Acórdão nº 07P2300 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução05 de Julho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. O Tribunal Colectivo de Almada (proc. n.º 1123/05.5 GAALM, 1.º Juízo Criminal), por acórdão de 4.1.2007, condenou o arguido AA, como autor de 2 crimes de roubo do art. 210.º, n.°s 1 e 2 al. b) com referência ao art. 204 n.° 2 al. f) todos do C. Penal na pena, para cada um deles, de 2 anos e 6 meses de prisão; De 1 crime de coacção sexual, na forma tentada, dos art.ºs 163.º, n.º 1, 22.º, 23.º, 72.º e 73.º, todos do C. Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; De 1 crime de roubo do art. 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b) com referência ao art. 204.º, n.º 2 al. 1) do C. Penal, na forma tentada, art.ºs 22.º, 23.º, 72.º e 73.º do C. Penal, na pena de 14 meses de prisão.

    Pela prática de um crime de violação do art. 164.°, n.° 1 do C. Penal, a pena de 6 anos de prisão.

    Operando o cúmulo jurídico de penas parcelares, ao abrigo do preceituado no art. 77.º e 78° do C. Penal, aplica-se ao arguido AA a pena única de 8 anos de prisão.

    Inconformado, recorre o arguido para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação: A) A aplicação do Regime Especial dos Jovens Adultos consagrado no DL 401/82, não é afastada pelo facto do crime ser cometido sob a forma tentada; B) A decisão, voluntária e sem intervenção de terceiros, de não praticar um crime, constitui desistência jurídico-penalmente relevante determinando que a tentativa não seja punível, nos termos do disposto no artigo 24.º do CP.

    1. Os factos provados sob os números 44 e 45 determinam que no caso do crime de roubo sob a forma tentada, é de entender ter havido desistência relevante para efeitos de aplicação do artigo 24.º do CP.

    2. Pelo que o arguido não deverá ser punido por esse crime.

    3. Assim não se entendendo, sempre será aplicar ao arguido quer quanto ao crime de roubo sob a forma tentada e quer quanto ao crime de coacção sexual sob a forma tentada a atenuação especial resultante da aplicação do artigo 23.2 do CP e a atenuação especial resultante do Regime Especial dos Jovens Adultos.

    4. É, ainda, de considerar no cálculo da medida concreta das penas a aplicar por cada criem cometido, as circunstâncias atenuantes especiais que possam ser relevadas no âmbito do disposto no artigo 72° do CP mesmo quando houve lugar a atenuação especial determinada pela aplicação do artigo 23.2 do CP e do Regime Especial dos Jovens Adultos.

    5. São circunstâncias atenuantes que determinam a aplicação do disposto no artigo 72 do CP, o arrependimento sincero; a assunção da sua responsabilidade e consciência da gravidade dos actos por si praticados; as condições que caracterizaram o crescimento do arguido desde os 12 anos: pai bêbado; violências físicas e psicológicas, fome e frio, inexistência de centro de referência de que resultasse a transmissão /incorporação de valores e princípios e que garantisse o acompanhamento e vigilância do arguido na fase juvenil e que redundou no abandono do arguido à sua sorte, existindo apenas a presença da mãe que por força das circunstâncias e como os factos vieram a demonstrar foi insuficiente, a espontaneidade em indemnizar a ofendida BB pelos danos causados.

    6. Provados nos autos os factos referidos sob os pontos 59 a 74 que aqui se dão por reproduzidos, com a devida vénia, nomeadamente, o arrependimento sincero; o meio social em que o arguido cresceu e as agressões de que foi vitima; o abandono a que o arguido foi votado desde os 12 anos de idade, a fome e o frio que tantas e tantas vezes passou; a inexistência de referência de valores porque se pudesse guiar, a reparação assumida dos danos causados à ofendida BB, deveriam ter sido especialmente atenuadas as penas aplicadas ao arguido.

      1) Do atrás exposto resulta que: - o arguido não deveria ter sido punido pela prática do crime de roubo sob a forma tentada, ao abrigo do disposto no artigo 24 do CP.

      - pelo crime de coação sexual não deverá ser aplicada ao arguido pena de prisão superior a oito meses de prisão, - por cada um dos crimes de roubo, não deverá ser aplicada ao arguido pena de prisão superior a um ano e meio de prisão; - pelo crime de violação não deverá ser aplicada pena de prisão superior a quatro anos J) Ao arguido não deverá ser aplicada pena de prisão superior, em cúmulo, a seis anos de prisão efectiva.

    7. O douto acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 24°, 72°, 73° e o DL 401/82, de 23.09.

    8. Votar o arguido a uma pena de prisão de 8 (anos) - não obstante a gravidade dos crimes por este praticados - é aniquilar as suas possibilidades de reinserção social em tempo útil, de potenciar a sua formação moral, social e profissional e, sabendo o sistema prisional que infelizmente temos, atenta a tenra idade do arguido é determinar a sua perda mais que provável.

      Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o Mui douto suprimento de V.ªs Exªs, deverá o recurso interposto pelo arguido AA ser julgado procedente por provado e em consequência revogar-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que condene o arguido pela prática de um crime de coacção sexual sob a forma tentada, dois crimes de roubo e um crime de violação em pena única, nunca superior a seis anos de prisão, certos que assim se fará, Justiça.

      Respondeu o Ministério Público junto do Tribunal recorrido que concluiu: 1ª Mostra-se acertada a pena unitária, de oito anos de prisão aplicada, atento os crimes e as suas molduras penais, em abstracto.

      1. É de aceitar a aplicação, ainda que generosamente, ao arguido, o regime especial de jovens adultos, no que concerne aos crimes consumados.

      2. Não é aplicável, como o pretende o recorrente, aplicar atenuação especial sobre atenuação especial, 4ª Não o permite, desde logo o nº 3° do art. 72.º do Cód. Penal. Termos em que os crimes tentados que o arguido praticou, por beneficiaram já de uma atenuação especial (cfr. art. 23° n°2 do Código Penal) não podem beneficiar de outra, designadamente as supra referidas.

      3. Donde, em tais circunstâncias como é a dos autos, só poderá beneficiar das atenuantes gerais, designadamente as previstas no art. 71°, do Código Penal, como o fizeram os mui ilustres elementos do Colectivo 6ª Termos em que deve manter-se o julgado, declarando-se a improcedência do recurso.

      Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça a 12.6.2007, teve vista o Ministério Público.

      Colhidos os vistos legais, teve lugar a audiência, pelo que cumpre conhecer e decidir.

      2.1.

      E conhecendo.

      Importa começar por reter a factualidade apurada pela 1.ª Instância e que não vem impugnada. É ela a seguinte: Factos provados: 1- No dia 23 de Março de 2005, pelas 20h20, BB caminhava a pé na rotunda de acesso à Discoteca ‘Mister Gay", na Sobreda da Caparica quando viu o arguido, que se fazia transportar num bicicleta de cor vermelha, que passou por si sem nada lhe dizer.

      2- Mais à frente, quando já se encontrava no largo do Circo, na Sobreda da Caparica, o arguido surgiu atrás de si e, exibindo-lhe uma faca, disse-lhe que "era um assalto, que lhe desse a mala".

      3- Contudo, a BB não concordou em entregar-lhe a mala e segurou a mata que levava contra si, para evitar que o arguido a levasse.

      4- Verificando que a BB não pretendia entregar-lhe a mala, não sendo suficiente a mera exibição da faca, com a mesma cortou a alça da mala e tentou apoderar-se dela.

      5- No entanto, a BB continuou a segurá-la e a opor-se à apropriação da mala pelo arguido, tendo-lhe puxado pelos colarinhos do fato de treino que tinha vestido.

      6- Então, o arguido encostou-lhe a faca ao peito e ao braço que segurava a mal, dizendo-lhe que a matava, enquanto simulava que a cortava com ela.

      7- Como, ainda assim, a BB continuava a segurar a mala, o arguido, já desesperado com a oposição da ofendida, agarrou-lhe no braço e deu-lhe uma dentada no pulso esquerdo, enquanto lhe dava fortes puxões de cabelo.

      8- Face a estas agressões a ás dores que lhe provocou a BB não conseguiu continuar a segurar a mala e o arguido, puxando-a levou-a consigo fazendo-a sua.

      9- No interior da mala, encontrava-se um telemóvel marca "Nokia 3310", no valor de 60 Euros, vários documentos pessoais, as chaves de casa, um relógio de bolso em prata, um canivete e uma bolsa com várias moedas, tudo em valor que não se logrou apurar.

      10- Enquanto o arguido tentava apoderar-se da mala, a ofendida logrou retirar-lhe o gorro de lã que aquele trazia colocado na cabeça, pelo que lhe viu o rosto com nitidez.

      11- No dia 19 de Maio de 2005, pelas 00h15, CC caminhava a pé pela Rua do Facho, no Monte da Caparica, quando se apercebeu que o arguido se aproximou dela, pela retaguarda, e lhe disse que ficasse quieta pois tinha uma faca em seu poder.

      12- Com efeito, o arguido apontava àquela uma faca de cozinha com cerca de 30 cm de comprimento e em simultâneo dizia-lhe para ir com ele e lhe dar um beijo, enquanto tentava beijá-la e apalpá-la em várias partes do corpo e aproximar-se do corpo da CC.

      13- Pedindo-lhe que parasse com tal atitude e dando-lhe empurrões a CC tentava afastar-se dele, para evitar qualquer contacto físico com o mesmo.

      14- No entanto, porque ficasse aborrecido com tal reacção, o arguido deu um empurrão à CC que a fez embater de encontro um veículo automóvel que se encontrava no local.

      15- Enquanto se encontrava encostada contra o veículo o arguido agarrou na mala que aquela trazia a tiracolo e puxou-a, não tendo conseguido retirá-la porque a CC a segurou contra si.

      16- O arguido cortou então a alça da mala com a faca, mas a CC deu-lhe um soco na face e desferiu-lhe um pontapé entre as pernas para evitar que ele a levasse.

      17- Já irritado com a resistência da CC em segurar a mala e com as agressões, e arguido agarrou na mão direita da CC e deu-lhe uma dentada, bem como, pegando na faca atingiu-lhe a mão com a lâmina, tendo-lhe provocado alguns cortes.

      18- Desferiu ainda vários cortes na mala até que conseguiu apoderar-se dela, tendo de seguida f em passo de corrida, fazendo-a sua, bem como os objectos que tinha no seu interior.

      19- No interior da mala, a CC tinha o seu telemóvel de marca Samsung A 800, no valor de 180...

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