Acórdão nº 043130 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Maio de 1993

Magistrado ResponsávelTEIXEIRA DO CARMO
Data da Resolução19 de Maio de 1993
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam os Juizes da 1 subsecção criminal do Supremo Tribunal de Justiça: Em processo comum e perante o Tribunal Colectivo do Círculo de Portimão, foi submetida a julgamento, A, nascida a 22 de Dezembro de 1946, com os demais sinais dos autos, a qual era acusada pelo Ministério Público da prática de um crime de incêndio, em concurso real, com um crime de dano agravado, previstos e puníveis, respectivamente, pelos artigos 253, n. 1, e 308 e 309, ns. 1 e 3, alínea c) disposições estas do Código Penal. No final, o Colectivo, julgando procedente e provada a acusação, considerou a arguida autora de um crime de incêndio em concurso legal com um crime de dano agravado, previstos e puníveis nos artigos 30, n. 1, 253, n. 1, 308 e 309, ns. 1 e 3, alínea c), do Código Penal e, por via de tal, condenou-a na pena de 2 (dois) anos de prisão e em 100 (cem) dias de multa a 500 escudos por dia e, em alternativa desta, em 66 (sessenta e seis) dias de prisão. Nos termos do artigo 14, n. 1, alínea b), da Lei n. 23/91, foi perdoado à arguida um (1) ano de prisão e metade (1/2) da multa. Foi ainda a arguida condenada nas custas, fixando-se em 4 Ucs a taxa de justiça e a procuradoria em 1/3 de tal montante. Ordenou-se a remessa de boletins ao C.I.C.C. e o envio de cópias do mesmo acórdão ao Estabelecimento Prisional, Instituto de Reinserção Social e Direcção Regional de Agricultura do Algarve, bem como, finalmente, a passagem de mandados de condução ao Estabelecimento Prisional. Inconformados com a decisão, vieram interpôr recurso da mesma o Ministério Público e a arguida, tendo-o feito esta última logo em acta, através do seu Defensor Oficioso. Foram admitidos tais recursos e as respectivas motivações foram apresentadas tempestivamente. O Ministério Público, na sua motivação e em sede conclusiva, aduz o seguinte: - Com a conduta por si havida, incorreu a arguida Rosa Maria na prática de um crime de incêndio previsto e punido pelo artigo 253, n. 1, em concurso real, com o crime de dano agravado previsto e punido pelo artigo 309, ns. 1 e 3, alínea c), com referência ao artigo 308, todos do Código Penal, não se encontrando os referidos preceitos numa relação de consumpção, de sorte que o que pune o incêndio, porque mais amplo, absorve o que proíbe o dano; - Sendo de perigo comum o crime do artigo 253 do Código Penal e de dano o previsto no artigo 309 do mesmo Diploma, ao invés do que se entendeu no acórdão, são diversos os bens jurídicos tutelados por uma e outra das normas, já que enquanto o primeiro visa proteger a vida, a integridade física ou bens patrimoniais de grande valor, o segundo - o de dano agravado - tem por objectivo acautelar, independentemente do valor, determinadas coisas ou que o dano seja produzido por certos meios, e designadamente mediante uso de substâncias inflamáveis ou explosivas; - O preceito incriminador do artigo 309, ns. 1 e 3, alínea c) do Código Penal destina-se a punir, não o dano resultante do incêndio em si, mas as situações em que os danos, embora resultantes directamente do incêndio ou da explosão, foram causados ou agravados pelo emprego de substâncias inflamáveis ou explosivas, situação esta, de resto prefigurada no caso dos autos em que a arguida, com o objectivo de destruir documentação que lhe era desfavorável, provocou incêndio, usando de substâncias inflamáveis a que ateou o fogo, criando, com esta actuação sua, um perigo para os bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado, que sabia constituírem o recheio das instalações da Direcção Regional de Agricultura do Algarve e bem assim para estas, que são constituídas por madeira; - Logrando concretizar esse seu propósito primeiro, posto que arderam processos e documentação, foram tais danos, resultantes do incêndio em si, ainda agravados, já que propagando-se o fogo, foram por ele directamente destruídos outros bens, como mobílias, carpetes, telefones, o que sendo de verificação e até inevitável, face à natureza dos produtos inflamáveis, dos materiais de que são feitos aqueles bens, representava-se obviamente perceptível para a arguida que, não se abstendo de prosseguir na sua actuação, conformou-se com a verificação de tal resultado, aceitando-o, preenchendo-se, assim, na conduta tida pela arguida, os tipos legais, objecto de previsão nas normas dos artigos 253, n. 1, e 309, ns. 1 e 3, alínea c), este com referência ao artigo 308, todos do Código Penal; - Com dolo (directo e eventual, respectivamente) agiu a arguida no que se refere a um e outro dos ilícitos; - Pela prática, em concurso real, dos aludidos crimes deverá, pois, a arguida ser condenada, cumulando-se as respectivas penas parcelares; - A culpa com base na qual se imputa o crime de incêndio (em que se prevê, a par das condutas intencionais, o causado por negligência) não se contem necessária e integralmente no crime de dano (actualmente punível apenas quando fôr intencionalmente causado) no dano (agravado) prevê-se apenas e tão só a conduta intencional do agente virada para a danificação de determinadas coisas ou usando de meios inflamáveis ou explosivos. Em suma, a Excelentíssima Magistrada recorrente, limitando o seu recurso à parte da decisão em que considerando não serem de punir autonomamente os crimes de incêndio e de dano agravado, porquanto se entendeu encontrarem-se as respectivas disposições legais numa relação de consumpção, impetra a revogação do acórdão recorrido, substituindo-se por outro que condene a arguida, em concurso real, como autora dos aludidos crimes de incêndio e de dano agravado. Decidindo-se, como se decidiu, foram violadas as normas dos artigos 30, n. 1, 253, n. 1, e 309, ns. 1 e 3, alínea c), este com referência ao artigo 308, todos do Código Penal, por deficiente interpretação, conclui a Recorrente. Relativamente ao recurso interposto pela arguida, adiantar-se-à que a mesma, na sua motivação e em sede conclusiva, impetra que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que lhe suspenda a execução da pena que lhe foi imposta, pelo período julgado conveniente, sendo tal suspensão condicionada ou não. Para tanto, invoca que, no caso em análise, verificado que o dolo e a culpa não são intensos, que a arguida assume a sua própria culpa e confessa espontaneamente os factos, que está física e psicologicamente diminuída e debilitada, que as necessidades de prevenção e reprovação são moderadas, que tem um ambiente familiar favorável à sua reintegração, com três filhos menores a seu cargo, que é primária e atentas as reconhecidas desvantagens das...

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