Acórdão nº 07P3218 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Outubro de 2007
Magistrado Responsável | ARMINDO MONTEIRO |
Data da Resolução | 31 de Outubro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam em audiência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : Em processo comum com intervenção do Tribunal colectivo , sob o n.º 542/96 . OTASTR , da 5.ª Vara Criminal -1.ª Sec., do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa ,foram submetidos a julgamento: AA e BB, vindo , a final , a ser condenados : como co-autores de um crime de burla , p . e p . pelos art.º s 313 .º e 314.º al. c), do CP ( versão originária ) na pena de 3 anos de prisão , suspensa na sua execução por 5 anos , com a condição de, em 1 ano , pagarem aos assistentes a totalidade dos valores indemnizatórios por que foram condenados e , concretamente : - aos assistentes, a quantia global de € 41.596,38 (quarenta e um mil quinhentos e noventa e seis euros e trinta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora devidos desde 25-05-95 , até efectivo e integral pagamento; - aos assistentes CC, DD e EE, a importância, para cada um, de € 17.457,93 (dezassete mil quatrocentos e cinquenta e sete euros e noventa e três cêntimos), acrescida de juros de mora devidos desde 25-05-95 até efectivo e integral pagamento; - A cada um dos assistentes, a quantia € 12.250,00 (doze mil duzentos e cinquenta euros), acrescida de juros de mora desde o trânsito em julgado desta decisão até integral pagamento.
I . Inconformados com o decidido , interpuseram os arguidos recurso para o Tribunal da Relação , que lhes negou provimento ; de novo , irresignados , interpondo recurso para este STJ , alegam nas conclusões que : 1. Considerou o acórdão recorrido haverem os recorrentes violado o disposto nos n.ºs 3 e 4 do art..º 412.º , do CPP, não tendo dado satisfação a nenhuma das als . do n.º3 ; 2. Considerou-se no acórdão recorrido que, não se poderia conhecer do recurso que versava a matéria de facto e que o recurso se deveria restringir à matéria de direito ; 3. Representa tal posição, rejeição do recurso que versava a matéria de facto ; 4. Tal equivale a rejeição de recurso ; 5 . Da letra da lei, nomeadamente, do disposto nos art..º 420.º n.º 1; 412°, n.º 2 e 412°, n.º 3, todos do CPP, não resulta a possibilidade de o Tribunal "ad quem" rejeitar o recurso que verse matéria de facto se o recorrente não proceder às especificações contidas nas als. do n.º 3, nem der cumprimento ao disposto no n.º 4 do art..º 412° CPP; pois, 6. O art.º 420.º , que regula genericamente a rejeição do recurso, não lhe faz referência como causa de rejeição; 7. Só a falta das especificações previstas nas alíneas do n.º 2 do art.º 412.º , permitem a rejeição de recurso e somente quanto ao recurso que verse matéria de direito; 8. Relativamente ao recurso que verse matéria de facto, não comina a lei com a rejeição a eventual omissão das especificações que os n.ºs 3 e 4 , do art.º 412.º , do CPP impõem para este género de recurso; 9. Considerando-se terem os recorrentes omitido as especificações previstas no n..º 3 , do art.º 412.º , do CPP e a referência prevista no n.º 4, deveria o relator ter facultado a oportunidade de suprir tal de deficiência, convidando ao aperfeiçoamento, nos termos do disposto no n.º 4 , do art.º 690° do Cód. Civil, aplicável por força do disposto no art.º 4° do CPP; 10. A aplicabilidade da norma do n.º 4 do art.º 690° CPC, resulta do facto de a lei processual penal não regular expressamente os casos de omissão de tais especificações, existindo, assim, lacuna que carece de integração; 11. Tal integração de lacuna, nos termos do art.º do 4° CPP, deve ser feita por recurso ao processo civil; 12. Até porque o regime previsto no processo civil é o que serviu de paradigma ao processo penal, dada a quase perfeita similitude de regime e redacção entre os n.ºs 1 e 2 do art.º 690.º -A , do CPC e os n.ºs 1 e 2 , do art.º 412° do CPP; e os n.ºs 1 e 2 do art.º 690.º -A , do CPC e os n.ºs 3 e 4 do art.º 412° CPP; 13. No regime do processo civil, ao inverso do processo penal, prevê-se a rejeição de recurso no caso de omissão das especificações obrigatórias no recurso que verse matéria de facto, e aperfeiçoamento no recurso que verse matéria de direito; 14. Consequentemente, só pode concluir-se que o legislador processual penal, ao estatuir o regime em causa, invertendo (relativamente ao processo civil) a cominação para a omissão das especificações, não pretendeu a rejeição do recurso nos que versem sobre matéria de facto, mas sim nos que versem sobre matéria do direito; 15. Indicando-se no processo civil, solução para o caso de omissão de especificações em recurso onde tal omissão não implique, "expressis verbis " , a rejeição, (recurso que verse matéria de direito), tal como no processo penal (recurso que verse matéria de facto) é esta a que deve ser seguida; ou seja, a do n.º 4 , do art.º 690.º do CPC; 16. Tal entendimento impõe-se, por maioria de razão, quando confrontados com a doutrina do Ac. do Tribunal Constitucional n.º 320/2002 , de 9 de Julho, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do n.º 2 do art.º 412° CPP no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções aí contidas tenha como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência; 17. Se se impõe, por via do cit. Acórdão do Tribunal Constitucional, que seja facultada a oportunidade de suprir a deficiência em causa, convidando-se ao aperfeiçoamento das conclusões em recurso onde a lei, " expressis verbis " , comina a falta com a rejeição, por maioria de razão, se impõe que em recurso que verse matéria de facto, onde não se comina a falta das especificações previstas nos n.ºs 3 e 4, do art. ° 412° CPP, " expressis verbis " , com a rejeição se deve convidar o recorrente ao aperfeiçoamento, facultando-lhe a oportunidade de suprir tal deficiência; 18. Consideram-se violadas pelo acórdão recorrido as normas constantes do n..º 1 do art.º 420.º , n.º 3 e 4 do art.º 412°, todos do CPP e n.º 4 do art..º 690° do Cód. Proc. Civil, aplicável por força do art.º 4° do CPP; 19. Considera-se que o Tribunal recorrido interpretou as normas constantes dos n.ºs 3 e 4 do art.º 412° , do CPP, no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, das menções contidas nas als . do n.º 3 e n.º 4, tem como efeito a rejeição liminar do recurso dos arguidos, sem que a eles seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência; 20. Ao invés, deveria ter interpretado tais normas no sentido de ser facultada aos recorrentes a oportunidade de suprir tal deficiência, de acordo com a doutrina do Ac. TC. n. ° 320/2002 e aplicado o disposto no n. ° 4 , do art. ° 690° CPC; 21. É inconstitucional, por violação das normas contidas no n.º 1 , do art.º 32° e n.º 4 do art.º 200.º , ambos da Constituição da República Portuguesa, a interpretação (e decisão) partilhada no acórdão recorrido, no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, das menções contidas nos n.ºs 3 e 4 do art.º 412° CPP, terem como efeito a rejeição liminar do recurso dos arguidos, ou o seu não conhecimento, sem que aos mesmos seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência, convidando-se ao aperfeiçoamento; 22. Tal interpretação restringe drasticamente as garantias de defesa dos arguidos no presente processo criminal, violando os princípios de garantia de defesa e de dupla jurisdição prevista no n.º 1 , do art.º 32° da CRP e n.º 1 do art. ° 428° CPP; bem assim como, limita drasticamente a possibilidade (esperada) de um julgamento equitativo; 23. Porém, os arguidos, nos fundamentos e conclusões da sua motivação no recurso sobre a matéria de facto, não violaram as disposições contidas nos n.ºs 3 e 4 do art.º 412° CPP, havendo indicado os pontos de facto que consideraram incorrectamente julgados e as provas que impõem decisão diversa de recorrida, tendo-o feito por referência aos suportes técnicos, estes em obediência ao disposto no n.º 2 do art.º 690.º-A e n.º 2 do art.º 522°- C, ambos do C P Civil, aplicáveis por lacuna no processo penal susceptível de ser integrado nos termos do disposto no art. o 4° CPP, tendo-se ordenado e feito a respectiva transcrição; 24. Em consequência das conclusões atrás expostas, deve o Acórdão recorrido ser revogado, desde logo, por ilegalidade ou utilização de interpretação inconstitucional, mandando-se que o Tribunal da Relação de Lisboa, proceda ao julgamento do recurso quanto à matéria de facto, mandando cumprir o disposto no n.º 4 do art.º 690.º , do Cód. Proc. Civil, na medida em que entenda deficiente as conclusões da motivação. Quando assim não se entenda , 25. Deve considerar-se não estarem reunidos os elementos necessários ao preenchimento do crime de burla e os arguidos absolvidos em conformidade; 26. De acordo com os factos provados e as normas da "experiência comum", ainda que o arguido propalasse a situação difícil da empresa, ela, na realidade, vivia-a, com os cortes de abastecimento de fornecedores que representavam "pelo menos 80% da sua actividade", pelo que, o arguido mais não fazia do que alertar os restantes sócios para as dificuldades que inexoravelmente e de acordo com as regras da "experiência comum" se aproximariam, como se aproximaram; 27. Essa situação de dificuldade económica da empresa, não podia deixar de ser do conhecimento do EE e FF, principalmente, mas das outras sócias também, atento o acompanhamento de gestão que faziam; 28.Falecem elementos objectivos e subjectivos do crime de burla imputado aos arguidos. Na verdade, não se deu como provado astuciosamente factos sobre os quais os assistentes estariam em erro. Tal matéria, respeitaria à criação de condições para paralisia da empresa (perda de fornecedores e aumento dos custos fixos) o que não se deu como provado, também, que tenham provocado qualquer erro sobre os factos (os assistentes bem conheciam a situação da empresa, quanto às suas dificuldades e estabilização em 1994) e, não lhes foi criado prejuízo, na medida em que o valor apurado no acórdão recorrido como sendo o valor...
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