Acórdão nº 08B1733 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ROCHA
Data da Resolução03 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

"AA", residente em Liestal, na Suíça, intentou acção de revisão de sentença estrangeira, com processo especial, contra BB, residente em Lisboa, pedindo a revisão e confirmação de sentença de 6.02.1969, proferida pelo Tribunal de Comarca de Liestal, da Suíça, que decretou o divórcio entre ambos.

Para tal alegou, em síntese, que casou com o requerido, no dia 17.01.1958, em Liestal, na Suíça, casamento esse que foi dissolvido pela sentença atrás referida, transitada em julgado no dia 7.03.1969.

Citado, o requerido veio contestar.

Invocou que a sentença revidenda não estava integralmente documentada, já que não continha a parte atinente à sua fundamentação e que, na data em que a mesma transitou em julgado - em Março de 1969 - não teria sido possível à requerente obter a sua confirmação em Portugal, razão pela qual o requerido não recorreu dela; o Tribunal de Liestal era, então, internacionalmente incompetente segundo a lei portuguesa para decretar o divórcio do casal, porque a requerente tinha adquirido a nacionalidade portuguesa por virtude do casamento e, na data da propositura da acção, ainda residia ainda em Portugal; o direito português não admitia a partilha como foi feita, nem, no que toca à fixação de alimentos entre ex-cônjuges, atendeu aos limites nacionais dos rendimentos do prestador e condenou-o numa indemnização sem se ter sequer apurado a i1icitude ou a culpa.

Alegou, ainda, a existência de caso julgado, na medida em que, antes da revisão da sentença de divórcio do tribunal suíço, o casamento entre as partes veio a ser dissolvido por sentença do 2º Juízo do Tribunal de Família de Lisboa, proferida no dia 4.04.1978 e transitada em julgado no dia 12 do mesmo mês e ano e também foram definitivamente resolvidas, para além de outras, a questão dos alimentos devidos pelo requerido, quer à requerente, quer ao filho, no âmbito de um outro processo, que correu termos no então denominado Tribunal Tutelar de Menores de Lisboa.

A requerente respondeu à matéria das excepções invocadas, invocando, basicamente, que o Tribunal de Liestal era internacionalmente competente e que o requerido se conformou com decidido pelo Tribunal de Liestal, tanto que não recorreu.

Em sede de alegações, requerente e requerido mantiveram as posições já assumidas nos autos e o Ministério Público, a final, pronunciou-se no sentido de não ser atendida a pretensão da requerente, com o fundamento de que "parecem existir obstáculos legais à confirmação e revisão pretendidas da decisão".

Por acórdão de 31 de Janeiro de 2008, foi julgada procedente a revisão da sentença de 6.2.1969.

Inconformado, o requerido pede revista, tendo concluído a alegação do recurso pela seguinte forma: Em matéria de aplicação da lei no tempo, vigora no Direito Processual Civil a regra, constante do artigo 12°, nº1, do Código Civil, segundo a qual a lei só dispõe para o futuro e, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvadas os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular; Na verdade, como ensina o Prof. Miguel Teixeira de Sousa (Introdução no Processo Civil, Lisboa, lex, 1993, pág. 37), "a regra da aplicação imediata não pode ser seguida quando haja que acautelar as legítimas expectativas das partes"; Ora, assim sendo, a parte deverá ter em conta as normas legais existentes à data em que a acção judicial foi contra ele proposta em tribunal estrangeiro ou, no máximo, à data em que este proferiu a sentença ou em que esta transitou em julgado; A aplicação, nos presentes autos, das normas atinentes à revisão de sentenças estrangeiras que entraram em vigor posteriormente a ter sido proferida a decisão revidenda, designadamente quando estabeleceram um regime mais favorável à revisão, frustra as legítimas expectativas da parte contra quem ela foi proferida e que, após cuidada interpretação da regra legal então vigente, optou - e só por isso optou - por não contestar ou recorrer, por ser manifesto que, então, não estavam reunidas as condições mínimas para a confirmação da decisão; Não pode, assim, deixar de aplicar-se ao caso sub judice o regime constante dos artigos 1094° e seguintes do Código de Processo Civil, maxime o artigo 1096° -, na redacção anterior à reforma de 1995; Porque a certidão da sentença revidenda é apenas parcial ou por extracto, de onde não constam os fundamentos, de facto e de direito, que terão, eventualmente, justificado a decisão, ou seja, a parte decisória da sentença revidenda, e porque, como vimos, é aplicável à revisão em causa o Direito Processual Português que estava em vigor à data em que transitou em julgado a decisão revidenda, ou seja, o artigo 10960 do Código do Processo Civil, na redacção que este tinha em 7 de Março de 1969, substancialmente diferente da que resultou do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, que limitou, ainda mais, os casos em que há lugar à revisão de mérito, não pode ser concedida a pedida confirmação; Por isso, a revisão de mérito de decisão estrangeira, nos termos da alínea g) do Código de Processo Civil, a cuja aplicação as partes não podem renunciar, não pode ter lugar quando da decisão revidenda não constem os factos que lhe serviram de fundamento e da apreciação das quais depende a emissão do juízo de legalidade da mesma decisão em face da lei portuguesa; E isto porque a decisão foi proferida contra português, há que verificar se se verifica ofensa das disposições do direito privado português, por força das regras do direito de conflito português (artigos 52° e 55° do Código Civil, na sua versão original); A Relação violou, aqui, o disposto na alínea g) do artigo 1096º do Código de Processo Civil, na redacção vigente em 1969, impondo-se, por isso, a revogação do acórdão em revista e a sua substituição por outro, deste Supremo, que julgue improcedente o pedido; Em face da redacção, vigente à data do trânsito em julgado da decisão cuja revisão é agora requerida, da alínea c) do artigo 1096° do Código do Processo Civil, e que é a aplicável, exigia-se, como necessário à...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT