Acórdão nº 07P3279 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução15 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

O Tribunal Colectivo da Comarca de São João da Madeira (proc. n.º 5524/03.5TDPRT-4º juízo) decidiu, por acórdão de 28.5.2007, além do mais: - condenar o arguido, AA, com diferente enquadramento jurídico, pela prática, em concurso efectivo, de 1 crime de receptação do art. 231º, n.º 1, do C. Penal, na pena de 15 meses de prisão, 1 crime de falsificação de documento do art. 256º, n.ºs 1, al. a), e 3, do C. Penal, na pena de 2 anos de prisão, e de 1 crime de burla qualificada do art.ºs 217°, n.º 1, e 218º, n.º 2, al. b), do mesmo código, na pena de 2 anos e 9 meses de prisão, e, em cúmulo jurídico destas penas parcelares, na pena única de 4 anos de prisão.

- julgar parcialmente procedentes os pedidos cíveis formulados a fls. 3 a 4 dos presentes autos, a fls. 4 a 5 do apenso n.º 5545/03.8TDPRT e a fls. 3 a 4 do apenso 5540/03.7TDPRT, e, em consequência, condenar o arguido AA a pagar, respectivamente: (1.) À lesada "Modelo Continente Hipermercados, S.A.", a quantia de € 224,14 (duzentos e vinte e quatro euros e catorze cêntimos); (2.) Às lesadas "Modelo Continente Hipermercados, S.A." e "Worten - Equipamentos para o Lar, S.A.", as quantias globais de € 191,08 (cento e noventa e um euros e oito cêntimos) à primeira e de € 199,90 (cento e noventa e nove euros e noventa cêntimos) à segunda; (3) À lesada "Modelo Continente Hipermercados, S.A.", a quantia de € 282,40 (duzentos e oitenta e dois euros e quarenta cêntimos), sendo € 169,87 relativamente ao cheque entregue no seu estabelecimento de Fânzeres e € 112,53 ao cheque entregue no estabelecimento de Matosinhos; todas essas importâncias acrescidas de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data de apresentação do respectivo cheque a pagamento até integral pagamento.

Inconformado, recorre o arguido AA, pedindo a atenuação especial da pena e, em todo o caso, a diminuição da pena fixada.

Respondeu o Ministério Público junto do tribunal recorrido, que sublinhou que, embora o recorrente se refira aos art.ºs 50.º do C. Penal e 379.º do CPP, não suscita nenhuma questão que com eles se relacione e que quanto às questões que coloca deve ser negado provimento ao recurso.

Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público apôs o seu visto.

Colhidos os vistos legais, teve lugar a audiência.

Nela, a defesa reafirmou a posição assumida em sede de motivação, explicitando que se trata de condutas contemporâneas de um outro processo; referiu que além do acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça proferido naqueloutro processo, já foi realizado um cúmulo com outra condenação (proc. n.º 429/03.2TAPF, do Tribunal de Penafiel).

O Ministério Público, em alegações orais, concordou com a posição assumida na resposta à motivação quanto ao âmbito do recurso. Mas questionou a qualificação jurídica efectuada, sustentando que a agravação da burla não funciona de modo automático e que tratando-se de condutas destinadas a obter objectos para pagar ao traficante os estupefacientes, se pode falar num lugar paralelo com o traficante-consumidor, afastando carácter agravativo ao modo de vida, devendo-se convolar para a burla simples. Que deveria ser aplicada a pena de 1 anos por cada crime e de multa pelo crime de burla simples.

Cumpre, pois, conhecer e decidir.

2.1.

E conhecendo.

É a seguinte a factualidade apurada.

Factos provados: 1. Nos dias 13 de Fevereiro de 2003 e 02 de Março de 2003, foram furtados a, respectivamente, SN e MP, do interior de veículos automóveis estacionados na via pública, juntamente com outros módulos de cheques, artigos e documentos, os seguintes módulos de cheques em branco: - n.ºs 0000000000, 33333333333 e 5555555555, da conta n.º 44444444444 da Caixa Geral de Depósitos de que são titulares o referido SN e PN; - n.º 0000000000, da conta n.º 00000000000 do BPI, de que é titular a mencionada MP.

  1. Em data ou datas que não que não foi possível determinar, mas seguramente próxima ou próximas do início de Março de 2003, tais módulos de cheques em branco foram entregues, todos na mesma ocasião ou em ocasiões distintas, ao arguido AA, por indivíduo ou indivíduos de identidade não apurada.

  2. Tais cheques destinavam-se a ser utilizados pelo arguido para pagar bens que compraria em estabelecimentos comerciais, bens esses indicados por aquele ou aqueles indivíduos, a quem o arguido posteriormente os entregaria como forma de amortizar a sua dívida para com eles derivada do fornecimento de produtos estupefacientes e para adquirir droga para o seu consumo presente.

  3. Nas mesmas circunstâncias e pela mesma pessoa ou pessoas, foi igualmente entregue ao arguido AA o bilhete de identidade de EP, com o n.º 111111111, emitido em 16/04/1998 pelo arquivo de identificação de Vila Real.

  4. Esse bilhete de identidade chegara à posse daquele ou daqueles indivíduos de forma não apurada e no qual o mesmo ou mesmos ou alguém a seu mando diligenciaram por substituir a fotografia do respectivo titular pela fotografia do arguido, a quem lha haviam previamente solicitado para o efeito.

  5. Na posse dos mencionados módulos de cheques, o arguido AA passou a utilizá-los em diversos estabelecimentos comerciais, usando o referido bilhete de identidade de EP alterado com a sua própria fotografia.

  6. Para o efeito, deslocou-se até esses estabelecimentos e, à medida que foi adquirindo produtos, foi apresentando, como forma de pagamento, os mesmos cheques, para o que os assinava como se do seu legitimo detentor se tratasse.

  7. Assim, nos dias 07 e 09 de Março de 2003, o arguido AA dirigiu-se aos estabelecimentos comerciais "Modelo Continente Hipermercados, S.A." e "Worten - Equipamentos para o Lar, S.A.", ambos sitos em Rio Tinto, munido dos cheques com os n.ºs 0000000000 do BPI e 0000000000 da CGD, atrás referidos.

  8. Chegado ali, após adquirir os artigos que pretendia, nos valores de, respectivamente, € 191,08 e € 199,90 o arguido apresentou e assinou com o seu próprio punho os ditos cheques, nos respectivos rosto e verso, com o nome de "EP", como se fosse ele o legítimo titular dos títulos, cheques esses que foram então mecanicamente ali preenchidos.

  9. Com efeito, convictos de que os cheques pertenciam efectivamente ao arguido, tanto mais que o mesmo apresentou o referido bilhete de identidade de EP com a sua fotografia aposta, os funcionários daqueles estabelecimentos comerciais aceitaram-nos como forma de pagamento dos artigos.

  10. Entretanto, no dia 15 de Março de 2003, o arguido AA dirigiu-se com o cheque n.º 5555555555, da CGD, ao hipermercado "Modelo", de Fânzeres.

  11. Aí, após escolher os artigos descritos a fls. 7 do apenso 1, no valor de € 169,87, apresentou para seu pagamento o referido titulo, ao qual, pela mesma forma e exibindo o mesmo bilhete de identidade adulterado, o arguido apôs com o seu próprio punho o nome de "EP" como se da assinatura deste se tratasse.

  12. No dia 19 de Março de 2003, com o título n.º 8888888888 da CGD, o arguido AA dirigiu-se ao hipermercado "Modelo" de Matosinhos, onde escolheu os artigos descritos a fls. 8 do apenso 2, no valor de € 112, 53.

  13. Nessa sequência, apresentou para pagamento esse cheque e nele apôs, pelo seu próprio punho, o nome do referido EP como se fosse o titular da respectiva conta, para o que exibiu o mesmo bilhete de identidade com a sua fotografia aposta.

  14. No dia seguinte, 20 de Março, o arguido deslocou-se ao hipermercado "Modelo" desta cidade de S. João da Madeira, onde adquiriu os artigos no valor de € 224,14.

  15. Na posse do cheque n.º 04615111299, o arguido apresentou-o para pagamento daqueles bens e nele apôs com o seu próprio punho o nome "EP", como se ele fosse este a fazê-lo e apresentando o mesmo bilhete de identidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT