Acórdão nº 08S2315 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Maio de 2009
Magistrado Responsável | MÁRIO PEREIRA |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - O autor AA instaurou a presente acção emergente de contrato individual de trabalho com processo comum, contra as rés: - BB, S.A., e, - C..& R..., Lda, terminando a sua petição inicial com o seguinte pedido: "Ser reconhecido como trabalhador efectivo da Ré BB, com efeitos reportados a 01/09/95, e a referida Ré condenada a integrá-lo nos seus efectivos sob a cominação de sanção pecuniária compulsória adequada, que se julga razoável, atendendo ao seu poderio financeiro, fixá-la em €: 2.000,00 por dia; e a Ré C..& R... condenada a reconhecer tal integração, sob igual cominação." Para tanto, alegou, em síntese: Trabalha ao serviço da Ré BB, desde 01-09-95, no seu estabelecimento industrial, sito nas Marinhas de D. Pedro, em Santa Iria da Azóia, sob a sua autoridade e direcção, embora contratado e cedido sucessivamente àquela, pelas empresas MTS, Lda., primeiro, Tempor - Cedência Temporária, Selecção e Formação de Trabalhadores, Lda., depois, e, por fim, C..& R..., Lda.; primeiro celebrou contratos verbais com a MTS e com a Tempor Lda, reduzindo-se a escrito o contrato celebrado com esta em 19-10-98, denominado "contrato de trabalho temporário" e renovado a partir de 01-03-99 até 31-12-99; ainda na vigência deste período contratual, apareceu em cena a 2.ª Ré, C..& R... que, em 01-10-99, celebrou com o autor um contrato de trabalho dito "a termo incerto"; desde a sua admissão, vem trabalhando por conta, sob a autoridade e a direcção da Ré BB, cedido embora, primeiro pela MTS, depois pela Tempor Lda. e por fim, pela Ré C...& R... Lda., cedência ocasional essa ilícita o que lhe conferiu o direito de optar pela integração no efectivo do pessoal da empresa cessionária, com efeitos reportados ao início da cedência (01.09.1995), de acordo com o disposto no n.° 1 do art. 30º da LTT, opção que exerceu através de cartas registadas que enviou às Rés em 19-09-2003.
A R. C..& R..., Lda. contestou, invocando que não é uma empresa de trabalho temporário, que o contrato de trabalho que celebrou com o autor é válido, que o autor nunca foi cedido à R. BB e esta nunca assumiu a posição de cessionária, em qualquer acordo ou contrato celebrado entre ambas e que é uma empresa prestadora de serviços na área da metalomecânica, sendo nessa veste que celebrou com a BB diversos contratos de prestação de serviço, pelo que o autor não tem direito a ser integrado no quadro de efectivos da ré BB, devendo a acção ser julgada improcedente.
A R. BB, S.A., na sua contestação, para além de excepcionar a ineptidão da petição inicial, impugnou os factos alegados pelo autor, invocando, em suma: que contratou com empresas especializadas a prestação dos serviços necessários à manutenção dos equipamentos existentes nas suas instalações industriais, o que naturalmente determina que fique a cargo de tais empresas a contratação e gestão dos recursos necessários ao cumprimento do contrato, incluindo os recursos humanos; que não é verdade que o autor exerça actividade sob a sua autoridade e direcção, pese embora seja exacto que trabalhe na manutenção dos seus equipamentos industriais desde 01-09-95, cumprindo o horário que é determinado pela 2.ª ré, recebendo ordens quanto às tarefas a executar dos responsáveis desta, que fiscalizam o cumprimento da sua actividade, o que não significa que não tenha pessoas, os seus supervisores, que, na sua organização, tratam de integrar o autor e de lhe dar orientações genéricas sobre aquilo que tem para fazer; que o autor nunca trabalhou sob a sua autoridade e direcção, não tem nenhum posto de trabalho, nem recebe quaisquer ordens dos seus supervisores, não exercendo sobre ele qualquer poder de autoridade e direcção próprios de uma entidade empregadora; que não há qualquer cedência do trabalhador, nem podia haver, como também o autor trabalha sob as ordens e direcção da co-ré; que o autor não tinha, assim, qualquer direito a optar pela integração nos seus quadros e daí que a declaração que emitiu tivesse sido liminarmente rejeitada.
O A. respondeu nos termos de fls. 78 e ss, defendendo a improcedência da excepção da ineptidão da petição inicial.
No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção dilatória deduzida.
Condensada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: "Julgo totalmente procedente por provada a presente acção e, em consequência:
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Condeno as sociedades Rés: BB, S.A., e C..& R..., Lda, a reconhecerem o A. AA, como trabalhador efectivo da Ré BB, com efeitos reportados a 01/09/95.
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Mais condeno a referida Ré BB, S.A. a integrá-lo nos seus efectivos de pessoal, e bem assim no pagamento da quantia diária de € 100,00 por cada dia de atraso, no cumprimento desta integração, a título de sanção pecuniária compulsória.
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Condeno igualmente a Ré: C..& R..., Lda a reconhecer tal integração, sob igual cominação, por cada dia de atraso de tal reconhecimento." A R. BB recorreu da sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa, vindo este pelo acórdão de fls. 382 e ss. a julgar improcedente o recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
II - Mais uma vez inconformada R. BB, recorreu de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as alegações que apresentou com as seguintes conclusões:
a) O Acórdão recorrido é nulo por não se ter pronunciado sobre questão de que devia tomar conhecimento; b) O Supremo Tribunal de Justiça pode exercer censura sobre o uso que a Relação fez dos poderes conferidos pelo artigo 712 do Cód. Processo Civil; pode ainda ordenar a modificação da matéria de facto se tanto se tornar necessário para uma perfeita decisão de direito; c) A decisão recorrida assentou, por um lado, numa deficiente fixação da matéria de facto e, por outro, na errada apreciação daqueles que foram dados por assentes; d) Os elementos fornecidos pelo processo impõem a alteração dos factos dados por assentes, designadamente as respostas dadas aos artigos 4º, 14°, 15° e 18° da Base Instrutória; e) Não existe, no caso em apreço, uma cedência de trabalhadores fora dos quadros legais; f) O A. desempenhou a sua actividade profissional de serralheiro mecânico nas instalações da recorrente, categoria profissional que a Olá não tem sequer no quadro de efectivos, e que não é indiciador de qualquer fraude; g) Todos os indícios que são normalmente apontados de subordinação jurídica acabam por corresponder a circunstâncias que estão sempre presentes na realidade subjacente à prestação de serviço que envolvem afectação de trabalhadores a um certo utilizador; h) O "outsourcing" é uma realidade da vida empresarial moderna, tem apoio legal, é indispensável para melhorar a eficiência e a qualidade e é gerador de emprego e de empresas; i) O A. tem, hoje em dia, contrato de trabalho sem termo com a 2ª R. C..& R..., Lda. que, por sua vez, continua a cumprir uma prestação de serviço com a recorrente; se há uma prestação de serviço tem que haver quem a cumpra; j) Não há subordinação jurídica do A. à recorrente; k) O A. não foi objecto de qualquer cedência ocasional e ilícita à recorrente e trabalha sob a autoridade e direcção da 2ª R. C..& R..., Lda.; l) o Acórdão recorrido ao confirmar a procedência da acção violou o disposto nos artigos 10° e 26° a 30° do Dec-Lei n° 358/89, de 17 de Outubro, 668°, n° 1 d) e 712° do Cód. Proc. Civil.
Sustenta, a final, a revogação do acórdão recorrido e a procedência do recurso.
O recorrido contra-alegou, pugnando pela improcedência da revista.
A Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu douto Parecer, não objecto de resposta das partes, no sentido de que a revista deve ser negada.
III - Colhidos os vistos, cumpre decidir.
As instâncias deram como provados os seguintes factos: 1.
Com data de 19 de Outubro de 1998, o A. celebrou com a sociedade TEMPOR - Cedência Temporária, Selecção e Formação de Trabalhadores, Lda., o seguinte: "CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO (Nos termos do D.L. 358/89, de 17. Out.) "Entre TEMPOR - Cedência Temporária, Selecção e Formação de Trabalhadores, Lda., com sede no Bairro da Chabital, Lote 46-A, Alhandra, Pessoa Colectiva n. ° 502 459 956, inscrita na Conservatória do registo Comercial de Vila Franca de Xira sob o n° 2186/9001207, com o Capital Social de Esc. 750.000$00, na qualidade de 1.ª outorgante E AA, residente em Samora Correia, Contribuinte n° 0000000, portador do B.I n° 000000, na qualidade de 2.° outorgante, é celebrado o presente contrato de trabalho temporário, que se rege pelas cláusulas seguintes.
PRIMEIRA: O 2.° outorgante obriga-se a prestar a sua actividade profissional a um terceiro utilizador com quem o 1.° outorgante celebre contrato de utilização nos termos do D.L. n. ° 358/89 de 17 de Outubro.
SEGUNDA: O 2.° outorgante desempenhará as funções inerentes à categoria profissional de serralheiro mecânico de 1.ª.
TERCEIRA: O 2.° outorgante exercerá aquelas funções nas instalações da empresa: "BB, S.A." sitas em Santa Iria da Azóia.
QUARTA: O horário de trabalho a cumprir pelo 2.° outorgante será o acordado no contrato de utilização, num total de 40 horas semanais.
QUINTA: O 2.° outorgante será pago na base mensal ilíquida de Esc. 133.900$00, e à qual serão deduzidos os competentes descontos legais.
SEXTA: Para efeitos do disposto na al. b) do n. ° 1 do artigo 11. ° do D.L. 358/89 de 17.Outubro, o presente contrato é celebrado ao abrigo da alínea c) do artigo 9. ° do mesmo diploma legal, e para cumprimentos das obrigações assumidas pelo 1.° outorgante no contrato celebrado com a empresa: "BB - , S.A. ", nomeadamente a execução de peças e reparação dos vários tipos de máquinas, motores e outros conjuntos mecânicos.
SÉTIMA: O presente contrato tem início em 19 Out. 98 e tem o seu termo a 28 Fev. 99.
OITAVA: Em tudo o que for omisso, o presente contrato reger-se-á pelas disposições do D.L. 358/89 de 17 de Outubro, e pelas disposições aplicáveis do D.L. 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
Feito em Alhandra, aos 19 de Outubro de 1998, em...
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