Acórdão nº 07S4581 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução10 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA intentou, em 2 de Outubro de 2003, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma comum, contra "Banco BB, S.A.", pedindo a condenação deste a: - Reconhecer-lhe o direito a uma pensão de reforma tal como é configurada na Cláusula 137.ª do Contrato Colectivo de Trabalho publicado no Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, ano XL, n.º 27, de 22 de Julho de 1973, em vigor em 1 de Abril de 1975, devidamente actualizada pelas suas sucessivas revisões e com exclusão de qualquer normativo posterior, nomeadamente da actual Cláusula 140.ª que, datando de 1982 e sendo estranha à invocada relação laboral, não logra aplicação na definição dos seus direitos.

- Pagar-lhe as mensalidades correspondentes à pensão de reforma por invalidez presumida (65 anos de idade) por referência ao tempo de trabalho prestado no "Banco Borges & Irmão" (BBI) desde 1 de Maio de 1959 a 1 de Abril de 1975, nos termos supra mencionados, a partir de 7 de Outubro de 1998 até à data da propositura da acção, assim como aquelas que se forem vencendo.

Pediu, outrossim, que a determinação dos montantes, correspondentes a tais mensalidades, fosse relegada para liquidação de sentença, sem prejuízo de, aos que já se encontrem vencidos, bem como aos que se vencerem na pendência da acção, acrescerem juros moratórios, à taxa legal supletiva, desde a data da citação ou do vencimento.

Em síntese, alegou que: - Exerceu funções, como trabalhador dependente e administrador do BBI, no período compreendido entre 1 de Maio de 1959 e 14 de Março de 1975, data em que o Banco foi nacionalizado; - Após a nacionalização, cessadas as funções de administrador, foi impedido de se apresentar ao trabalho, como pretendia, sendo que teve de sair do País para exercer actividade profissional que lhe permitisse assegurar a subsistência; - Desde Novembro de 1976, data do seu regresso a Portugal, até 21 de Março de 2001, tentou através de inúmeros requerimentos e exposições retomar o seu contrato de trabalho com o BBI, o que não lhe foi concedido por o Réu ter considerado que, por não se ter apresentado pessoalmente ao serviço em devido tempo, o Autor havia perdido tal direito; - Por carta datada de 16 de Março de 2001, o Réu reconheceu-lhe o direito à pensão de reforma devida pelo tempo de serviço que prestou ao BBI entre 1959 e 1 de Abril de 1975, nos termos da Cláusula 140.ª do Acordo Colectivo de Trabalho (ACTV) para o sector bancário; - Porém, o normativo aplicável à sua situação é o que consta da Cláusula 137.ª do mesmo Instrumento de Regulamentação Colectiva de Trabalho (IRCT), em face do disposto no n.º 4 do artigo 63.° da Constituição da República Portuguesa (CRP), que manda contar todo o tempo de serviço para cálculo das pensões de reforma dos trabalhadores e, também, resulta dos princípios da igualdade e da universalidade; - O seu direito à percepção de uma pensão de reforma iniciou-se aquando da entrada ao serviço do BBI e completou-se em definitivo em 1 de Abril de 1975, data da cessação da relação laboral nas aludidas circunstâncias; - A efectiva atribuição do direito à pensão ficou quantitativamente limitada ao período de trabalho prestado e qualitativamente aos direitos à época atribuídos aos trabalhadores bancários.

- Tem direito a receber uma pensão de reforma, por invalidez presumida, correspondente às mensalidades, devidamente actualizadas pelas revisões, calculadas de acordo com o estabelecido na Cláusula 137.ª, na redacção que vigorava em 1 de Abril de 1975, a partir da data em que perfez os 65 anos de idade, o que ocorreu em 7 de Outubro de 1998.

- A Cláusula 140.ª não existia à data da cessação do seu contrato de trabalho com o Réu, sendo certo que foi introduzida no IRCT por alteração de 1982, pelo que os seus efeitos não podem retroagir a situações constituídas mais de sete anos antes.

- Atenta a expressão que é directamente conferida ao tempo de trabalho que prestou ao Banco para efeitos de reforma pelo artigo 63.º, n.º 4.°, da CRP a desconsideração daquele período para efeito de pagamento de pensão de reforma ou a sua qualificação e quantificação por norma estranha e posterior a tal relação estaria ferida de inconstitucionalidade material.

Na contestação, o Réu, para concluir pela improcedência da acção, argumentou no sentido de que o Autor apenas tem direito a uma pensão de reforma calculada nos termos da Cláusula 140.ª do ACTV do Sector Bancário, sendo infundado o pedido de juros de mora.

Saneado o processo e elaborada a condensação, com a especificação dos factos assentes e a organização da base instrutória, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com registo das provas oralmente produzidas, após o que foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou o Réu "a pagar ao Autor as mensalidades de reforma por velhice devidas, nos termos do n.º 1 da Cláusula 140.ª do ACT de 1992, tendo em conta o tempo de serviço que este último lhe prestou, desde 31 de Dezembro de 1959 até 1 de Abril de 1975", relegando "o apuramento do valor devido a tal título até esta data para incidente de liquidação", e condenou também o Réu "a pagar ao Autor juros de mora, à taxa legal, sobre os montantes em dívida desde a data da liquidação da condenação até integral pagamento".

Desta decisão apelaram Autor e Réu, sem sucesso, pois o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento aos recursos.

  1. Interposto pelo Autor e admitido que foi o presente recurso de revista, vieram os seus sucessores - entretanto, devido ao falecimento do Autor, habilitados para com eles prosseguir a lide - apresentar a respectiva alegação com as conclusões assim redigidas: A - O Recorrente prestou serviço ao Banco Borges & Irmão entre 31 de Dezembro de 1959 e 1 de Abril de 1975; B - Com a cessação do seu contrato de trabalho na referida data, o Recorrente adquiriu o direito a receber uma pensão de reforma nos termos da regulamentação então existente e exclusivamente competente para o efeito: a cláusula 137.ª do ACT bancário; C - O direito a receber uma pensão de reforma nasceu integralmente consubstanciado e materializado na esfera jurídica e patrimonial do Recorrente na data de 1 de Abril de 1975, configurando-se como um verdadeiro direito e não como mera expectativa apenas; D - O ordenamento jurídico vigente em 1 de Abril de 1975 consagrava o direito à reforma dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço naquele sector de actividade antes de atingirem a idade da reforma, não limitando ou excluindo em norma alguma tal direito; E - Tanto os princípios gerais de direito como os regimes constitucionais vigentes à época, interpretados ou não pelos actuais valores constitucionais, consagram a necessidade e existência plena do direito à reforma dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço naquele sector de actividade antes de atingirem a idade da reforma; F - O direito à pensão de reforma reclamado pelo Recorrente nasce do disposto na cláusula 137.ª do ACT bancário e não da cláusula 140.ª do mesmo IRC; G - As entidades bancárias sempre reconheceram e pagaram o direito à reforma dos trabalhadores bancários que deixassem de prestar serviço naquele sector de actividade antes de atingirem a idade da reforma tanto antes como depois da entrada em vigor da cláusula 140.ª do ACT; pelo menos até 2001, os Tribunais sempre reconheceram, também, aquele direito.

    H - A cláusula 140.ª (então 141.ª) do ACT surge e entra em vigor em 1982, mais de sete anos após a cessação do contrato de trabalho do Recorrente com o Banco Borges & Irmão; I - A cláusula 140.ª do ACT não pode em momento e por razão alguma ser aplicável à situação do Recorrente na medida em que, à data da sua entrada em vigor, não existia nem mais tarde voltou a existir nenhum nexo pessoal, laboral ou de outro tipo entre o Recorrente e o ACT de 1982; J - A aplicação do ACT de 1982 - e por conseguinte da sua cláusula 140.ª - a situações não abrangidas pelo seu âmbito de aplicação pessoal - como se pretende, no caso, impor ao Recorrente - viola o princípio da filiação, actualmente consagrado no artigo 522.º do CT; (1) K - A aplicação da cláusula 140.ª do ACT à situação jurídica do Recorrente em termos de pensão de reforma viola a proibição expressa de aplicação retroactiva das cláusulas emanadas de IRC's, actualmente constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 533.º do CT; L - A aplicação do regime da cláusula 140.ª do ACT bancário à situação jurídica do Recorrente em matéria de reforma consubstancia aplicação retroactiva de uma norma que já de si não possui força jurídica para tal a um direito adquirido e já plenamente formado na esfera jurídica do Recorrente, violando a proibição contida no artigo 12.º do Código Civil; M - Como tal, o direito do Recorrente à pensão de reforma não pode ter sido constituído nem pode ser modificado pelo regime da cláusula 140.ª do ACT bancário; N - A actual cláusula 140.ª do ACT bancário, surgida em 1982, resulta de uma composição de interesses temporalmente bem definida e fundamentada na então "pretendida" integração dos trabalhadores bancários no regime geral da segurança social, nunca tendo sido efectivamente gizada para regular os direitos à reforma dos trabalhadores que até essa data tivessem abandonado o sector antes de se reformarem - direitos esses que à data eram pré-existentes; O - A própria cláusula 140.ª reconhecia a sua limitação de aplicabilidade aos trabalhadores que abandonassem o sector após 15 de Julho de 1982; P - A aplicação ao recorrente do regime contido na cláusula 140.ª do ACT reveste-se de inconstitucionalidade por representar aplicação retroactiva de lei - aliás, de norma que no caso nem força equivalente à Lei reveste - e constitui denegação do disposto nos n.os 1 e 4 do Art.º 63.º da CRP.

    Q - Aos trabalhadores bancários que tenham deixado de prestar serviço no sector antes de 15 de Julho de 1982 aplica-se, para...

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