Acórdão nº 08P3281 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Novembro de 2008
Magistrado Responsável | FERNANDO FRÓIS |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: No 2º Juízo de Tomar, no processo comum nº 298/06.0 PBTMR, foram os arguidos: AA, filho ... e de ..., natural da freguesia de Santa Maria dos Olivais, concelho de Tomar, nascido a 27 de Março de 1983, solteiro, desempregado e residente na Rua ..., lote 00, 1º Esq., Tomar; e BB, filho de ... e de ...., natural da freguesia de Azurém, concelho de Guimarães, nascido 9 de Agosto de 1981, solteiro, pintor da construção civil e residente em ..., nº00, Carregueiros, Tomar; Submetidos a julgamento perante tribunal colectivo, acusados da prática em co-autoria e na forma consumada, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º nº1 do Código Penal.
A esse processo foi apensado o processo comum singular nº 121/07.9PBTMR, no qual o Mº. Pº. deduziu acusação contra o arguido BB, imputando-lhe a prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º nº 2 do D.L. 2/98 de 3.1.
A final, como co-autores materiais daquele crime de roubo p. e p. pelo citado artigo 210º-1, do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei 59/2007, de 04 de Setembro, foi - além do mais - cada um dos arguidos, por acórdão de 21 de Dezembro de 2007, condenado na pena de 4 (quatro) anos de prisão.
E o arguido BB, como autor material (em concurso real, com o mencionado crime de roubo) de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º nº 2 da Lei 2/98 de 03.01., foi ainda condenado na pena de seis meses de prisão.
Em cúmulo jurídico destas duas penas parcelares, foi o mesmo arguido BB, condenado na pena única de quatro anos e três meses de prisão.
Ao abrigo do disposto no art. 50º do citado CP, actual redacção, foi suspensa a execução das penas ora impostas a ambos os arguidos, pelo período de quatro anos, para cada um deles.
Inconformado com o segmento do acórdão que determinou a suspensão da execução das penas aplicadas, o Mº Pº interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 28 de Maio de 2008, concedeu provimento ao recurso e revogou a decisão recorrida na parte em que facultou a suspensão da execução das penas aplicadas a cada um dos arguidos.
Inconformados com o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, os arguidos interpuseram o presente recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, pugnando pela revogação daquele acórdão da Relação e pela manutenção do acórdão da 1ª Instância ou, se assim se não entender, revogar-se o acórdão da Relação e manter-se a suspensão da execução da pena a cada um dos arguidos, ainda que sujeita ao regime de prova, já que os arguidos aceitam que se decida a suspensão da execução das penas por igual período, sujeitando-se tal suspensão a regime de prova, mediante plano de reinserção, tendo em vista a sua plena reintegração social e como prova da sua mudança.
Na sua motivação, formulam as seguintes (e extensas) conclusões: 1 - O Tribunal Recorrido ao revogar a suspensão da execução da pena de prisão, à luz do disposto no artigo 50°,nº 1 do Código Penal, não atendeu às circunstâncias da vida dos arguidos e não elaborou um juízo de prognose favorável no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2 - No caso em apreço, o Tribunal recorrido não atendeu à notória integração social dos arguidos, à sua estabilidade económica e familiar e o projecto de vida, que após os factos por que foram condenados, delinearam de forma consentânea, para pautarem os seus comportamento de acordo com as regras da vida em sociedade.
3 - Ante tal quadro, só ao optar-se pela suspensão da execução das penas impostas aos arguidos, é que será feita uma correcta interpretação do disposto no artigo 50º do Código Penal e ao manter a suspensão da execução por período igual ao da pena.
4 - O Tribunal a quo devia ter mantido a decisão já proferida em 1ª instancia in totum, ou seja, suspensa na sua execução, em obediência ao disposto nos artigos 40.°,70.°, 71.°, 72.°, e 50.° do Código Penal, 5 - Não o tendo feito violou tais disposições legais, tanto mais que inexistem elementos nos autos que permitam contrariar o juízo de prognose favorável a que chegou o Tribunal de 1ª Instância e que o levou a suspender a execução da pena de prisão em que condenou os recorrentes.
6 - Ademais, o Juízo de prognose desfavorável a que chegou o Tribunal recorrido foi não fundamentado, como legalmente se lhe impunha, o que leva a que a decisão recorrida esteja ferida de nulidade, 7 - E da leitura do Acórdão recorrido não se atentou ao percurso de ressocialização levado a cabo pelos arguidos, nomeadamente, a sua integração laboral, familiar e social, 8 - Aliás, o Acórdão recorrido nem sequer tinha qualquer relatório social dos arguidos em que pudesse fundamentar a sua decisão de revogar a decisão da 1ª Instância 9 - Nomeadamente, do arguido AA que perante a adversidade em arranjar trabalho em Portugal emigrou para França, onde trabalha como trabalhador rural, de sol a sol, 10 - E não obstante a dureza do trabalho, a sua dedicação e vontade de singrar na vida, conseguiu que o vinculo laboral que tinha já se tenha transformado num contrato de trabalho efectivo, do qual retira um salário mensal de 1500 €, que lhe permite ter uma vida economicamente desafogada, 11 - Namora com uma francesa, com quem pretende constituir família.
12 - O arguido BB trabalha para poder sustentar a sua filha, que assume como uma prioridade da sua vida.
13 - Ao revogar a suspensão da execução decretada pelo Tribunal da 1ª Instância, o Tribunal a quo, corta pela raiz o processo de reintegração e ressocialização que os arguidos iniciaram há cerca de 3 anos, 14 - Contrariando a evolução Jurisprudencial e legislativa plasmada na última alteração do Código Penal, nomeadamente, através da Lei 59/07 de 04/09, revendo pela 23ª vez o CP de 82, apostando decididamente no alcance pedagógico e ressocializador do regime de prova, obriga, sempre que a condenação seja em pena superior a 3 anos e aquela seja suspensa, à cumulação com o regime de prova, nos termos do art. 53º- 3, do CP, 15- A suspensão da execução, acompanhada das medidas e das condições admitidas na lei que forem consideradas adequadas a cada situação, permite, além disso, manter as condições de sociabilidade próprias à condução da vida no respeito pelos valores do direito como factores de inclusão, evitando os riscos de fractura familiar, social, laboral e comportamental como factores de exclusão.
16 - A filosofia e as razões de política criminal que estão na base do instituto, radicam essencialmente no objectivo de afastamento das penas de prisão efectiva de curta e média duração, garantindo ainda, quer um conteúdo bastante aos fundamentos de ressocialização, quer exigências mínimas de prevenção geral e de defesa do ordenamento jurídico: é central no instituto o valor da socialização em liberdade, 17 - Assim e mesmo que se considere, como na decisão recorrida, que um juízo de prognose não tão favorável aos arguidos como fez o Tribunal de lª Instância, sempre se podia lançar mão do regime de suspensão com regime de prova, que os arguidos, desde já, declaram aceitar submeter-se.
18 - Jamais devendo ser cerceada a possibilidade da socialização em liberdade que os recorrentes já encetaram, 19 - Atento sempre o objectivo de reintegração do agente cumprindo-se o disposto no artigo 40.0 do Código Penal, 20 - Tanto mais que as penas em que foram condenados e cuja execução foi suspensa na execução é ainda suficiente para satisfazer as prementes necessidades de protecção dos bens jurídicos violados, bem como é adequada a proporcionar a reintegração do agente na sociedade e não ultrapassa a medida da sua culpa.
21 - Deve, assim, o presente recurso ser julgado procedente e ser revogado o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, mantendo-se a decisão proferida na lª Instância uma vez que as penas aplicadas aos arguidos em Primeira Instancia não excede a medida da culpa respectiva, e cumpre os fins das penas, mormente a prevenção geral e especial permitindo prosseguir a almejada reintegração social dos arguidos, pelo que se mostra correcta e justa, face aos critérios legais, mormente dos art°s 40°, 71 ° e 72° do C. Penal.
22 - Sem prescindir, deve sempre aquele Acórdão recorrido ser revogado e mantida a suspensão da execução da pena, ainda, que sujeita ao regime de prova, já que os arguidos aceitam que se decida, nos termos do preceituado no artigo 50° e 53° do Código Penal, suspendendo a execução desta pena por igual período, nos termos do número 4 do artigo 50° referido, sujeitando-se tal suspensão a regime de prova, legalmente obrigatório, conforme o estabelecido no número 3 do artigo 53°, mediante plano de reinserção, tendo em vista a sua plena reintegração social e como prova da sua mudança.
Respondeu o MºPº, junto do Tribunal da Relação de Coimbra, pugnando pelo não provimento do recurso e pela manutenção do decidido no Acórdão da Relação.
Na respectiva motivação (onde não formula conclusões), alega, em resumo: A suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade mas, antes, de um poder/dever vinculado, devendo ser decretada desde que se verifiquem os seus pressupostos e na modalidade que for considerada pelo tribunal como...
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