Acórdão nº 08P2874 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução29 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA veio interpor recurso da decisão que o condenou nas seguintes penas: a) Cinco (5) anos de prisão, pela prática de um crime continuado de violação qualificada, p. e p. pelos artigos 164º, nº 1 e 177º, nº 4 do Código Penal b) Um (1) ano de prisão, pela prática de um crime de violação qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 164º, nº 1, 177º, nº 4, 22º e 73º do Código Penal; c) Em cúmulo jurídico de penas, foi fixada a pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão; As razões de discordância encontram-se expostas, de forma singela nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que a pena aplicada é demasiado severa violando na sua determinação os nº1 e 2 do artigo 71 do Código Penal.

Nesta instância o ExºMº Sr.Procurador Geral Adjunto pronunciou-se pela forma constante de fls Os autos tiveram os vistos legais * Cumpre decidir Em sede de decisão recorrida encontra-se provada a seguinte factualidade: -O BB nasceu em 05/08/1994 e integra há já algum tempo a fanfarra do Centro Recreativo Cultural e Artístico de S. T...., tocando cavaquinho e caixa.

Por sua vez, o menor CC nasceu a 31/10/1993 e desde Março de 2007,também vem frequentando as aulas de música no referido Centro Cultural, tendo em vista a sua posterior integração e participação na respectiva fanfarra.

As aulas de música e os ensaios tinham lugar nas instalações deste Centro Cultural, sitas no Lugar da ......., S. T....., Guimarães, aos sábados à tarde e às quartas-feiras ou outros dias da semana à noite, após o jantar, e terminando entre as 21,30 e as 22 horas.

Com a frequência das actividades musicais do Centro Cultural pelo CC, o trajecto entre as suas residências e aquela instituição e o de regresso desta às respectivas casas no final das aulas e dos ensaios, anteriormente realizado a pé apenas pelo BB, passou a ser feito igualmente a pé conjuntamente pelos dois menores.

O arguido AA, residente na vila de S. Torcato, também frequentava as instalações do referido Centro Cultural, designadamente, nos dias e nos períodos horários em que decorriam as aulas de música e os ensaios da fanfarra, apesar de não participar em qualquer destas actividades.

Embora o arguido e os menores BB e CC já se conhecessem por residirem em Ruas próximas da localidade de S. Torcato, Guimarães, não mantinham, nem as respectivas famílias, qualquer tipo de amizade, de relacionamento ou de contacto. A partir do início do ano de 2007, o arguido começou a aproximar-se do BB e a conversar com ele nas referidas instalações do Centro Cultural nos dias do ensaio da fanfarra, logrando deste modo obter fácil e rapidamente a sua confiança.

Por diversas vezes no final dos ensaios o arguido deu boleia ao BB a solicitação deste e transportou-o no seu veículo automóvel até à sua casa, sita na Rua da ....., nº ...., S. Torcato, Guimarães.

Por já conhecerem devido à relação de vizinhança e pelas conversas entre eles entretanto ocorridas, o arguido ficou a saber que o BB tinha na ocasião 12 anos de idade e o CC 13 anos, idades estas correspondentes à compleição e estatura física que cada um deles apresentava.

Mesmo depois de ter a companhia do CC, o BB, continuou a pedir boleia algumas vezes ao arguido, tendo os dois sido transportados no veículo deste nessas ocasiões.

O arguido resolveu então aproveitar-se da confiança em si depositada por estes dois menores, da sua situação de inexperiência, da falta capacidade de discernimento necessária para compreenderem o sentido e alcance da cópula anal e oral e dos demais actos de natureza e cariz sexuais, nem para se poderem determinar em conformidade com tal compreensão, atentas as suas idades, e da sua superioridade física, para abusar sexualmente deles.

Nesta conformidade, cerca de três meses antes do mês de Junho de 2007, em dia não concretamente apurado, uma sexta-feira, pelas 20 horas, o menor BB, após sair da catequese, deslocava-se a pé numa artéria de S. Torcato com destino à sua residência.

A dado momento do trajecto, encontrou o arguido BB empunhando um garrafão de plástico a abastecer com combustível o seu veículo automóvel de cor vermelha, tendo-lhe de novo solicitado que o transportasse até casa, pedido a que aquele de imediato acedeu.

Pelo que, depois de entrar para o banco da frente ao lado do condutor do veículo e de iniciado o trajecto, por sugestão do arguido AA, o menor BB, desconhecendo e não suspeitando dos propósitos daquele, aceitou a acompanhá-lo previamente a um outro local por si não concretamente especificado.

Obtida a anuência deste menor, o arguido dirigiu-se então para junto da escola primária de M....., S. Torcato, onde parou o veículo automóvel num lugar escuro, sem iluminação e onde não passam normalmente pessoas à noite.

De seguida, o arguido mudou-se para o banco traseiro do veículo, sendo acompanhado por sua ordem pelo BB, que se sentou também a seu lado no mesmo banco.

Então, o arguido ordenou ao BB que baixasse as calças e a cuecas.

Como este menor recusou, o arguido começou a puxar estas peças de vestuário para baixo, enquanto o BB, opondo-se a tal pretensão, as segurava e puxava para em sentido contrário para cima.

Contudo, este conseguiu vencer a resistência do menor e desnudá-lo da cintura para baixo.

De seguida, o arguido, levou o BB a colocar-se de cócoras sobre o assento traseiro e de costas voltadas para si, e encostou o seu pénis erecto no ânus deste menor, mas não prosseguiu, nem concretizou a penetração.

Contudo, o arguido ainda disse ao BB para lhe chupar o pénis erecto, o que este recusou, tendo-se vestido, passando depois os dois para os bancos da frente do veículo.

Entretanto, o arguido arrancou com o veículo em direcção a casa do menor BB, onde o largou.

Antes de iniciar a marcha o arguido colocou o seu pénis erecto fora das calças e ordenou ao menor que o masturbasse.

Durante o trajecto efectuado o BB manipulou o pénis erecto daquele, realizando movimentos para cima e para baixo com as mãos enquanto aquele conduzia o automóvel, sem contudo ter ocorrido ejaculação.

O arguido advertiu o BB para não dizer nada a ninguém, sob pena de lhe dar bofetadas, razão pela qual, o menor, receando vir a ser agredido corporalmente, nada contou aos pais.

No dia 01 de Maio de 2007, uma terça-feira, pelas 22,00 horas, o BB e o CC caminhavam a pé em S. Torcato, provenientes do identificado Centro Cultural com destino às respectivas residências.

O arguido, que os tinha visto sair daquele Centro, seguiu-os conduzindo o seu veículo, na altura um Volkswagen Golf, de cor cinzento, e alcançou-os cerca de cinco minutos depois, oferendo-lhes boleia para casa, o que os menores acabaram por aceitar, tendo entrado o BB para o banco da frente e o CC para o banco de trás do veículo Volkswagen.

Momentos depois de reiniciar a marcha, o arguido, alegando não poder seguir pelo trajecto normal, mudou de direcção e dirigiu-se para um local onde existem as ruínas das instalações de uma antiga vacaria e de duas casas desabitadas, que é escuro, sem iluminação pública e onde não costumam passar pessoas à noite.

Uma vez ali chegado, o arguido parou o veículo automóvel, saiu para o exterior deixando as portas fechadas e trancadas à chave, afastou-se alguns metros e regressou passados momentos. O arguido entrou de novo no automóvel, agora para o banco traseiro, e sentou-se no meio do CC e do BB que, entretanto, tinha mudado para aquele banco, ficando junto do amigo.

Nessa altura, o arguido pretendendo praticar sexo anal com o menor CC, ordenou-lhe que baixasse as calças e as cuecas.

Como o CC se recusou e começou a gritar, o arguido começou a puxar-lhe as calças e as cuecas para baixo, para o despir da cintura para baixo, ao mesmo tempo que os advertia de que aquilo não era para dizer a ninguém.

Mas não conseguiu vencer a resistência oferecida pelo CC que segurou aquelas peças de vestuário, puxando-as em sentido contrário, e, para além disso, deu um empurrão ao arguido, ao mesmo tempo que também o advertiu de que ia contar tudo ao seu pai se ele continuasse.

Perante esta recusa, a resistência oferecida e a advertência feita pelo CC, o arguido largou-o e não prosseguiu com ele os seus propósitos, referindo que "teria de ser com o BB".

Apesar da resistência também oferecida pelo BB nessa altura, o arguido, puxou as mencionadas peças de vestuário e logrou descê-las até à zona das pernas abaixo dos joelhos, desnudando-o na metade inferior do corpo, após o que lhe colocou o pénis erecto encostado ao ânus, tendo em vista a penetração anal.

Nessa altura e apercebendo-se de que algumas pessoas caminhavam na estada que passava próximo, o CC aproveitou a saída do veículo e fugiu em direcção à referida estrada, gritando por socorro, sem contudo conseguir qualquer auxílio.

Porém, ao aperceber-se da fuga do CC e dos seus pedidos de ajuda gritados, o arguido largou o AA sem concretizar a penetração anal e passou para o banco do condutor.

O AA, que entretanto se havia vestido, sentou-se igualmente no outro banco da frente por determinação do arguido.

Seguidamente, o arguido arrancou com o seu veículo em direcção ao CC, parando junto dele e ordenando-lhe que entrasse para o banco de trás, ordem que este menor acatou.

Após entrar no carro do arguido este disse para o CC que "merecia levar", querendo com tal afirmação dizer que merecia ser agredido corporalmente.

O arguido reiniciou a marcha do veículo e vindo a parar num arruamento mais à frente, onde veio a introduzir o seu pénis erecto na boca do menor BB, movimentando-o no seu interior.

Entretanto, porque se aproximou um veículo automóvel pelas traseiras, o arguido, largou o BB, fechou a carcela das calças e arrancou com o veículo, deixando os menores apeados junto das suas residências depois de os advertir de que "seria pior para a...

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