Acórdão nº 05575/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelBeato de Sousa
Data da Resolução14 de Maio de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência no 1º Juízo, 1ª Secção, do TCAS: RELATÓRIO O Ministério Público veio interpor recurso contencioso e pedir a declaração de nulidade da Resolução do Governo Regional dos Açores n.º 272/84, de 84.12.05, publicada no Jornal Oficial, I Série, de 84-12-18 e do Despacho do Secretário Regional da Economia dos Açores, de 92.10.06, contra os autores daqueles actos e contra a S..., esta como recorrida particular.

O Governo Regional dos Açores e o Secretário Regional da Economia dos Açores responderam conforme fls. 159 e seguintes, por excepção (extemporaneidade do recurso) e por impugnação.

A S...contestou por excepção (inexistência de causa geradora de nulidade e extemporaneidade do recurso) e por impugnação, conforme fls. 192 e seguintes.

O Ministério Público respondeu às excepções deduzidas, conforme fls. 246 e seguintes.

Em alegações o Recorrente formulou as seguintes conclusões: 1ª - Os actos recorridos autorizaram/licenciaram na Reserva Natural da Lagoa do Fogo (Açores) movimentos de terras, alterações ao relevo e ao coberto vegetal, perturbação das condições de calma e de silêncio, 2ª - Ofendendo o conteúdo essencial do direito fundamental ao ambiente e à qualidade de vida, 3ª - Sendo, por isso, os actos recorridos e consequenciais nulos e impugnáveis a todo o tempo, nos termos do preceituado pelos artigos 66° e 18°/1, da CRP; artigos 133°/2/d) e 134º/2 do CPA; artigos 5º/c) e f) e 8° do Decreto Regional (Açores) n.° 10/82/A, de 18 de Junho.

  1. - Consequentemente, é tempestivo o presente recurso contencioso.

  2. - Porque aqueles actos recorridos e consequenciais afrontam o estabelecido pelo n°1 do artigo 66° (ambiente e qualidade de vida) da CRP, é inconstitucional o artigo 8° daquele Decreto Regional n.º 10/82/A, interpretado como não integrando tais actos o conceito de "licenças" que nele se determina como "nulas e sem efeito".

Termos em que, e invocando o douto suprimento de V. Ex.as, deve declarar-se nulos: - a Resolução do Governo Regional dos Açores n.° 272/84, de 1984-12-05, publicada no Jornal Oficial, I série, de 1984-12-18, e o Despacho do Senhor Secretário Regional da Economia dos Açores, de 1992-10-06.

Em contra-alegações, as autoridades recorridas concluíram:

  1. Não se aplica a qualquer dos dois actos recorridos o artigo 8.° do Decreto Regional n.° 10/82/A, de 18 de Junho, pelo que, a serem inválidos, nunca seriam nulos.

  2. Os actos recorridos não ofendem o conteúdo essencial do direito ao ambiente e à qualidade de vida consagrado no artigo 66.° da Constituição, pelo que também não são nulos por via do artigo 133.°, n.° 2, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo.

  3. Não se verificando, in casu, nem a previsão do artigo 8.° do Decreto Regional n.° 10/82/A, de 18 de Junho, nem a do artigo 133.°, n.° 2, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo, importa concluir que os actos, a serem inválidos - o que apenas por cautela se equaciona - seriam meramente anuláveis.

  4. O prazo para a arguição da anulabilidade, pelo Ministério Público, é de um ano. Era assim antes da LPTA, por força dos artigos 51.° e 52.° do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo, aprovado pelo Decreto n.° 41.234, de 20 de Agosto de 1957, e continua a ser assim sob a vigência da LPTA, por via dos seus artigos 28.°, n.°1, alínea c), e 29.°, n.° 4.

  5. Ora, o presente recurso foi interposto muito depois de findo esse prazo em relação a qualquer dos dois actos impugnados. E, por isso, foi interposto extemporaneamente, devendo ser rejeitado.

  6. Ainda que assim se não entendesse, sempre teria o Tribunal de concluir que os actos recorridos não violam o artigo 5.°, alíneas c) e f), do Decreto Regional n.° 10/82/A, de 18 de Junho.

  7. A alínea c) do artigo 5.° Decreto Regional n.° 10/82/A, de 18 de Junho, deve ser vista à luz dos objectivos de preservação da Reserva Natural (que constitui a sua ratio) e de acordo com o princípio da proporcionalidade (que tem, aliás, base constitucional - artigo 266.°, n.° 2).

  8. Pelo que a proibição ínsita naquele preceito apenas opera se, quando e na medida em que as movimentações questionadas pelo Ministério Público possam fazer perigar o ecossistema da Reserva.

  9. Ora, tal ecossistema nunca foi nem será colocado em risco por virtude da instalação da central geotérmica e da exploração dos recursos existentes na zona (com vista, aliás, entre outras coisas, à produção de um bem escasso na Região Autónoma dos Açores - a electricidade).

  10. No que respeita ao suposto incumprimento da alínea f) do artigo 5.° do Decreto Regional n.° 10/82/A, de 18 de Junho, não basta afirmar que, na zona envolvente da reserva, se atinge um determinado nível de ruído. É necessário, ainda, demonstrar que esse ruído perturba o equilíbrio natural existente ou perturba as condições de calma e silêncio da Reserva. Ora, esse demonstração não foi feita - ainda que superficialmente - pelo Ministério Público.

  11. No Estudo de Impacte Ambiental da Central Geotérmica da Lagoa do Fogo (1ª Fase), elaborado pelo Instituto de Desenvolvimento de Novas Tecnologias e junto à Petição Inicial como doc. 2, afirma-se justamente, quanto ao ruído, que, descontada a "fase de perfuração dos furos" (que se encontra concluída há muito), "o ruído (...) não afectará, nem os valores que se pretendem salvaguardar na Reserva Natural da Lagoa do Fogo, nem as actividades humanas".

  12. Em segundo lugar, na p. 3 do dito Relatório de Medições Acústicas, refere-se que, para além de um raio de 100 m a contar da chaminé da central, "(...) a envolvente será considerada pouco ruidosa". O que importa aferir é se a eventual afectação dessa área delimitada (que representa uma ínfima fracção da reserva) se traduz numa perturbação do equilíbrio natural ou das condições de calma e silêncio da Reserva.

  13. Tendo em conta o carácter circunscrito da zona eventualmente afectada (e diz-se eventualmente porque mesmo em relação aos níveis de ruído aí detectados o Ministério Público não logra demonstrar qualquer perturbação do equilíbrio ambiental), é forçoso...

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