Acórdão nº 96P1445 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Maio de 1997
Magistrado Responsável | BESSA PACHECO |
Data da Resolução | 08 de Maio de 1997 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
PROCESSO N. 1445/96 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. No Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras, sob a acusação do Ministério Público, responderam os arguidos A e B, identificados nos autos, tendo os mesmos, por acórdão de 10 de Novembro de 1993, sido condenados, respectivamente: a) - o arguido A, como autor de um crime de violação previsto e punido pelo artigo 201, n. 1, do Código Penal de 1982, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão; b) - a arguida B, como autora, por convolação, de dois crimes previstos e punidos pelo artigo 144, n. 2, do mesmo Código (ofensas corporais, com dolo de perigo): - pelo crime cometido em 4 de Abril de 1992: na pena de 4 meses de prisão, substituídos por igual tempo de multa à taxa diária de 500 escudos, com a alternativa de 80 dias de prisão; - pelo crime cometido em 14 de Maio de 1992: na pena de 6 meses de prisão substituída por igual tempo de multa à mesma taxa, com a alternativa de 4 meses de prisão; - em cúmulo jurídico destas penas parcelares, na pena única de 150000 escudos de multa, e, em sua alternativa, em 200 dias de prisão. O A requereu a sua constituição como assistente ainda na fase de inquérito, mas, certamente por lapso, só veio a ser admitido como tal, na sua qualidade de ofendido, depois de proferido aquele acórdão, no mesmo dia da prolação deste. Daquele acórdão interpuseram recurso o Ministério Público, o arguido A (como tal e como assistente) e a B, como assistente, tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 31 de Maio de 1995 (de folhas 507 e seguintes), concedido parcial provimento ao recurso do A, determinando o reenvio do processo para novo julgamento para os fins consignados nesse acórdão (no ponto 3.4.1., alínea g)) e apenas estes, motivo porque não conheceu dos recursos interpostos pelo Ministério Público (quanto ao fundo) e pela ofendida B. Realizado novo julgamento pelo Tribunal de Círculo das Caldas da Rainha, proferiu-se o acórdão de 8 de Outubro de 1996 (de folhas 639 e seguintes), em que se decidiu condenar a arguida B, como autora material de dois crimes de homicídio privilegiado, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições combinadas dos artigos 133, 22, 23 e 74 do Código Penal de 1982, nas penas de 10 meses de prisão (pelo crime cometido no dia 4 de Abril) e 18 meses de prisão (pelo crime cometido no dia 14 de Maio), e, em cúmulo jurídico dessas penas, na pena única de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução foi declarada suspensa pelo período de 3 (três) anos. Mais foi decidido nesse acórdão declarar perdidas a favor do Estado as espingardas caçadeiras utilizadas no cometimento dos crimes, condenando-se a dita arguida a pagar aos respectivos proprietários o seu valor (10000 escudos, relativos à arma do primeiro crime; 15000 escudos, relativos à arma do segundo crime). Deste último acórdão interpôs recurso o A, na sua qualidade de assistente, formulando na respectiva motivação estas conclusões: 1. - Ambos os crimes cometidos pela arguida integram a forma mais grave e intensa de dolo, isto é, o dolo directo. A decisão recorrida, ao integrar a conduta da arguida como sendo realizada com dolo eventual, violou, por não aplicação, o disposto no n. 1 do artigo 14 do Código Penal de 1982; 2. - Não deve ser considerada a circunstância atenuante modificativa da "emoção violenta", porquanto ela não se patenteia na conduta da arguida B; 3. - A conduta da arguida integra, quanto a ambos os crimes, na forma tentada, dois homicídios qualificados, e não privilegiados. Encontra-se assim violado, por não aplicação, o disposto no artigo 132 do Código Penal de 1982. Responderam o Excelentíssimo Procurador da República junto do Tribunal do Círculo das Caldas da Rainha, bem como a arguida B - concluindo que devia ser mantido integralmente o acórdão recorrido. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto que subscreveu o parecer de folhas 725 e seguintes nada opôs ao conhecimento do recurso. Alegaram por escrito o recorrente A e um dos Excelentíssimos Procuradores-Gerais Adjuntos neste Supremo. O recorrente concluiu que a arguida devia ser condenada, quanto ao segundo atentado, como autora de um crime de homicídio qualificado. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto defendeu que devia ser mantido o acórdão. Colhidos os vistos devidos, cumpre apreciar e decidir. II - O tribunal colectivo deu como provados os factos que se passam a reproduzir por fotocópia, extraída do acórdão recorrido. Em dia incerto do mês de Março de 1992, pelas 12 horas, a B caminhava por uma estrada vinda de casa dos seus pais, sito em Casal das Alvores, Aldeia Galega da Merceana, para a sua residência, em Folgorosa, Maxial, Torres Vedras. Quando passava por um local com densa vegetação surgiu-lhe de repente o A, que se aproximou dela e lhe apontou uma pistola, cujas características se não conseguiram apurar, ao mesmo tempo que lhe dizia "há tanto tempo que andava para te apanhar, mas hoje é que tem de ser". A B tentou então fugir, mas o A agarrou-a e deitou-a ao solo. Depois, deitou-se sobre ela, puxou-lhe as cuecas e os "collants" para baixo e, acto contínuo, puxou as suas calças e cuecas também para baixo introduzindo-lhe seguidamente o pénis erecto na vagina ejaculando depois no interior desta assim satisfazendo a sua lascívia. Vestiu-se, em seguida, o A e intimidou a B, dizendo-lhe que a matava se ela contasse a alguém o que se havia passado. O arguido agiu livre e consciente, ciente da reprovabilidade da sua conduta. No dia 4 de Abril de 1992, de manhã cedo, a B escondeu-se numa mata, próximo da residência de A em Folgorosa, Maxial, Torres Vedras, aguardando que este saísse de casa. A B havia-se munido previamente de uma arma de caça, de calibre 12 milímetros, marca Liège, melhor examinada a folha 15...
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