Acórdão nº 07P2303 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução04 de Julho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "AA" e BB vieram interpor recurso da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que julgou procedente o recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência condenou o primeiro na pena de quatro anos e dez meses de prisão pela prática de um crime previsto e punido no artigo 25 do Decreto Lei 15/93.Pela prática da mesma infracção o segundo arguido foi condenado na pena de cinco anos e seis meses de prisão.

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões das respectivas motivações de recurso onde se refere que: Arguido AA 1- Em sede de 1ª Instância procedeu-se a julgamento, tendo o Tribunal Colectivo proferido Acórdão que julgou parcialmente procedente a acusação e absolveu o arguido quanto à prática do crime p. e p. pelo art. 21°, n° 1 do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro.

2 - Pelo que foi condenado o ora recorrente como autor material do crime p. e p. pelo art.º 25°, al. a), do Decreto-lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 2 anos, onze meses e vinte e cinco dias de prisão em lª Instância.

3 - No entanto, veio o Ministério Público recorrer deste Acórdão., por entender que o mesmo violou o disposto no art. 21°, n° 1, do Dec. Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.

4 - Entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa absolver o arguido CC do crime p. e p. pelo art. 25°, al. a), do Decreto-lei 15/93, de 22 de Janeiro, que vinha condenado em sede de III Instância na pena de 3 anos e nove meses de prisão e conceder provimento ao recurso do MP condenando o aqui recorrente na pena de 4 anos e 10 meses de prisão, pela prática de um crime p. e p. pelo art° 21, nº 1. do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro (mais dois anos que a condenação em sede de primeira instância).

5 - O arguido tem plena consciência de que não é rigorosamente primário e, bem assim, da gravidade da apurada conduta dele, reflectida quer na ilicitude dos actos por si praticados quer na consequente dosimetria penal.

6 - Mas sabe identicamente que não respondeu (também) pelos seus antecedentes penais e mais prementemente, ainda, que tem direito a uma correcta avaliação e ponderação do pleito.

7 - Ora, se o Tribunal da Relação entende que ... "Em síntese-resulta da prova produzida tão só que ao arguido Vilar foram apreendidas duas balanças de precisão e que o teor das conversas poderá ser relativo à transacção de produtos estupefacientes, ou a qualquer outra actividade ilícita".

O que, é manifestamente insuficiente para a condenação do arguido, nos termos em que ocorreu quanto ao crime de tráfico de estupefacientes (sublinhado nosso) absolvendo-o do crime pelo qual foi condenado - art. 25°, al. a) do DL 15/93, de 22/01, não entende o recorrente porque razão este juízo critico da prova a este não se aplica, uma vez que não se logrou provar em qualquer momento dos autos se o arguido AA se dedicava à venda a terceiros de produto estupefaciente.

8 - Repare-se que nem mesmo foi considerado pertinente para os autos a realização de Busca domiciliária à casa do arguido AA.

9 - Em matéria de apreciação da prova em julgamento, vigora o princípio "in dubio pro reo "/ tal significa que "em caso de dúvida razoável" após produção de prova, o resultado desta tem de actuar em sentido favorável ao arguido - neste sentido, Figueiredo Dias, Direito Processual Penal,1974. pág. 215.

10 - Dos autos apenas se pode concluir pelas características e pelos meios utilizados pelo arguido AA, bem como pela quantidade de estupefaciente a este apreendida por uma ilicitude menor do que a que caracteriza o crime-tipo do art. 21 do supra citado diploma legal.

11 - O recorrente à data dos factos era consumidor de estupefacientes.

12 - Em 11/07/2003, após combinação prévia, o arguido BB e o arguido AA encontraram-se na Gare do Oriente, em Lisboa cerca das 21h30.

13 - Nesse local o arguido BB entregou ao arguido AA duas embalagens em plástico, envoltas em papel de alumínio e fita gomada castanha, as quais continham, no seu interior, na totalidade 11,313 gramas de cocaína.

14 - Após esse encontro, veio o arguido AA a ser surpreendido com tal cocaína em seu poder.

15 - Não mais se logrou apurar quanto ao arguido AA.

16 - Sendo o recorrente um traficante-consumidor, teremos de equacionar a aplicação normativa do artigo 26° do Decreto-Lei 15/93, com a epígrafe "traficante-consumidor", destinado exclusivamente para aqueles que se recorrem do tráfico para fazerem face à sua toxicodependência.

17 - Acontece porém, que, o legislador "esqueceu-se" de englobar aqueles que o infortúnio da vida, por uma ou outra razão, se tomam toxicodependentes de grande consumo, limitando a aplicação deste preceito legal àqueles que detiverem produto estupefaciente que não exceda o consumo médio individual durante o período de cinco dias.

18 - Parece-nos pois, pelo exposto, e com o devido respeito por opinião diversa, que o crime dos autos é o do artigo 25° e não outro.

19 - Repare-se que os meios utilizados reduzem-se ao vulgar telemóvel, uma vez que nem veículo automóvel o recorrente possuía.

20 - A ausência absoluta de sinais exteriores de riqueza e qualquer outro indicio de que efectivamente se dedicava em exclusivo ao tráfico de estupefaciente.

21 - A aplicação de uma pena de prisão nunca superior a dois anos de prisão, suspensa na sua execução, será ajustada ao caso em apreço.

22 - O recorrente já cumpriu dois anos onze meses e vinte e cinco dias de prisão preventiva, que possibilitaram a sua total recuperação da dependência de substâncias psicotrópicas.

23 - O Recorrente encontra-se a trabalhar, garantindo desta forma melhor qualidade de vida à sua esposa e filho menor.

24 - Assim, permitir-se-á, sem prejudicar a sua liberdade fazer-se a Justiça, adequando-se a medida da culpa à pena.

Arguido BB 1. O recorrente foi, por decisão do T.R.L., condenado a 5 anos e 6 meses de prisão efectiva.

  1. Pecou o acórdão recorrido por não ter tomado em conta a doença de que padecia o arguido.

  2. Na verdade, o arguido sofria de toxicodependência, motivo pelo qual levou a cometer actos que consubstanciaram o crime por veio agora condenado.

  3. Tal facto ficou provado, como demonstra o acórdão de 1ª instância.

  4. Apenas sopesaram na douta decisão recorrida, o registo criminal do arguido e a quantidade de produto estupefaciente apreendido. que não sendo diminuída também não é certamente elevada tendo em conta a sua toxicodependência.

  5. Os 38 meses de prisão preventiva a que fora sujeito possibilitaram o tratamento e a recuperação da sua dependência de substâncias psicotrópicas. Não só procurou apoio na organização "Desafio Jovem" mas como procurou também novos desafios ingressando na aprendizagem do ofício de tecelão, dentro do E.P.

  6. A sua vida resume-se agora ao trajecto casa-trabalho-casa, tentando recuperar o tempo que desperdiçou com o consumo de estupefacientes, junto da sua família.

  7. Há muito que o recorrente disse não às drogas, e também há muito que o recorrente em liberdade poderia ter tido contacto com elas, mas não o fez.

  8. Segundo a doutrina da prevenção especial positiva, a medida da necessidade de socialização do agente é o critério decisivo das exigências de prevenção especial. Tudo depende da forma como o agente se revelar, carente ou não de socialização.

  9. 0 recorrente não se encontra carente de socialização porque tem o apoio a nível moral (da sua família) e profissional dado que é sócio numa empresa de Serralharia, tendo, felizmente, trabalho assegurado.

  10. É uma pena justa aquela que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa.

  11. A aplicação de uma pena de prisão mínima (4 anos de prisão), será de todo ajustada ao caso em discussão. O recorrente já cumpriu 38 meses de prisão preventiva (3 anos e 2 meses), que possibilitaram a recuperação total da sua dependência de substâncias ilícitas e o consequente ingresso no mundo do trabalho.

  12. Aliás, não conhece a Defesa maior factor ressocializador que o próprio trabalho.

  13. Assim, permitir-se-á, sem prejudicar a sua Liberdade, fazer-se Justiça, adequando-se a medida da culpa à pena.

Respondeu o Ministério Público propondo a confirmação da decisão recorrida.

Nesta instância o ExºMº Sr.Procurador Geral Adjunto pronunciou-se pela forma constante de fls.

Os autos tiveram os vistos legais.

Cumpre decidir.

Em sede de decisão recorrida encontra-se provada a seguinte factualidade: 1) no dia 28/3/2003, cerca das 15H00, o arguido CC conduzia a sua viatura, matrícula PG, tendo parado a mesma em frente da pastelaria "....", sita na Avenida João XXI, em Lisboa; 2) nesse local, encontrou-se com um indivíduo, cuja identidade não foi possível apurar, a quem entregou algo que retirou da mala do veículo onde se fazia transportar; 3) no dia 30/4/2003, após combinação prévia, via telefone, o arguido CC, seguindo na viatura de marca Fiat, modelo...

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