Decisões Sumárias nº 186/09 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Maio de 2009
Magistrado Responsável | Cons. Mário Torres |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2009 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
DECISÃO SUMÁRIA N.º 186/2009
Processo n.º 325/09 2.ª Secção
Relator: Conselheiro Mário Torres
1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 19 de Março de 2009, que negou provimento ao recurso de revista por ela interposto contra o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 18 de Setembro de 2008, que, por seu turno, negara provimento à apelação deduzida contra a sentença da 17.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, de 28 de Maio de 2007, que julgou improcedente acção intentada contra o Instituto de Solidariedade e Segurança Social, visando a sua condenação no reconhecimento de que a autora, ora recorrente, era titular do direito às prestações e subsídio por morte de B., com quem vivia em união de facto há mais de dois anos antes do seu falecimento, e no pagamento das prestações por morte desde o óbito e das despesas de funeral.
De acordo com o requerimento de interposição de recurso, a recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade material dos artigos 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, 3.º do Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, e 3.º, alíneas e), f) e g), e 6.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, por violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, nos termos das disposições combinadas dos artigos 2.º, 13.º, 18.º, n.º 2, 36.º, n.º 1, e 63.º, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa.
2. A recorrente sintetizou o aduzido nas alegações do recurso de revista nas seguintes conclusões:
a) A autora viveu desde Julho de 1985 em união de facto com B., solteiro e pensionista que era do CNP, reunindo, assim, os requisitos necessários a beneficiar do direito de atribuição de pensão de sobrevivência prevista no Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, porquanto não é exigível que alegue e demonstre a necessidade de alimentos e/ou a insuficiência dos bens da herança do falecido;
b) Efectivamente, ao estatuir que beneficiará dos direitos estipulados nas alíneas e), f) e g) do artigo 3.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, no caso de uniões de facto previstas nesse diploma, quem reunir as condições constantes do artigo 2020.º do Código Civil, decorrendo a acção perante os tribunais cíveis, o respectivo artigo 6.º, através de tal previsão (e não estatuição), apenas está a exigir que esteja preenchida a condição de união de facto e não também a necessidade de alimentos ou a insuficiência dos bens da herança do beneficiário da segurança social;
c) A distinção operada pela Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, em particular pelo seu artigo 6.º, veio autorizar e impor que, contrariamente ao que resultaria dos artigos 7.º do Decreto-Lei n.º 322/90 e 3.º do Decreto Regulamentar n.º 1/94, que, no caso de pedido de condenação em prestação alimentar e de declaração de que quem vivia em união de facto com o beneficiário da segurança social é equiparado a seu cônjuge, se entenda o referido preceito como configurando o direito a uma prestação da segurança social e não já o reconhecimento duma obrigação alimentar;
d) Para ser considerada titular do direito às prestações por morte previstas no Decreto-Lei n.º 322/90 e no Decreto Regulamentar n.º 1/94, na sequência do falecimento do seu companheiro B., não tinha a autora que obter sentença judicial que lhe reconhecesse o direito a alimentos da respectiva herança;
e) Ainda que outra interpretação normativa pudesse ser dada aos artigos 3.º, alíneas e), f) e g), e 6.º da Lei n.º 7/2001, nomeadamente a de que se mantém a exigência de sentença judicial reconhecendo o direito a alimentos da herança, há que recusar a aplicação daqueles normativos, bem como do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, e do artigo 3.º do Decreto Regulamentar n.º 1/94, porque, nessa interpretação, estão afectados de inconstitucionalidade material;
f) Efectivamente, é materialmente inconstitucional a interpretação normativa dos artigos 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, e 3.º do Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, segundo a qual o direito à atribuição do subsídio por morte a quem conviva em união de facto há mais de dois anos com o beneficiário da segurança social falecido depende não apenas da prova dos requisitos de estabilidade da união de facto, mas também da demonstração, a efectuar no âmbito de acção movida contra a herança, nos termos dos artigos 2020.º e 2009.º do Código Civil;
g) Também uma interpretação normativa dos artigos 3.º, alíneas e), f) e g), e 6.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, em sentido semelhante, se deve ter como materialmente inconstitucional;
h) Tais vícios de inconstitucionalidade emergem da violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, nos termos das disposições combinadas dos artigos 2.º, 13.º, 18.º, n.º 2, 36.º, n.º 1, e 63.º, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República;
i) Não tendo perfilhado o sustentado pela autora nas alíneas anteriores, o acórdão recorrido fez errada interpretação e aplicação dos normativos ali invocados, aplicando disposições materialmente inconstitucionais;
j) Deverá, pois, ser concedido a revista ora pedida, por forma a que se interpretem as citadas normas no sentido aqui propugnado e/ou que se tenham por inconstitucionais os preceitos invocados, tudo com as legais consequências.
3. O acórdão ora recorrido, para negar a revista, desenvolveu a seguinte argumentação:
São, como é bem sabido, as conclusões da alegação do recorrente que delimitam o objecto do recurso artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.ºs 1 e 4, do CPC, bem como jurisprudência firme deste Supremo Tribunal.
Sendo, pois, as questões atrás enunciadas e que pela recorrente nos são colocadas que urge apreciar e decidir.
Podendo as mesmas resumir-se às seguintes:
a) a de saber se o direito às prestações sociais por morte do beneficiário, não casado ou separado judicialmente de pessoas e bens, por banda da pessoa que com ele vivera em união de facto, apenas depende da verificação dessa convivência por determinado lapso de tempo e não também da demonstração, não só da carência de alimentos, mas ainda da impossibilidade de os obter da herança do beneficiário da segurança social;
b) a de saber se, assim não se entendendo, interpretando-se os artigos 3.º, alíneas e), f) e g), e 6.º da Lei n.º 7/2001, no sentido da exigência de sentença judicial a reconhecer o direito de alimentos do companheiro do beneficiário falecido, se deve recusar a sua aplicação, bem como a do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90 e o artigo 3.º do Decreto Regulamentar n.º 1/94, por serem materialmente inconstitucionais.
Comecemos pela primeira:
O Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, veio dispor sobre a protecção por morte dos beneficiários abrangidos por regime de segurança social, determinando o n.º 1 do seu artigo 8.º que o direito às prestações nele mencionadas subsídio por morte e pensões de sobrevivência é extensível às pessoas que se encontrem na situação prevista no n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil.
Prescrevendo o Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, que, por imposição daquele diploma, veio regulamentar as situações de atribuição das aludidas prestações, que tem direito às mesmas a pessoa que, no momento da morte do beneficiário não casado ou separado judicialmente de pessoas e bens, vivia com ele há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, ficando a atribuição de tais prestações dependente de sentença judicial que lhes reconheça o direito a alimentos da herança do falecido nos termos do disposto no artigo 2020.º do Código Civil artigos 2.º e 3.º, n.º 1, do citado diploma legal.
Assim rezando este artigo 2020.º, no seu n.º 1, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de Novembro, garantindo uma protecção mínima ao companheiro sobrevivo:
«Aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, tem direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não puder obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009.º.»
Assim preceituando este artigo 2009.º, nas ditas alíneas, sobre as pessoas obrigadas a alimentos:
«1. Estão vinculados à prestação de alimentos pela ordem indicada:
a) O cônjuge ou o ex-cônjuge;
b) Os descendentes;
c) Os ascendentes;
d) Os irmãos;»
O que significa que, quando o já falado artigo 8.º atribui as questionadas prestações sociais a quem estiver nas condições do artigo 2020.º, está a condicionar o recurso a tais benefícios à alegação e prova dos requisitos que aí são mencionados.
Tendo, pois, de alegar e provar, para além de que o falecido não era casado, nem se encontrava separado de pessoas e bens, não só que com o mesmo vivia em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos, mas também que está carenciado de alimentos e impossibilitado de os mesmos lhe serem prestados, quer por parte dos familiares elencados no citado artigo 2009.º, alíneas a) a d), quer pela herança do de cujus.
O mesmo resultando do preceituado na Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio (artigos 1.º, 3.º, alínea e), e 6.º), que, revogando a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto, igualmente adoptou medidas de protecção da união de facto.
Dizendo-se expressamente neste mesmo artigo 6.º, sob a epígrafe «Regime de acesso às prestações por morte»:
«1 Beneficia dos direitos estipulados nas alíneas e), f) e g) do artigo 3.º, no caso de uniões de facto previstas na presente lei, quem reunir as condições constantes do artigo 2020.º do Código Civil, decorrendo a acção perante os tribunais civis.
2. Em caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança ou nos casos referidos no...
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