Acórdão nº 94P025 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 1996

Data18 Janeiro 1996
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1 - Os Estados Unidos da América, através da sua Embaixada em Lisboa, solicitaram a Portugal a extradição do cidadão brasileiro A, afim de aí ser julgado sob acusação de prática de crimes de tráfico de estupefacientes (no caso, cocaína), do Brasil para o Estado requerente, constituídos por factos praticados entre 1974 e 1987, previstos e puníveis nos termos do United States Code, artigos 841 (a) (1), 846, 952 e 963, pelos quais havia sido pronunciado por um júri de instrução de Nova Iorque. Aos referidos crimes corresponde pena de prisão com limite mínimo de 10 anos e máximo de prisão perpétua, mas o pedido informou que a pena normal para o tipo de crimes era de entre cinco e dez anos, que até ao presente ninguém fora condenado à pena de prisão perpétua e que, no caso vertente, o Governo não pedirá uma pena de prisão perpétua. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa promoveu o cumprimento do pedido, entendendo que, não obstante o disposto na alínea c) do n. 1 do artigo 6 do Decreto-Lei n. 43/91, de 22 de Janeiro, a extradição deveria ser concedida por a alínea c) do n. 2 daquele artigo referir que, ainda nesse caso, se deve manter a cooperação se o auxílio solicitado se fundar na relevância do acto para presumível não aplicação da pena de prisão perpétua e existir nos autos garantia diplomática de que não seria pedida condenação nessa pena. O extraditando deduziu oposição ao pedido, alegando a inconstitucionalidade da alínea c) do n. 2 do citado diploma legal e ainda que fora absolvido dos mesmos crimes no Brasil, e invocando o princípio ne bis in idem, com consagração constitucional. Por acórdão de 10 de Maio de 1994, o Tribunal da Relação de Lisboa deferiu a pedida extradição, considerando que a alínea c) do n. 2 do artigo 6 do Decreto-Lei 43/91 e o facto de o artigo 33 da Constituição da República Portuguesa, só proíbem a extradição por crimes a que corresponde pena de morte, quanto àquela alínea perfilhando a interpretação do Ministério Público, segundo o qual nada obstaria à extradição e estaria afastada qualquer eventual inconstitucionalidade. Desse acórdão recorrem o extraditado para este Supremo Tribunal, invocando a impossibilidade da extradição quando o país requerente preveja a pena de prisão perpétua para o tipo de crime que a fundamente e a inconstitucionalidade da referida alínea c) do n. 2 do artigo 6 do Decreto-Lei n. 43/91, quando interpretado como o fora pelo tribunal "a quo". O Ministério Público sustentou a confirmação do acórdão recorrido, invocando o conteúdo de documentos provenientes das autoridades dos Estados Unidos. Em face desses documentos, este Supremo Tribunal, avaliando a situação à luz do disposto no artigo 6, n. 1, alínea e) do citado diploma legal, considerou que o crime já não podia ser punível com prisão perpétua, ficando prejudicada a aplicação do n. 2, alínea c) desse artigo. Para o efeito, interpretou implicitamente aquele n. 1, alínea e) no sentido de que os factos e a correspondente moldura penal abstracta a ter em conta para decidir a extradição não eram os referidos inicialmente no processo mas sim os factos e a moldura penal abstracta pelos quais, por decisão do juiz, viria a ser efectivamente submetido a julgamento no processo instaurado nos Estados Unidos. Desse modo, negou provimento ao recurso, confirmando o deferimento do pedido de extradição, não sem ter considerado que não estava provada a identidade entre os factos a que respeita o presente processo em curso nos Estados Unidos e aquele que correu no Brasil e no qual o extraditando foi absolvido, daí que não pudesse concluir-se pela extinção do procedimento criminal. Mais uma vez inconformado, o extraditando interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, invocando a inconstitucionalidade da norma da alínea e) do n. 1 do artigo 6 do Decreto-Lei n. 43/91, tal como interpretada neste Supremo Tribunal. Pelo acórdão de folhas 767-786 dos autos, com data de 17 de Agosto de 1995, o Tribunal Constitucional concedeu provimento ao recurso, decretando que o acórdão recorrido deve ser reformado em conformidade com o juízo de inconstitucionalidade nele formulado. Este juízo de inconstitucionalidade reporta-se à mencionada alínea e) do n. 1 do Decreto-Lei n. 43/91, enquanto interpretado no sentido de não proibir a extradição em casos em que, embora os factos que a fundamentam sejam puníveis com prisão perpétua de acordo com a moldura penal abstracta prevista na lei, for previsível (ou certa) a sua não aplicação no caso concreto. O acórdão precisa o seguinte: "Excluiu-se, assim, do objecto do recurso a questão da inconstitucionalidade da mesma norma, quando interpretada no sentido de não proibir a extradição nos casos em que os factos a que ela respeita tenham sido já objecto de julgamento noutro país (violação do ne bis in idem), por a inconstitucionalidade desse acto normativo nunca ter sido questionado pelo recorrente, e por esse mesmo segmento normativo não ter sido verdadeiramente aplicado pelo S.T.J., que não reconheceu a existência fáctica entre o processo pendente nos Estados-Unidos e o processo já julgado no Brasil". 2 - Circunscrito o objecto do recurso à questão da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT