Acórdão nº 08A1825 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelCARDOSO DE ALBUQUERQUE
Data da Resolução30 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: No âmbito do processo de insolvência, que corre termos no Tribunal da Comarca de Portimão desde 30/03/2006 em que foi declarado insolvente AA, por sentença proferida em 21/04/2006 foi exercida pelo administrador da insolvência, contra BB, por carta registada com aviso de recepção (AR) datada de 2/10/2006 e recebida em 9/10/2006, a resolução em benefício da massa insolvente de contrato de compra e venda (em que foi vendedor o insolvente e adquirente o referido BB), celebrado em 23/6/2003 e que teve como objecto ½ de fracção autónoma designada por letra ... do prédio urbano registado sob o nº ... na Conservatória do Registo Predial de Lagoa, com base no artº 120º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18/3 e depois alterado pelo Dec.Lei nº200/2004 de 18 de Agosto ( com entrada em vigor em 15 de Setembro desse ano) invocando simulação, sem pagamento de preço, com o objectivo de subtrair o descrito bem aos credores do insolvente.

Pelo mencionado adquirente foi deduzida impugnação da resolução, ao abrigo do artº 125º do CIRE.

No respectivo processo, que corre por apenso ao processo de insolvência, foram suscitadas pelo impugnante várias questões contrariadas pelo Administrador na sua contestação e em que igualmente deduziu reconvenção, considerada por aquele inadmissível e que mereceram decisão no despacho saneador certificado a fls. 270-286.

Sucintamente, foram as seguintes as questões invocadas e a solução dada pelo tribunal de 1ª instância: - aplicabilidade do artº 123 do CIRE sobre a forma de resolução nele prevista apenas a actos não formais (o que impediria a resolução do contrato em causa): o tribunal considerou que o preceito indicado não distingue entre actos formais e não formais, tendo aplicação a todo o tipo de actos, pelo que seria admissível a resolução no caso; - inaplicabilidade do regime do CIRE à resolução do contrato em causa, por ter sido celebrado na vigência do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (CPEREF), aprovado pelo Decreto-Lei nº 132/93, de 23/4 (pelo que a resolução só podia incidir sobre contrato celebrado há menos de 2 anos ou 6 meses, conforme fosse gratuito ou oneroso, nos termos do artº 156º, nº 1, als. a) e c), do CPEREF, contados desde a celebração do contrato, em 23/6/2003, e até à data da abertura do processo conducente à falência, que no caso ocorreu em 30/3/2006, estando já transcorrido qualquer daqueles prazos): o tribunal entendeu que o CIRE se aplica aos contratos celebrados antes da sua entrada em vigor, sob pena de não se poder decretar a insolvência ao abrigo do CIRE sempre que o seu fundamento fossem factos ocorridos na vigência da lei antiga ou de as normas do CIRE sobre resolução de actos prejudiciais à massa insolvente só entrarem plenamente em vigor 4 anos após a sua vigência formal (por o artº 120º nº1 permitir a resolução de actos ocorridos nos 4 anos anteriores à data do início do processo de insolvência); - a inaplicabilidade do regime do CIRE à resolução do contrato em causa, pelas razões já referidas, implicaria ainda que o prazo para exercer a resolução, contado do conhecimento do acto pelo administrador da insolvência, seria, não o de 6 meses do artº 123º, nº 1, do CIRE, mas o de 3 meses do artº 156º, nº 3, do CPEREF, já decorrido à data do início de funções do aqui administrador (em 26/4/2006), com a consequente caducidade do direito de resolução: o tribunal, ao considerar aplicável o CIRE (e o seu prazo de 6 meses), afasta a caducidade, por só terem decorrido pouco mais de 5 meses entre o início de funções do administrador (26/4/2006) e a recepção da carta de resolução (9/10/2006); - existência de causa prejudicial, que consiste noutra acção de impugnação de resolução (apenso S), respeitante a outra fracção (letra E), que, juntamente com a de letra G aqui em causa, foram objecto de acordo de permuta de fracções entre insolvente e o aqui impugnante no âmbito da celebração de contratos-promessa (pelo que a semelhança entre os dois processos imporia decisão igual de ambos e determinaria a suspensão do presente processo, enquanto processo posterior): o tribunal entendeu que há similitude e paralelismo entre os dois processos, mas não dependência, por neles estarem em causa vendas posteriores à permuta de fracções autónomas entre si; - inadmissibilidade da reconvenção deduzida pelo administrador da insolvência, em que este formula a impugnação pauliana do contrato em causa, para a eventualidade de procedência da impugnação da resolução desse mesmo contrato (por se tratar de acção especial, que não comporta reconvenção): o tribunal admitiu o pedido reconvencional, por considerar a acção em causa como processo comum, tramitado sob a forma de processo ordinário (atento o valor de 50.120,81 €), e o respectivo pedido emergir dos factos que servem de fundamento à defesa, ao abrigo do artº 274º, nos 1 e 2, al. a), do CPC.

Do despacho supra descrito foi interposto pelo impugnante recurso de apelação, mas alterado depois para agravo, tendo a Relação de Évora confirmado o mesmo.

De novo inconformado, o impugnante recorreu de revista, recurso como tal recebido, apesar da oposição do recorrido, rematando as alegações com as seguintes conclusões ( reproduzindo-se a respectiva ordem de numeração) : "1ª Tal como se defendeu ( na 1ª questão) o disposto no artº 123º do CIRE não é aplicável ao caso "sub judice", bem como tal instituto não tem aplicação para a resolução dos actos formais como a compra e venda de bens imóveis, sendo assim a notificação de fls 62/63 inexistente, nula ou inexistente ou ineficaz para reproduzir tal resultado quanto ao contrato de venda de bem imóvel o qual para a sua formação exige "formalidade ad substantiam" , não podendo ser destruído por via administrativa.

2ª - Considerando que o contrato de compra e venda foi celebrado em 22/03/2003 e que teve por base o contrato-promessa de compra e venda de 1/11/2002, é aplicável a lei vigente à data, ou seja o CPEREF e não o Dec. Lei nº 53/2004 de 18 de Março que entrou em vigor em 18 de Setembro.

3ª - Considerando o disposto no artº 156º do CPEREF - lei aplicável ao contrato celebrado - o negócio jurídico celebrado só poderia ser resolvido a) No prazo de dois anos nos termos do disposto no artº 156º,nº1 aln a) b) Considerando que o processo de insolvência deu entrada no tribunal em 30 de Março de 2006, o contrato celebrado em 23/06/2003 é assim inatingível pelos efeitos da insolvência decretada por sentença de 21/04/2006.

5ª - Tal como se defendeu no relatório, o novo diploma legal (CIRE) quanto aos contratos de compra e venda de bens imóveis não tem aplicação retroactiva, nem aliás o legislador consagrou qualquer regime transitório de aplicação de tal norma (artº 120º, nº1 do CIRE) a qual, a existir, salvaguardaria sempre os...

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