Acórdão nº 079124 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Junho de 1991
Magistrado Responsável | MOREIRA MATEUS |
Data da Resolução | 12 de Junho de 1991 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, em conferencia, no Supremo Tribunal de Justiça: A e B, na qualidade de administradores do condominio do predio sito na Rua ..., em Lisboa, propuseram a presente acção com processo ordinario contra C e mulher D, alegando em sintese: - os autores e os restantes condominos são os actuais proprietarios das varias fracções autonomas que constituem o predio acima referido, que os reus construiram e que, por escritura de 20/3/73, o reu marido submeteu ao regime de propriedade horizontal: - do predio faz parte uma cave com acesso independente pela via publica, correspondente ao n. 34 A, e que na escritura da constituição da propriedade horizontal ficou a constituir a fracção autonoma designada pela letra "Z", com a seguinte descrição - "cave, totalmente preenchida por uma ocupação; tem uma ampla divisão e escritorio"; - no entanto, tal cave tinha obrigatoriamente de destinar-se a parqueamento privativo dos condominos do predio e, portanto, a uso comum; - com efeito o predio foi construido num lote que os reus adquiriram, em hasta publica, a Camara Municipal de Lisboa, constando do respectivo regulamento entre outros, a condição de a cave se destinar "a estacionamento privativo", constando do projecto da construção que aquela autarquia aprovou que a cave se destinava a "estacionamento privativo dos condominos"; - e o mesmo consta do "acto de vistoria para utilização; que teve lugar no dia 20 de Junho de 1973; - da mesma forma, do acto de vistoria que teve lugar no dia 15 de Novembro de 1972, com vista a constituição da propriedade horizontal, consta que podiam constituir-se em fracções autonomas: sete habitações com tres divisões assoalhadas: catorze habitações com quatro divisões assoalhadas e uma ocupação com mais de 100 m2 (loja do res-do-chão): - constava ainda que deveriam considerar-se como partes comuns as que se acham discriminadas no artigo 1421 do Codigo Civil, figurando entre elas o ascensor, o monta-cargas, a habitação da porteira e o parqueamento da cave; - dai que o acto de constituição da propriedade horizontal seja nulo na parte em que estipulou a constituição da referida cave em fracção autonoma; - com efeito, foram violadas as disposições regulamentares a que estava sujeita a construção por força da venda em hasta publica, e que obrigavam a destinação da cave a um uso comum - ou estacionamento privativo; - foi ainda violado o Decreto-Lei n. 38382, de 7/8/51, que aprovou o Regulamento Geral das Edificações Urbanas, designadamente o paragrafo unico do artigo 3 e o artigo 8, e ainda o artigo 17 do Decreto-Lei n. 166/70, de 15 de Abril; - foram ainda violadas as disposições camararias que impõem a obrigatoriedade de os edificios com pelo menos oito pisos disporem de estacionamento de automoveis destinado aos utentes respectivos; - a cave em referencia não podia, portanto deixar de nomear o qualificativo de garagem, destinada a seu uso comum. E dai que, em conclusão, peçam que se declare a nulidade parcial da escritura de 20/3/73, na parte em que estipulou que a cave do predio constitui fracção autonoma, com a consequente alteração registral e integração da cave nas partes comuns do condominio. Devidamente citados os reus contestaram o pedido, começando por alegar que a questão debatida na presente acção estava igualmente em discussão noutra acção pendente no 11 Juizo Civel, o que importaria a sua absolvição da instancia ou, pelo menos, a suspensão da instancia nos termos do artigo 279 do Codigo de Processo Civil, e ainda que os autores haviam decaido noutra acção pendente no 10 Juizo Civel em que o pedido e a causa de pedir eram identicos aos da presente acção, o que integraria a excepção do caso julgado, acrescentando, em sede de impugnação, que o acto de constituição de propriedade horizontal, não violou qualquer dos preceitos legais apontados pelos autores, pelo que e inteiramente valido. E concluiram em conformidade. Na replica e na treplica as partes mantiveram e desenvolveram as suas posições anteriores. Findos os articulados foi proferido o despacho saneador onde, depois de se julgar improcedente a excepção do caso julgado e de se indeferir o pedido da suspensão da instancia, se conheceu imediatamente do merito da causa, que foi julgada inteiramente procedente. Interposto o competente recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa foi aquela decisão confirmada por acordão de folhas 203 e seguintes. E dai o presente recurso de revista em cuja alegação se formulam as seguintes conclusões: 1 - deve ser julgada procedente a excepção de litispendencia e os Reus, ora recorrentes, absolvidos da instancia (artigos 497, 498, 494, 1 alinea g), 493, n. 2 e 288, n. 1 alinea e) do Codigo de Processo Civil, ou, quando tal não seja entendido, 2 - deve ser suspensa a instancia nos termos dos artigos 276, n. 1, alinea c) e 279 do Codigo de Processo Civil; 3 - o acordão recorrido e nulo, nos termos da alinea b) do n. 1 do artigo 668 do Codigo de Processo Civil, aplicavel ex vi artigo 721, 2, 2 parte do mesmo Codigo, porque não especifica os fundamentos pressupostos de aplicação ao caso do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 10/5/89; 4 - deve a acção ser julgada improcedente, porque: a) não e requisito constitutivo da propriedade horizontal o destino ou utilização que cada condomino pretenda dar a sua fracção ou o destino que o conjunto dos condominos pretenda dar as partes comuns; b) os requisitos a que obedece a constituição da propriedade horizontal são os actualmente definidos nos artigos 1414 e 1415 do Codigo Civil; c) o destino fixado nas licenças camararias não decorrem necessasriamente consequencias quanto a natureza juridicional das partes do predio; d) e os apelantes afastaram a presunção (ilidivel) do n. 2 do artigo 1421, do Codigo Civil, por escritura da constituição do predio em propriedade horizontal de 20/3/73, celebrada no 4 Cartorio Notarial de Lisboa; e) as normas do Regulamento Geral das Edificações Urbanas disciplinam os requisitos tecnicos dos projectos de construção, as condições para que possam ser concedidas licenças de construção e habitação e as sanções para as infracções ao conteudo das licenças, não impõem, portanto, qualquer qualificação quanto a natureza juridica do predio; f) nem a vistoria municipal para constituição do predio em propriedade horizontal tira, nem tem que tirar, quaisquer conclusões quanto a natureza juridico-real das partes do predio, apenas tem que verificar se este tem ou não condições para ser dividido em fracções nos termos dos artigos 1414, 1415 e 1421, n. 1, do Codigo Civil: g) nem a utilização da fracção autonoma contra as normas camararias a transforma em parte comum, a não ser que se demonstre que a utilização requerida pela licença importa a natureza comum da fracção, o que não esta provado; h) nem e pela "transformação" da fracção autonoma em parte comum por sentença constitutiva que se garante a utilização conforme as prescrições camararias, ate porque isso não resolve os casos de persistencia da utilização irregular; i) as disposições do Regulamento Geral das Edificações Urbanas não são, pois, fundamento de anulação parcial do titulo constitutivo da propriedade horizontal; j) por outro lado, o assento não e aplicavel ao caso em apreço, pois ele pressupõe que o destino violador das normas camararias esteja exarado no titulo...
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