Acórdão nº 08A786 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Maio de 2008
Magistrado Responsável | CARDOSO ALBUQUERQUE |
Data da Resolução | 27 de Maio de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACÓRDÃO NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I - AA intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra BB, tendo sido habilitados na pendência da acção, por morte daquele, CC, DD e EE.
Pede: - que se condene o R. a efectuar as obras necessárias à colocação do locado no estado em que se encontrava à data da celebração do contrato de trespasse no prédio arrendado à A., sito no Largo ..................., n.º...,....... Sacavém, e que estão identificadas nos orçamentos juntos (sic); - que se condene o R. a efectuar uma limpeza do logradouro do imóvel e - que se condene o R. a entregar a chave do portão que dá entrada para o logradouro pela via pública.
Para tanto, e em síntese, alega: - que o R. é seu senhorio; - que o arrendado necessita de obras; - que o R. lhe vedou o acesso ao exterior pelo logradouro que sempre utilizou e que encheu este de lixo.
Regularmente citado, o R. contestou arguindo a excepção de ilegitimidade activa por a A. litigar desacompanhada dos demais inquilinos, impugnando o alegado pela A. e aduzindo que o logradouro é para seu exclusivo uso, que sabe ser necessária a realização de obras, mas que o montante da renda não permite a realização das mesmas, não detendo meios para o efeito.
A A. replicou pugnando pelo desatendimento da excepção e impugnando o alegado pelo R.
Teve lugar audiência preliminar no decurso da qual foi elaborado despacho saneador em que se decidiu ser o tribunal competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia; não existirem nulidades que invalidassem todo o processo e terem as partes personalidade e capacidade judiciárias. A excepção de ilegitimidade foi desatendida e as partes julgadas legítimas, declarando-se, tabelarmente, inexistirem outras excepções de que cumprisse conhecer.
Foram, de seguida fixados os factos assentes e elaborada base instrutória, sobre os quais não recaiu reclamação.
Teve lugar prova pericial.
Por fim, procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais.
E exarou-se na devida oportunidade douta sentença que apenas julgou procedente o pedido de condenação do R ( "rectius" os seus sucessores, devidamente habilitados) na limpeza do logradouro, absolvendo-o dos demais.
Irresignado com o dito desfecho. a A recorreu de apelação, mas sem êxito, visto a Relação de Lisboa ter confirmado, por acórdão de fls 537 e ss e na íntegra a sentença para cuja fundamentação remeteu, por com ela concordar.
A A não se conformou com o beneplácito dado à sentença e veio recorrer de revista do citado acórdão, tendo apresentado na 2ª instância, extensa minuta que concluiu da seguinte forma : " 1 - No Acórdão recorrido violaram-se as normas jurídicas substantivas e processuais a saber , artº 1031º aln b) do CCivil, artºs 11º e 12º do revogado RAU (aplicável aos presentes autos ) e atºs 193º, 474º, 706º e 668º aln d) do CPC.
2 - Delimita-se o âmbito do presente recurso à parte do Acórdão que absolveu os RR do pedido de realização de obras no arrendado.
3 - Foi dada como provada, relativamente ao âmbito do recurso no ponto antecedente, a matéria de facto acima referidas nos pontos II e I a 20 que aqui se dá por reproduzida .
4 - Foi produzida prova pericial no que se refere aos pontos relativos às deteriorações do imóvel e relativamente aos demais foi produzida prova testemunhal, apenas não sendo produzida prova por inspecção, porque o tribunal "a quo" a indeferiu a requerimento da Recorrente na audiência de julgamento .
5 - No Acórdão recorrido concluiu-se que face à matéria de facto provada acima elencada que " o gozo do arrendado raia a impossibilidade ou está no mínimo extremamente diminuido nas suas potencialidades " - o que é rigorosamente verdade.
6 - As obras dos autos não são de reconstrução, pois reconstrução significa " construir de novo " pressupondo que aquilo que se vai reconstruir já não existir , o que não é o caso .
7 - A qualificação das obras como de reconstrução além de incorrecta , é irrelevante para os efeitos de aplicação da lei que rege as relações entre senhorio e inquilino , uma vez que nem o revogado RAU, nem o recentemente aprovado NRAU preveêm esse tipo de obras.
8 - Por outro lado, o A não efectuou nos presentes autos um pedido de obrás de conservação extraordinárias .
9 - Pelo contrário ,a A pediu a realização de obras de conservação ordinária 10 - As obras anexas aos orçamentos da p.i. de fls ... dos autos integram-se na categoria de obras de conservação ordinária, nos termos do nº 2 aln a) do artº 11ºdo RAU.
11 - No mesmo sentido os Acs do STJ de 18/12/2004 e do Tribunal da Relação do Porto de 6/10/2005 , ambos em www djsi .pt.
12 - Ora sendo obras de conservação ordinária, não são obras de conservação extraordinária ( nem sequer conceptualmente), pois que para serem como tais qualificáveis não poderia a sua necessidade ocorrer de omissão ilícita do senhorio, como se vê do disposto no artº 11º, nº3 do RAU.
13 - No mesmo sentido o Ac do Supremo já referido .
14 - Ainda que as obras viessem a classificar-se como extraordinárias, o que apenas a benefício de raciocínio se admite, estaria de igual modo, o senhorio obrigado à realização das mesmas.
15 - Neste sentido , o Ac do STJ de 25/11/1998 também na Internet.
16 - O senhorio deliberadamente não cumpriu a sua obrigação de fazer as obras , nem mesmo após ter sido intimado pala autarquia para tal tendo desprezado olímpicamente essa ordem.
17 -Essa ordem não foi coercivamente executada porque a autarquia se recusou a fazê-lo, tal como recusaria a execução coerciva de qualquer outra ordem do mesmo teor, porque não dispõe de dotação orçamental para o efeito.
18 - Para prova do alegado na conclusão antecedente, a recorrente juntou aos autos documento emanado pela autarquia, a qual se tornou necessário na sequência da sentença da 1ª instância , ao abrigo do disposto no artº 706º do CPC. O mencionado documento não foi alvo de apreciação pelos Mmos Juízes do tribunal "a quo" em clara violação do artº 668º, de onde decorre a nulidade do acórdão.
19 - O pedido constante da p. i. de fls dos autos é inteligível, idóneo e preciso .
20 - Na p. i. de fls ... dos autos, por um lado pede-se a condenação do R a efectuar as obras necessárias à colocação do locado no estado em que se encontrava à data da celebração do contrato de trespasse ( pelo qual entrou na posse da A) formulação decalcada do preceito legal aplicado .
21 - Por outro lado remete-se para os orçamentos, em anexo à p. i. , onde se identificam as referidas obras.
22 - Não era exigível à A , ora recorrente que reproduzisse " ipsis verbis " no pedido todos os itens constantes dos referidos orçamentos.
23 - A p. i. de fls não foi alvo de despacho liminar de indeferimento, nem razões haveriam para tal , no entendimento da A, ora Recorrente.
24 - Existiu audiência preliminar nos presentes autos , não tendo a A sido convidada ao aperfeiçoamento do seu articulado (p.i.) ao abrigo do disposto na aln b) do nº 1 do artº 508º do CPC.
25 - No despacho saneador de fls ... dos autos, o Tribunal não se pronunciou sobre qualquer eventual nulidade que obstasse ao conhecimento do mérito da causa.
26 - Assim, ainda que a "vaguidade " ou excepção inominada da iliquidez do pedido existisse - o que não se admite - tendo existido momentos de apreciação dessa eventual situação do pedido, não poderia vir o tribunal . - sem grave denegação da sua função de julgar e, maxime da realização da justiça - volvidos mais de oito anos sobre a data da propositura da acção , dizer que " se condenasse não se saberia em quê ".
27 - A A e Recorrente é arrendatária - paga a sua renda, elevada ou diminuta, é a renda legalmente exigível .
28 - Os Recorridos são proprietários, se não podem manter as suas propriedades, têm da os alienar .
29 - O que não podem é sobre o pretexto da ausência de possibilidades financeiras quer de resto não lograram provar nos presentes autos, prevalecer-se do eventual abuso de direito para se furtarem ao cumprimento das suas obrigações.
30 - O Tribunal não pode estribar-se no binómio valor das obras / valor da renda .
31 - Há que analisar o comportamento do senhorio ( independentemente de estarmos ao primeiro locador ou aos seus sucessores ) bem como o tempo decorrido desde a interposição da presente acção , sem que tivesse existido qualquer intervenção no arrendado, por mínima que fosse.
32 - Hà que ter em conta que o senhorio quando comprou o prédio, sabia que o mesmo necessitava de obras e sabia qual o montante das rendas que a respectiva inquilina ainda assim , quis comprá-lo.
33 -Hà que ter ainda em conta que o senhorio fez um pedido de apoio financeiro para a realização das obras que admitiu serem necessárias após ter sido intimado pela Câmara Municipal de Loures para a realização das mesmas , apenas para se prevalecer do decurso desse pedido para se escusar à referida realização, uma vez nunca apresentou os documentos necessários q ue só ele senhorio poderia apresentar, não aproveitou a colaboração oferecida pela R , ora Recorrente no sentido de obter essa documentação e instruir o pedido devidamente .
34 - As circunstâncias acima descritas e o que o Tribunal deu como provadas mas considerou irrelevantes para a decisão, não o são de todo, e provado que não existe abuso de direito por parte da...
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