Acórdão nº 08S009 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2008

Data26 Março 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA propôs, no Tribunal do Trabalho de Viseu, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho contra a Rodoviária Beira Litoral, S. A.

, pedindo que a ré fosse condenada: (i) a reconhecer que o autor tem direito a receber mensalmente o acréscimo de 25% sobre a remuneração da hora normal, com base, no mínimo, nas 8 horas diárias, mas essencialmente durante todo o trabalho prestado ao serviço da ré, a título da função que desempenha como agente único, bem como nas férias e nos subsídios de férias e de Natal; (ii) a reconhecer que o autor tem direito a ser reembolsado das suas dormidas contra documentos justificativos, num hotel de 2 estrelas, em conformidade com o vertido na al. b) do n.º 8 da cláusula 54.º do A.E.; (iii) a pagar ao autor a quantia global de € 18.355,08, acrescida de juros de mora desde a citação, sendo € 6.368,38 a título de diferenças no subsídio de agente único, relativamente aos anos de 1997 a 2005 inclusive, € 2.165,28 a título de diferenças na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal respeitantes aos anos de 1997 a 2005, € 9.546,42 a título de descanso compensatório não gozado nem pago desde 1997 a 2005 e € 275,00 a título de 5 dormidas em hotel.

Com interesse para os recursos de revista, o autor alegou, em resumo, o seguinte: - Foi admitido ao serviço da ré, em 4.1.93, para exercer as funções de motorista em transportes rodoviários pesados de passageiros afectos ao serviço público; - Sempre exerceu aquelas funções a tempo inteiro no regime de agente único (isto é, não acompanhado de cobrador-bilheteiro), tendo, por isso, direito ao subsídio de 25% sobre a remuneração diária, previsto na cláusula 83.ª do instrumento de regulamentação colectiva aplicável à relação laboral estabelecida entre as partes (o A.E. celebrado entre a Rodoviária Nacional e a FESTRU, publicado no B.T.E., 1.ª série, n.º 45, de 8.12.83, com alterações, nomeadamente, nos BTE's n.º 12, de 29.3.85 e n.º 12, de 29.3.86), relativamente a todo o tempo de trabalho, incluindo o trabalho suplementar, prestado à ré e não apenas em relação às horas de condução efectiva; - O subsídio de agente único integra a retribuição e devia ter sido incluído na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal, o que a ré não fez; - Prestou, à ré, o trabalho suplementar mencionado nos recibos de vencimento, mas esta não lhe pagou a retribuição correspondente aos dias de descanso compensatório que devia ter gozado e não gozou pela realização daquele trabalho.

Por sua vez e também em resumo, a ré alegou o seguinte: - O subsídio de agente único só é devido pelo trabalho prestado em carreiras regulares ou em serviços expresso e o autor, para além daqueles serviços, executou outros (serviços de aluguer, serviços internacionais e serviços de turismo) que não dão direito ao subsídio; - O subsídio só é devido em relação ao tempo de serviço efectivo prestado na qualidade de agente único, devendo, por isso, ser calculado em função do número efectivo de horas de condução prestadas nessa qualidade, mesmo que o motorista exerça a sua actividade a tempo inteiro em regime de agente único; - Cabia ao autor alegar o número de horas que efectivamente prestou naquele regime; - Nada é devido ao autor a título de diferenças salariais no subsídio de agente único, uma vez que as quantias que lhe foram pagas a esse título, referidas nos recibos de vencimento juntos aos autos, apresentam total correspondência com o período de horário efectivo de condução durante o qual o autor prestou a sua actividade em regime de agente único; - O subsídio de agente único é um subsídio especial e, como tal, não integra o conceito de retribuição, não sendo, por isso, devido na retribuição de férias nem nos subsídios de férias e de Natal; - O autor não indicou os dias em que alegadamente prestou trabalho suplementar nem alegou que tal prestação tivesse sido ordenada pela ré; - O disposto no Decreto-Lei n.º 421/83, de 27 de Dezembro, não é aplicável à ré, por não ter sido publicada a portaria prevista no seu art.º 12.º; - De qualquer modo, os créditos referentes ao descanso compensatório, vencidos há mais de cinco anos, só podiam ser provados por documento idóneo, documento esse que o autor não juntou.

Na resposta à contestação, o autor requereu a rectificação do pedido inicial (rectificação essa que veio a ser admitida), pedindo que se declarasse ilícito o processo disciplinar que lhe foi instaurado e que a sanção disciplinar de dois dias de suspensão com perda de retribuição que lhe foi aplicada fosse revogada.

Realizado o julgamento, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo o procedimento disciplinar instaurado ao autor sido declarado inválido com os efeitos legais daí decorrentes e a ré condenada a pagar-lhe a quantia de € 13.025,51, acrescida de juros de mora computados desde a citação, sendo € 7.719,26 a título de diferenças no subsídio de agente único referentes aos anos de 1997 a 2005, incluindo na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal, € 5.156,25 a título de retribuição pelos dias de descanso compensatório não gozados e € 150,00 a título de reembolso pelas despesas de pernoita no hotel.

No que toca às diferenças salariais relativas ao subsídio de agente único e aos descansos compensatórios, a sentença da 1.ª instância estribou-se na seguinte fundamentação: - A cl.ª 83.ª do A. E. aplicável à relação laboral em apreço (o A. E. celebrado entre a Rodoviária Nacional e a FESTRU, publicado no B.T.E., 1.ª série, n.º 45, de 8.12.83, e sucessivas alterações, nomeadamente, nos BTE's n.º 12, de 29.3.85 e n.º 12, de 29.3.86) prevê a atribuição de um subsídio de 25% da retribuição diária aos motoristas que desenvolvam a sua actividade em carreiras de serviço público em acumulação com as principais funções de cobrador-bilheteiro, a menos que o trabalho prestado nesse regime seja inferior ao período normal de trabalho diário, caso em que o subsídio incidirá apenas sobre as horas prestadas, sem nunca poder ser inferior a 4 horas; - Está provado que o autor exerceu a sua actividade de motorista em carreiras de serviço público cumulativamente com as funções de cobrador-bilheteiro, preenchendo, assim, os requisitos da atribuição daquele subsídio, "relativamente a todo o período de trabalho diário", inclusive ao trabalho prestado fora do horário de trabalho, uma vez que a ré não provou, como lhe competia, por se tratar de um facto impeditivo do direito invocado pelo autor, que este "não cumpria a totalidade do seu horário de trabalho em regime de agente único"; - O subsídio de agente único tem natureza remuneratória e, por isso, é devido da retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal; - Não há razões para não aplicar ao caso o disposto no Decreto-Lei n.º 421/83, de 2/12 e, estando provado que o autor prestou trabalho suplementar e que não gozou os descansos compensatórios correspondentes, tem ele direito a receber a retribuição referente aos dias de descanso compensatório que devia ter gozado e não gozou.

A ré recorreu, por continuar a entender que o subsídio de agente único só é devido em relação às horas de condução prestadas em regime de agente único; que é o autor quem tem de provar o número de horas de condução efectivamente prestadas no regime de agente único; que o subsídio de agente único tem natureza especial e não deve integrar a retribuição das férias e os subsídios das férias e de Natal; que o D.L. n.º 421/83 não é aplicável às empresas concessionárias de serviços públicos, por não ter sido publicada a portaria prevista no seu art.º 12.º, não tendo, por isso, o autor direito a descanso compensatório pelo trabalho suplementar que prestou.

O Tribunal da Relação de Coimbra julgou o recurso improcedente no que toca ao descanso compensatório e à inclusão do subsídio de agente único na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal e procedente no que diz respeito ao subsídio de agente único, por considerar que o mesmo só é devido relativamente às horas de condução efectivamente prestadas em regime de agente único e, em consequência disso, relegou para execução de sentença a liquidação da quantia (eventualmente) devida ao autor, a título de diferenças salariais referentes ao subsídio de agente único, incluindo as relativas, em termos médios, à retribuição de férias e aos subsídios de férias e de Natal, por falta de elementos para se proceder ao apuro imediato da mesma.

Inconformados com a decisão da 2.ª instância, dela recorreram o autor e a ré que concluíram as respectivas alegações da seguinte forma: Conclusões do autor: 1 - O douto acórdão de que se recorre considera, ao contrário do tribunal da 1.ª instância, que o subsídio de agente único é um subsídio de função e não de categoria, dependendo, por isso, do exercício efectivo de condução.

2 - No entendimento do recorrente, tal subsídio é antes um subsídio de verdadeira categoria devendo integrar a sua retribuição base, até porque o normativo em causa não fala nunca (literalmente) em trabalho efectivo, ou em exercício efectivo de condução.

3 - Para se ser agente único, em conformidade com a cl.ª 83.ª do A.E. aplicável (normativo que nunca foi objecto de apreciação pelos tribunais superiores e que é substancialmente diferente das cláusulas semelhantes de outros IRCT's), o trabalhador tem de prestar o seu serviço de motorista: a) em carreiras de serviço público; b) não ser acompanhado de cobrador-bilheteiro; c) desempenhar as principais tarefas do cobrador-bilheteiro, para além das suas funções de motorista.

4 - Veja-se que o normativo fala em "ser agente único" e não em exercer a função, o que clara e literalmente quer dizer que o motorista "é" agente único desde que preencha os 3 requisitos apontados no ponto anterior.

5 - E se "for" agente único, diz-nos o n.º 3 daquele referido normativo, que o motorista terá direito a receber um subsídio de 25% sobre a...

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