Acórdão nº 07A3836 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Dezembro de 2007
Magistrado Responsável | MÁRIO CRUZ |
Data da Resolução | 04 de Dezembro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório AA intentou acção declarativa com processo ordinário contra BB , Fundo de Garantia Automóvel.
pedindo - a condenação dos RR. a pagarem-lhe a quantia global de € 232.001,31, bem como juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
Para o efeito alegou que no dia 8-02-1998 ocorreu um acidente de viação na E.N. 10-3, ao Km 1,300, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros, com a matrícula QX-00-00, sua propriedade e por ele conduzido, o veículo 00-00-GV, propriedade de SI, e por este conduzido, e o veículo 00-00-GO, propriedade do 1.º R., cujo condutor após o acidente fugiu do local, não tendo sido possível proceder á sua identificação.
O 1.º R. não tinha à data do acidente qualquer seguro, sendo o respectivo condutor o único e exclusivo culpado do mesmo.
O A. sofreu traumatismos em várias partes do corpo e foi submetido a várias intervenções cirúrgicas e a dolorosos tratamentos; sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais especificando, designadamente, os danos futuros emergentes da perda de capacidade de ganho pelos quais reclama € 150.000 e os danos não patrimoniais pelos quais reclama a quantia de € 75.000.
Contestou o R. Fundo de Garantia Automóvel, tendo o processo prosseguido.
O Instituto de Solidariedade e Segurança Social veio requerer a sua intervenção, deduzindo contra o FGA pedido de reembolso das prestações de segurança social pagas ao A., seu beneficiário, reclamando a quantia global de € 5.974,58 O FGA contestou também essa pretensão.
A final foi proferida sentença que condenou os RR. a pagarem ao A. a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos a quantia global de € 152.737,95, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento e que condenou o FGA a pagar ao Instituto de Solidariedade e Segurança Social a quantia global de € 5.974,58.
Da sentença apelou o FGA tendo o Tribunal da Relação vindo a julgar o recurso improcedente, mantendo a sentença recorrida.
De novo inconformado, pede agora o FGA Revista, vindo a apresentar as respectivas alegações.
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Âmbito do recurso Tendo em conta o disposto nos arts. 684.º-3 e 690.º-1 do CPC., passam a transcrever-se as conclusões das alegações de recurso do recorrente já que é aí que este deve indicar as questões a tratar e condensar os argumentos utilizados, e onde fica delimitado o âmbito do recurso: "I - Vem o douto Acórdão recorrido confirmar a douta sentença da primeira instância que arbitrou a título de danos patrimoniais futuros, o montante de 110.000 euros, montante que se revela manifestamente excessivo para o caso em apreço.
II - Tal decisão foi fundamentada com o entendimento pelo Tribunal recorrido de que a indemnização por dano patrimonial futuro não deve ter por base, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, qualquer tabela ou cálculo aritmético, mas tão só a equidade, entendimento com o qual não se conforma o Recorrente.
III- Efectivamente, sendo verdade que o lesado ficou afectado de uma incapacidade parcial para desenvolver a sua actividade profissional, tal dano deve ser ressarcido, pois merece a tutela do direito; contudo, esta indemnização deve tomar como ponto de partida critérios objectivos sobre os quais foi produzida prova, nomeadamente o salário que auferia, os anos de vida activa restantes, a inflação, as taxas de juro, etc. caso contrário, bastaria alegar a incapacidade de que o lesado ficou a padecer e com base, unicamente, nesse dado se chegaria a um valor indemnizatório.
IV - Mas não é assim. Ao lesado compete alegar e provar que desenvolvia uma actividade antes do acidente, que auferia um salário, que idade tinha, e que, em virtude do acidente sofreu danos corporais, dos quais resultou uma incapacidade para o trabalho.
V - Razão pela qual estes dados têm que ser tomados em conta para o cálculo da indemnização a atribuir, caso contrário, de nada serviriam, pois a equidade, tudo cobre. Entende o Recorrente que, sob o escudo da equidade se atribui um valor indemnizatório que em nada tem a ver com o dano efectivamente demonstrado, sendo um valor atribuído discricionariamente.
VI - É que a fórmula matemática cuja aplicação é defendida pelo Recorrente não é uma formula descabida, desapropriada, antes partindo de critérios objectivos, válidos, e que melhor se coadunam com os princípios do nosso ordenamento jurídico, nomeadamente o princípio da segurança jurídica, o tratar de forma idêntica aquilo que é idêntico.
VII - O montante atribuído começa por ser calculado na douta sentença da primeira instância, tomando com base os critérios referidos, mas, todos esses critérios são, subitamente preteridos, para, sob a capa do conceito onde tudo cabe - a equidade - ser ampliada a indemnização.
VIII - O Dano Patrimonial Futuro é quantificável, e demonstrável por cálculos, não bastando para fundamentar o montante arbitrado o recurso à equidade.
IX - Embora a Jurisprudência venha corrigindo as fórmulas de cálculo, com recurso a essa mesma equidade, a verdade é que a fórmula de cálculo é um ponto de partida e de chegada essencial, sob pena de grave injustiça relativa consoante o critério de cada julgador.
X - O simples cálculo aritmético - a utilização de uma regra de três simples, não toma em conta que o montante recebido de uma só vez gera frutos, i.e., o Autor receberá um acréscimo anual por virtude das aplicações financeiras a longo prazo.
XI - Por essa razão, a Jurisprudência tem utilizado, como fórmula de cálculo das indemnizações - para que o montante se esgote no período determinado - a que consta do Acórdão da Relação de Coimbra de 4/4/1995.
XII - Assim, adaptando aquela fórmula à nova realidade, i.e., tomando como taxa de juros a das Obrigações do Tesouro a Longo Prazo, o montante a indemnizar não é superior a 60.753,80€.
XIII - Até porque o Meritíssimo Juiz a quo, considera que o lesado tem, à sua frente, como limite de vida activa 10 anos, o que ainda limitaria o montante a atribuir, uma vez que nos cálculos que se apresenta se toma por base 20 anos até ao limite de vida activa. Partindo da premissa que o Tribunal partiu, então o montante seria de apenas metade do supra indicado, não sendo verdade o vertido na pág. 12 do douto Acórdão recorrido, pois na sentença da primeira instância a f1s. 511 é dito: " O lesado tem à sua frente mais alguns anos (cerca de 10 anos), tendo em conta a esperança média do tempo de vida para os homens." XIV - O que o Tribunal deve ter em conta para atribuir uma indemnização por dano patrimonial futuro é a vida activa do lesado e não a vida, pura e simples, pois, após a sua vida activa, o lesado não irá desempenhar qualquer actividade profissional, e irá receber uma pensão do organismo para o qual efectuou contribuições.
XV - Ao contrário do que vem expendido no douto Acórdão recorrido, o Recorrente encontrou vários Acórdãos deste Venerando Tribunal, onde constata que o entendimento é contrário ao defendido no Acórdão recorrido.
XVI - A título exemplificativo, o Acórdão datado de 25/05/2004, in www.dgsi.pt/: I - A indemnização por danos futuros decorrentes de incapacidade permanente deve ser avaliada como dano patrimonial e corresponder a um capital produtor de rendimento que a vítima não irá auferir e que se extinguirá no final do tempo provável da sua vida activa.
II - No cálculo dessa indemnização a equidade funciona como elemento corrector do resultado que se atinja com base nos factos provados, eventualmente trabalhados com o recurso a tabelas financeiras ou outros elementos adjuvantes.
XVII - É que, ao atribuir o montante que atribui, verifica-se um enriquecimento injustificado do Autor, que, continuando a trabalhar, como se provou, recebe em dobro as quantias referentes ao seu salário, e ainda recebe uma indemnização por danos não patrimoniais, em virtude das dores que sofreu e ainda continua a sofrer, sendo, assim, este, um caso de enriquecimento sem causa.
XVIII - Atribui o douto Tribunal a quo, a título de danos não patrimoniais, o montante de 35.000 euros, montante com o qual não se conforma o Recorrente, por se manifestar desadequado e excessivo.
XIX - É que, ao comparar este, a casos de indemnização por morte, em que a jurisprudência tem entendido adequado fixar montantes da ordem dos 40.000/50.000 euros, não pode deixar de considerar-se a quantia aqui atribuída manifestamente excessiva.
XX - Conforme jurisprudência deste Venerando Tribunal datado de 12/09/2006, in www.dgsi.pt: "Assim deverá tomar-se em conta a intensidade do sofrimento do ofendido, a gravidade, a natureza e a posição social deste e também a intensidade do dolo ou grau de culpa, mas nunca deve proporcionar um enriquecimento sem causa da vítima." XXI - Deve, assim, em razão dos danos não patrimoniais sofridos pelo A., ser fixado, montante indemnizatório não superior a 20.000 euros.
XXII - O douto Acórdão condena os RR. no pagamento de juros, contados desde a citação, com o que se não conforma o Recorrente, pois entende que tal indemnização já se encontra...
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