Acórdão nº 07A3327 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução30 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de ...., instaurou, em 27.11.2002, pelo Tribunal Judicial de Sever do Vouga, acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra: AA e marido BB e; CC.

Alegando, em resumo, que é credora dos primeiros Réus, em virtude de lhe ter concedido um empréstimo, que estes não liquidaram, tendo os mesmos, por escritura de 26.10.2001, declarado vender ao segundo Réu a sua casa de habitação, declarando ter recebido o respectivo preço, o que não correspondeu à verdade, já que não quiseram vender nem comprar tal imóvel, nem nada foi pago, mas apenas fugir com o mesmo aos credores, nomeadamente a ela própria, tanto mais que tal imóvel continuou na posse e disponibilidade dos primeiros Réus, que aí vivem.

Conclui, pedindo que a acção seja julgada provada e procedente e, por via dela, condenados os Réus a reconhecer que a escritura de compra e venda referida (nos arts. 1º a 4º da petição) é nula, por simulação, devendo ser ordenado o cancelamento da inscrição feita no registo por virtude da mesma ou, se assim não se entender, a reconhecer o direito da Autora à restituição daquele bem para que o possa executar, nos termos do artigo 616º do C. Civil (fls. 2 a 13).

Os Réus AA e marido BB apresentaram contestação, na qual impugnaram parte dos factos articulados na petição, alegando ainda, em resumo, que a petição inicial é inepta por contradição insanável entre as causas de pedir e os pedidos e também entre estes, além de que o empréstimo foi para uma sociedade de que o Réu marido é sócio, sendo esse empréstimo nulo, e aquela compra e venda do imóvel foi regularmente efectuada e pago o preço, não tendo havido qualquer simulação ou intuito de defraudar os credores, pelo que deve aquela excepção ser julgada procedente e os Réus absolvidos da instância ou, se assim não se entender, julgada improcedente a acção (fls. 52 a 57).

O Réu CC apresentou também contestação, impugnando a maior parte dos factos articulados na petição e alegando, em síntese, que a compra e venda daquela habitação foi efectiva, com pagamento por si do preço correspondente, tendo permitido que os vendedores se mantenham na casa, a qual lhe arrendou, pelo que a acção deve improceder (fls. 72 a 77).

A Autora replicou, referindo, em resumo, que não existe ineptidão da petição, por as causas de pedir e pedidos serem deduzidos subsidiariamente, além de reafirmar o antes alegado, concluindo pela improcedência das excepções (fls. 123 a 132).

Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção invocada, além de se terem fixado os factos assentes e elaborado a base instrutória (fls. 162 a 173).

Teve lugar a realização da audiência e fixou-se a factualidade controvertida (fls. 584 e 585).

*** A final foi proferida sentença que: - Julgou improcedente o pedido principal e procedente o pedido subsidiário, declarando-se ineficaz em relação à Autora a compra e venda efectuada, entre os primeiros Réus e o segundo Réu, através da escritura de 26-10-2001 (aludida em a) supra), podendo a mesma Autora executar esse bem agora no património do adquirente, na medida em que tal seja necessário para obter o pagamento integral do seu crédito.

*** Inconformados os RR. recorreram para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por Acórdão de 23.1.2007 - fls. 705 a 710 - negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.

*** De novo inconformados recorreram os RR. para este Supremo Tribunal e nas alegações formuladas o Réu CC O recurso dos RR. AA e marido BB foi julgado deserto por falta de alegações.

formulou as seguintes conclusões: 1ª- Conforme se constata da fundamentação para as respostas aos quesitos 30 e 31 da BI, o Tribunal alicerçou a sua convicção em prova indirecta e em presunção.

  1. - E não atentou que os RR. BB e mulher AA (vendedores) não são familiares do apelante (comprador).

  2. - Que o apelante CC não tem relações de proximidade com estes RR, já que vive e está emigrado no Canadá, desde há mais de 15 anos.

  3. - Deslocando-se ao nosso País cerca de um vez por ano, onde permanece por "períodos muitos curtos", conforme supra referiram as testemunhas nos depoimentos transcritos, mormente AM.

  4. - Daí que inexistam as relações de convivência com os RR. BB e mulher, que o Tribunal fez consignar na fundamentação das respostas àqueles quesitos.

  5. - A procuração da apelante passada ao seu pai para intervir na escritura de compra e venda foi emitida no Canadá, em Agosto de 2.001.

  6. - Ou seja, em data anterior não só à execução n°446/2.001 identificada na alínea d) da sentença recorrida (15/10/2001) como também à procuração que foi aí emitida a favor do Dist°. Mandatário da apelada para nela intervir (11.10.2001).

  7. - As testemunhas da apelada nem sequer conhecem o apelante, conforme declararam em Tribunal.

  8. - O Tribunal apesar de fundamentar as respostas aos quesitos 30 e 31 com o facto dos RR. BB e mulher irem para Angola, não consignou os motivos porque o fazia, nomeadamente se o fazia para fugir, sem pagar á apelada, se para prosseguir os negócios que já detinha com esse País.

  9. - Aliás, a testemunha José .... (referida na fundamentação das respostas aos quesitos) - e conforme se transcreveu supra referiu expressamente que o R. BB ia para Angola por causa dos negócios que aí detém, sendo seu sócio, e que foi ele próprio quem o aconselhou a vender o imóvel dos autos.

  10. - Também o Tribunal, apesar de fazer consignar como fundamentação para as respostas aos quesitos 30 e 31 da BI, não atentou que a dívida referida na escritura de compra e venda (estranha, contudo, aos presentes autos) encontra-se paga, conforme a apelada sabe (cfr. arts. 12 e 13 da contestação do apelante e doc. nº6 junto nessa peça processual).

  11. - Em relação às eventuais dívidas da sociedade "Isocar" de que o Réu BB foi sócio gerente, o Tribunal não apurou nem consignou se as mesmas eram da responsabilidade solidária deste.

  12. - O genro dos RR. jamais viveu com estes, conforme a recorrida, em desespero de causa, procurou fazer crer.

  13. - Não se vislumbra, nem alcança, qual seria o interesse ou intenção do recorrente em se colocar na situação de má fé prevista no art. 612º do Código Civil, correndo os riscos daí inerentes, uma vez que pagou o preço de 25.000.000$00 pelo imóvel efectivamente comprado (cfr. respostas aos quesitos 32 e 37 da BI).

  14. - Este valor de 25.000.000$00 que os RR. BB e mulher, mesmo tendo pago uma dívida de 5.000.000$00 à testemunha, (seu genro), JJJ, era mais que suficiente para satisfazer a eventual dívida á apelada (e que o apelante desconhecia).

  15. - O negócio da venda, e os seus pormenores, foi celebrado no Canadá entre o apelante e os RR. BB e mulher.

  16. - Os laços de terceiros, nomeadamente o facto de o seu irmão ser genro destes RR. e, consequentemente o seu pai, compadre, não são de molde a concluir-se pela existência de relações de afinidade, convivência e proximidade entre o apelante e estes RR.

  17. - Ou de que, por isso, o apelante CC tinha conhecimento dos factos constantes dos quesitos 30 e 31 da BI.

  18. - As regras da experiência, da lógica e da normalidade das coisas podem permitir - e obviamente que no caso dos autos, permitem - uma conclusão diversa da que foi tomada pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, mormente se se entender que os 1°s. RR. BB e mulher teriam optado por uma situação silenciosa e de segredo sobre as suas vidas (económico-financeiras), escondendo essa situação das pessoas, inclusive das que lhe são mais próximas, mesmo que por amizade ou outra razão, evitando o seu constrangimento, vergonha e aflição psíquica, procurando evitar arrastá-los para situações de que venham a ter prejuízos e problemas, inclusive judiciais, económicos e materiais.

  19. - No caso dos autos o Tribunal não se pronunciou sobre esta questão assim vertida, nem fez constar o inverso, ou seja de que os 1°s. RR. falariam sobre a sua vida privada, apesar dos...

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