser conhecido pelo douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa não ter existido.

    10. - Foram igualmente condenados por...

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